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Isabela Del Monde

OPINIÃO

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

Bolsonaro já defendeu aborto e, hoje, só critica prática para ganhar votos

Bolsonaro disse em entrevista que sugeriu à esposa que abortasse - Ajudante de ordens de Bolsonaro teve sigilo quebrado para investigação sobre movimentações financeiras suspeitas. Foto: Alan Santos/PR
Bolsonaro disse em entrevista que sugeriu à esposa que abortasse Imagem: Ajudante de ordens de Bolsonaro teve sigilo quebrado para investigação sobre movimentações financeiras suspeitas. Foto: Alan Santos/PR

Colunista de Universa

06/10/2022 04h00

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Jair Bolsonaro já disse que é católico. Mas está frequentemente participando de cultos e se encontrando com lideranças evangélicas. Agora é exposto como frequentador da maçonaria, além de ter indicado um maçom para o STF (Superior Tribunal Federal), o ministro Kassio Nunes —ele declarou ser "mestre" da maçonaria em 2010. Ainda assim, se diz cristão, mas se contradiz: as religiões cristãs são categóricas ao afirmar que maçonaria é uma sociedade secreta frontalmente oposta aos valores de Jesus e às doutrinas da fé cristã, seja ela evangélica ou católica.

Frequentar a maçonaria não é a única conduta de Jair que está chocando os cristãos brasileiros desde o início do segundo turno. Está em alta nas redes uma fala do presidente em que diz ter sugerido à então esposa, Ana Cristina Valle, que abortasse o filho mais novo, Jair Renan. Disse, ainda, que aborto é uma decisão do casal.

Alguns anos depois, porém, Jair passa a ser colocar de forma visceral contra o aborto, sem qualquer menção ao que tinha falado anteriormente. Se hoje falar mal da prática é bom para trazer votos, ele fala. Se, amanhã, falar bem do aborto trará votos, ele fala também.

Em entrevista à revista "IstoÉ Gente", em 2000, Bolsonaro disse que sugeriu que a mulher abortasse. Ela estava grávida de Jair Renan - Reprodução - Reprodução
Entrevista do presidente à revista "IstoÉ Gente", em 2000, dizendo que o aborto é uma "decisão do casal"
Imagem: Reprodução

E é por isso que ativistas estão há anos dizendo que as pautas morais, para Bolsonaro e o bolsonarismo, não são cortina de fumaça. Nós conseguimos compreender faz muito tempo que ele mobiliza esses assuntos de forma completamente usurpadora porque consegue ganhar votos com as vítimas da sua manipulação.

Jair é um cristão 171, um fariseu que usa as religiões como se fossem um restaurante self-service em que ele pode escolher qual versículo da Bíblia vai seguir um dia e qual vai descumprir no outro. Como uma mulher que foi criada na fé da Igreja Católica, eu sei a retidão que o cristianismo exige de seus fiéis. Religião não é bagunça.

Infelizmente, porém, Jair não está sozinho no seu esquema de explorar a fé alheia. Junto a ele estão vários outros estelionatários da dor. As pessoas recorrem às igrejas em busca de alento, de conforto e de caminhos para uma vida digna. É muito comum que se aprofundem nos exercícios religiosos quando estão passando por uma grande angústia, como uma doença ou o desemprego, por exemplo.

Na minha opinião, a principal explicação de por que Jair age como age é dinheiro. Ele sabe que as comunidades cristãs reúnem milhares de pessoas que, mensalmente, doam, em média, 10% de seu salário aos templos.

Embora ele provavelmente não acesse diretamente os valores do dízimo, encontrou entre alguns dos "líderes" desses templos excelentes parceiros para seus esquemas: Jair fortalece os falsos pastores por meio da corrupção em barras de ouro, e eles, por sua vez, continuam recebendo o dízimo e todos os dias mentem para seus fiéis de que Jair é um enviado de Deus.

Uma mão lava a outra. E quanto mais pessoas com angústias e medos profundos, quanto mais pessoas desempregadas e desesperadas, melhor para o esquema, melhor para os estelionatários da fé, pois haverá mais pessoas para serem ludibriadas por falsos religiosos que veem nelas apenas um cifrão, e não um ser humano que precisa de respeito.

Os evangélicos —e pessoas de todas as crenças— têm o direito de que sua religião não seja utilizada para promover um homem que desrespeita todos os dias a fé de milhões de brasileiros.

É evidente para quem lê essa coluna que sou favorável à legalização do aborto. E você não vai me ver mudando de posição quando me convém. Ser favorável à legalização do aborto é a posição mais difícil de se tomar nesse debate, mas a tomo com coragem e integridade, mesmo sabendo que o caminho mais fácil seria ser contra ou incoerente quando assim me favorecesse, só para convencer quem pensa diferente.

As pautas morais são evidentemente manipuladas por Jair. Um falso moralista que abusa da fé alheia quando lhe convém, que não tem nenhuma vergonha na cara em um dia aparecer segurando uma imagem de Nossa Senhora Aparecida e no outro em um batismo no rio Jordão e que pode mentir descaradamente porque molha a mão de muita gente no caminho enquanto os verdadeiros crentes do país sofrem com falta de comida, de trabalho, de saúde, de educação e de dinheiro.

Expresso minha total solidariedade a todos os cristãos brasileiros que estão vendo suas religiões serem depravadas por alguns falsos religiosos em troca de poder e dinheiro.