Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.
À mãe que denunciou marido por abusar da filha: ouvir é maior gesto de amor
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Cara Marina,
Não nos conhecemos e já nutro profunda admiração por você. Li seu relato aqui em Universa sobre a importunação sexual cometida pelo seu marido contra sua filha de 17 anos e gostaria de celebrar publicamente sua coragem e alteridade. O que você fez por sua filha infelizmente ainda é a exceção da exceção, ao passo que o que ele fez é a regra.
Más condutas sexuais são, provavelmente, os crimes mais subnotificados perante a polícia justamente porque, entre outros motivos, são majoritariamente cometidos por conhecidos.
A vítima fica com medo de prejudicar alguém que ela conhece — e provavelmente ama e admira — e de não ser acreditada. Já as famílias não conseguem conceber que uma nova realidade e novos arranjos serão necessários e tendem a fingir que nada aconteceu.
Sua filha disse: "Foi essencial que minha mãe acreditasse em mim". E quero te dizer que ela está absolutamente certa. A primeira escuta ofertada a uma vítima de violência sexual é crucial para o processo de reparação que se impõe, seja ele judicial e/ou emocional.
Você mudou o curso do trauma em sua filha, você esteve por ela em uma situação em que muitas e muitas vezes as vítimas estão sozinhas; você ofereceu a ela ferramentas para trilhar a vida depois da dor, além de um profundo amor. Espero que reconheça a mulher incrível que você é!
Espero, Marina, que seu relato inspire mais mães, mais pais, mais cuidadoras e cuidadores de criança a não terem dúvida de que lado ficar se algo assim acontecer com crianças e adolescentes sob seus cuidados. Porque, por mais difícil que seja compreender, a dúvida ainda é elemento dominante nesse tipo de situação.
Desejo também que sua história ajude a dissipar o mito de que crianças e adolescentes estão mentindo quando dizem que são vítimas de violências sexuais porque querem chamar a atenção.
Não sei se você sabe, mas é muitíssimo raro que crianças e adolescentes mintam sobre isso porque, no geral, nessa faixa etária, especialmente em crianças, a mentira é um recurso usado para se livrar de um problema (o famoso "não fui eu que quebrei" quando foi ela que quebrou) e não para atrair problemas. E até mesmo crianças e adolescentes sabem que constrangimentos sexuais não trazem qualquer vantagem ou benefício para quem os sofre e tem a coragem de falar dele.
Lembre-se sempre que precisar que a única pessoa responsável pelo que aconteceu é ele. Ele é um homem adulto, que tem uma carreira, que paga contas e vive tudo de acordo com suas capacidades, inclusive dispondo de recursos para contratar um dos melhores advogados de defesa do país. Foi ele que escolheu agir assim e não havia nada que você poderia ter feito para evitar, porque nós, mulheres, não somos responsáveis por aquilo que um homem decide fazer.
Não posso imaginar o que você está enfrentando, mas assim como você fez por sua filha, eu gostaria de me disponibilizar a fazer por você: oferecer minha escuta, minha admiração e meus ombros ao seu lado para passar por esse momento.
Por fim, espero continuar honrando histórias como a de vocês em meu trabalho de difusão de informações sobre direitos e sobre os mitos que acompanham a narrativa de violações e a vida de sobreviventes.
Com amor,
Isabela
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