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Mauricio Souza: entenda por que clube pode rescindir contrato por homofobia
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O Minas Tênis Clube anunciou, na tarde de ontem, a rescisão do contrato com Maurício Souza. Desde o dia 12 de outubro, o clube se viu diante do cometimento de bifobia pelo jogador de vôlei, declaradamente e orgulhosamente bolsonarista. Até o nome de perfil do atleta leva o número 17.
Ele postou em seu perfil no Instagram uma crítica à bissexualidade do Super-Homem. Isso mesmo: ele se incomodou profundamente com a sexualidade de um personagem de quadrinhos, algo ficcional, mas não viu qualquer problema com o presidente da República tirar foto com uma criança segurando uma arma ou de que somos o país que mais mata pessoas trans e travestis.
Felizmente, hoje em dia fazer esse tipo de coisa não passa mais batido, seja perante a sociedade civil, como a torcida do clube, seja perante os patrocinadores. A Fiat, principal patrocinadora do time de vôlei, que inclusive leva o nome da marca, exigiu providências. A Gerdau também.
Diante da pressão pública, surgiu um debate de que o clube tinha pouca margem de manobra porque o atleta era contratado com carteira assinada, além de receber pelo uso de sua imagem, algo padrão dentro da indústria do esporte.
No primeiro momento o time acabou escolhendo o afastamento, uma multa e a retratação pública, a qual foi feita contrariamente a todas as técnicas e balizas que definem uma retratação, como, por exemplo, ser feita no mesmo veículo no qual ocorreu a violação e com clareza objetiva sobre aquilo do que se retrata.
A suposta retratação não acalmou os patrocinadores, que esperavam, no mínimo, que ela fosse feita no perfil do Instagram do atleta, com a devida remoção da postagem bifóbica. Em uma segunda tentativa de se redimir por meio de um vídeo em seu Instagram em 27 de outubro, o atleta piorou sua situação na medida em que não pede desculpas pelas ofensas, mas sim se direciona a quem se sentiu ofendido, invertendo as responsabilidades, além de insistir no inexistente direito de cometer crimes.
Cláusula permite rescisão em casos de violação de direitos humanos
Muitas pessoas nas redes sociais podem ter dúvidas sobre como uma empresa ou um clube pode lidar com situações assim e, por isso, apresento uma ferramenta jurídica à disposição desde 1920, a chamada Cláusula Moral, uma cláusula contratual que permite a patrocinadores, empresas, times esportivos e demais organizações o encerramento do contrato, sem pagamento de rescisão e demais valores, caso haja violação de direitos humanos e/ou da ética e moralidade pela pessoa contratada, desde que comprovada a violação.
Essa cláusula, obviamente, não pode ser usada sem critérios como forma de evitar pagamentos devidos a pessoas que cumpriram todas as suas obrigações. Essa ferramenta jurídica surgiu em Hollywood do começo do século 20 para proteger os estúdios diante de escândalos envolvendo as estrelas de cinema. Na época, isso servia, por exemplo, para justificar o encerramento do contrato de um ator que tivesse sido flagrado exercendo sua homossexualidade, por exemplo.
Como a moral muda conforme a época, a aplicação dessa cláusula no Brasil, atualmente, jamais seria para um caso como esse. Mas sim, justamente, para o contrário, isto é, para responsabilizar o contratado pelas consequências da prática de LGBTfobia, o que, como sabemos, já é crime no Brasil.
Essa cláusula serve também para garantir que a contratante possa encerrar suas relações em casos de práticas de outras discriminações e crimes, como misoginia, racismo e crimes de má conduta sexual.
Depois da eclosão do MeToo, no Estados Unidos, a partir de 2017, essa cláusula passou a estar presente, também, na maior parte dos contratos de altos executivos, como CEOs.
É extremamente comum que essa cláusula esteja presente em contratos de atletas nos EUA justamente porque a imagem do atleta, sua boa reputação e respeitabilidade social são intimamente vinculadas com marcas patrocinadoras e com a história e cultura do time pelo qual competem.
Não é possível saber, até o momento, se o Minas tinha esse amparo ou se a rescisão está sendo financeiramente negociada.
Considero que seja fundamental que os departamentos jurídicos e de compliance das organizações conheçam esse instrumento à sua disposição não apenas para a sua própria proteção, mas também para a proteção de toda a sociedade, porque sabemos que um atleta filiado a uma equipe tem muito mais alcance e endosso e, portanto, seu discurso tem o potencial de atingir muito mais pessoas, causando dores e danos e conquistando mais adeptos ao discurso de ódio. É preciso frear, com rapidez, a dimensão de discursos discriminatórios e a Cláusula Moral é uma aliada nesse processo.
Fiquemos de olho nos próximos passos de Maurício Souza, fazendo nosso melhor para que seu próximo destino não seja o Congresso Nacional.
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