Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.
Assédio no trabalho: o que o caso das denúncias na Caixa nos ensina
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O Ministério Público do Trabalho (MPT) instaurou inquérito civil contra a Caixa Econômica Federal e Pedro Guimarães para apurar como a instituição tratou as denúncias de assédio moral e sexual realizadas por servidores e servidoras do banco. Essa decisão obriga a Caixa a remeter ao MPT, em um prazo de 10 dias, todos os documentos relacionados aos casos, incluindo desde os relatos que inauguram os reportes de más condutas até as providências tomadas.
É com base na investigação do que o banco público fez ou deixou de fazer para prevenir e tratar assédio que o MPT poderá ou ingressar com uma ação judicial contra a Caixa e Guimarães ou oferecer ao banco um Termo de Ajustamento de Conduta (TAC), ou seja, um acordo no qual a Caixa se compromete à mudança de cultura por meio de medidas práticas e concretas. É comum também que TACs prevejam o pagamento de multas por conta dos danos previamente causados e identificados na investigação do MPT.
A primeira coisa que esse caso nos ensina é que assédio moral e/ou sexual raramente se trata de uma situação isolada causada por apenas uma pessoa que age em desacordo com as normas. A regra geral para assédios é de que há um clima institucional que facilita o cometimento de más práticas.
No caso da Caixa, isso ficou evidenciado por uma pesquisa feita pela Federação Nacional das Associações do Pessoal da Caixa (Fenae) no final de 2021, pela qual ficou provado que 60% dos funcionários já vivenciaram cenas de assédio moral. Portanto, não basta apenas demitir uma ou duas pessoas denunciadas por assédio, é necessário um forte empenho de mudança cultural expressada, entre outros aspectos, pelo fortalecimento dos mecanismos de governança voltados à prevenção e ao tratamento de incidentes.
Canal de denúncia não é suficiente
O segundo ensinamento do caso Caixa é: ter canal de denúncia não é suficiente. Se sua empresa ou organização tem um canal de denúncia, que na verdade é meramente formal, ele não serve nem para as pessoas atingidas por suspeitas de violações nem para a própria organização.
Um canal proforma, ou seja, só para dizer que tem, além de deixar as vítimas abandonadas em sua própria dor, expõe a organização a riscos reputacionais, judiciais e financeiros, uma vez que autoridades públicas podem comprovar que, na prática, o canal não funciona e, com isso, responsabilizar a organização, como exatamente está ocorrendo com a Caixa.
O terceiro grande ensinamento desse caso está relacionado ao papel da liderança. De acordo com Sergio Takemoto, presidente da Fenae, está muito evidente que esse clima organizacional de assédio se instalou no banco na gestão de Pedro Guimarães. Segundo Takemoto, Guimarães geria pelo medo. As gestões anteriores, embora evidentemente imperfeitas como qualquer coisa feita por pessoas, não se sustentavam no terror contra a equipe.
É necessariamente a liderança que vai estabelecer se a organização, pública ou privada, será um espaço de crescimento e prosperidade para as pessoas que lá trabalham ou fonte de medo e adoecimento. Por isso, é essencial que quem lidere o faça por uma perspectiva inclusiva, respeitosa e proativa na promoção da diversidade, da saúde física e psíquica do time e da segurança para todas as pessoas.
Se a liderança abusa do poder, além de criar um clima de terror, ela ensina, pelo exemplo, que o trajeto para a ascensão na organização é pelo abuso também, disseminando uma cultura de puxadas de tapete, competição desmedida e assédio entre as pessoas subordinadas. Entretanto, se a liderança ocupa o poder de forma responsável e com temperança, ela informa para a equipe, por meio de suas atitudes, que o crescimento profissional não passa pela agressão moral, psicológica ou sexual de ninguém.
Por fim, o quarto grande ensinamento desse caso é a necessidade de que haja uma área exclusiva e específica para a gestão das relações humanas dentro da organização, bem como um braço isento para a apuração de denúncias e aplicação de sanções.
A Caixa, na gestão de Pedro, ampliou as atribuições das áreas de pessoas. Isso foi mantido pela atual presidente, Daniella Marques, que criou uma vice-presidência para tratar de recursos humanos e logística. Seria a mesma coisa que uma padaria também vendesse serviços de informática, ou seja, sem sentido. E revela que a alta liderança do banco não respeita a centralidade humana em sua forma de gestão.
Se você é gestor ou gestora e não quer enfrentar uma situação similar a essa que está ocorrendo na Caixa, esse caso pode ser um excelente norte do que não fazer e como se inspirar nos problemas de outra organização para criar soluções para a sua.
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