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Isabela Del Monde

OPINIÃO

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

Por Dom e Bruno e pelos indígenas, tiremos do poder quem odeia o Brasil

Colunista do UOL

16/06/2022 04h00Atualizada em 17/06/2022 11h21

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Quero começar este texto expressando minha total e irrestrita solidariedade às famílias, amigas e amigos e a toda rede de afeto de Bruno Pereira e Dom Phillips, assassinados no Amazonas. Não sou capaz de imaginar o que estão passando. Ofereço a todas essas pessoas minha indignação e disposição para mudar o país que não cuidou desses dois homens.

Expresso também minha solidariedade a todos os povos indígenas do território brasileiro, que estão há mais de 500 anos sob ataque e que, nesse momento, enfrentam o governo federal de Jair Bolsonaro (PL), um anti-indígena. A esses povos, meu compromisso de aliança às suas histórias, direitos e demandas.

Esse texto se soma a milhares de manifestações nacionais e internacionais de inconformismo com o desaparecimento e a morte de Bruno e Dom. Eles sumiram no dia 5 de junho de 22, no Vale do Javari. Na quarta-feira (15) a Polícia Federal, após encontrar um suspeito que confessou ter matado ambos, afirmou que restos de corpos foram achados na região e que "tudo leva a crer" que são dos desaparecidos. A Univaja (União dos Povos Indígenas do Vale do Javari) afirmou que os restos são de Dom e Bruno, a quem chama de "parceiros e defensores dos direitos humanos".

Imaginemos que exista um país que tenha, em seu território, a maior parte da maior floresta tropical do mundo, a maior reserva hidrológica do planeta e mais de 300 etnias compostas por pessoas que conhecem e entendem da floresta e das águas. Povos que, por exemplo, manejaram a terra por séculos com tamanha maestria a ponto de criarem um solo superfértil, a TPI, ou Terra Preta de Índio.

Considerando então essa riqueza natural, humana e histórica desse país diante de um contexto global de crise climática, seria evidente esperar que seus governantes a valorizassem, inclusive como estratégia de poder na política internacional, certo? Mas, no Brasil de Bolsonaro, como disse o geógrafo Pedro Ronchi no Twitter, é tudo às avessas.

Temos uma Funai (Fundação Nacional do Índio) que joga contra os indígenas e que pune com demissão e desproteção servidores que cumprem suas obrigações legais, como aconteceu com Bruno Pereira. Até outubro de 2019, ele ocupava a Coordenação-geral de Indígenas Isolados e de Recente Contato quando foi exonerado do cargo por ter liderado uma operação que expulsou centenas de garimpeiros da terra indígena Yanomami.

Contamos com um presidente incapaz de qualquer expressão de afeto positivo. Ele responsabilizou as próprias vítimas pelo seu desaparecimento ao dizer que estavam em uma "aventura não recomendável" e que Dom Phillips era "malvisto na Amazônia", sem assumir qualquer responsabilidade de que foi o seu governo que conduziu a Amazônia a um território de perigo para quem busca protegê-la, bem como aos seus povos.

Integra o cenário de desespero um Ministério das Relações Exteriores que anuncia um boato para as famílias dos desaparecidos, dizendo que seus corpos foram encontrados. É inconcebível tamanha insensibilidade com a angústia que elas vivem.

E, para completar, ficou evidente que foi orquestrada uma ação de barulho do assunto Amazônia na internet, quando, de repente, diversos perfis gigantes nas redes sociais publicaram, quase ao mesmo tempo, uma mentira sobre uma civilização de mais de 100 milhões de anos na floresta. A intenção de quem promoveu essa mentira era clara: emporcalhar o algoritmo para que a conversa sobre Dom e Bruno fosse sobreposta pela fake news.

Essa última estratégia não funcionou, e alguns perfis vieram a público apresentar sua reparação pela divulgação de uma mentira. Ainda não está claro se esses perfis foram pagos para fazer essas postagens, mas a ação organizada levanta a suspeita de que sim. Isso precisa ser investigado pelos órgãos competentes com urgência.

Em outubro, menos de quatro meses a partir de agora, temos a possibilidade de encerrar definitivamente o governo de Jair Bolsonaro. Temos também a oportunidade de recompor o Congresso Nacional e o centrão que mantém o presidente no poder às custas de muito orçamento secreto.

Pelas vidas de Bruno, Dom, de todos os povos indígenas e pela vida de toda a população brasileira, é nossa obrigação cidadã expurgarmos do poder quem odeia o Brasil e as suas riquezas, quem enxerga esse território como uma grande fazenda exportadora e seu povo como mão de obra a ser massacrada ou como força a ser morta. O Brasil merece mais, você e eu merecemos mais.