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Isabela Del Monde

OPINIÃO

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

Futuro ídolo do esporte brasileiro, Thiago Wild segue caminho de Cuca

Colunista de Universa

02/06/2023 04h00

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O tenista paranaense Thiago Wild tem colecionado vitórias em Roland Garros e ganhou a atenção da imprensa brasileira. Entretanto, esse não foi o único assunto na coletiva de imprensa após o jogo da terça-feira (30), na qual ele também foi questionado sobre o andamento do processo de violência doméstica ao qual ele responde. Diante da pergunta, o atleta afirmou que não achava que o assunto deveria ser tratado ali. "Acho que é uma pergunta que você não deveria fazer pra ninguém", disse ao jornalista alemão que o questionou.

Wild tem direito de se manifestar sobre o assunto apenas na Justiça, é claro. Entretanto, a resposta do atleta poderia ter sido mais bem elaborada para não dar margem a interpretações de que "em briga de marido e mulher não se mete a colher".

Por muito tempo, violência doméstica foi um assunto escondido atrás das portas de milhões de casas onde as mulheres eram submetidas às piores violações subjugadas e condenadas ao silêncio e à falta de amparo institucional, já que simplesmente não havia formas de responsabilização dos agressores e reparação às vítimas estabelecidas na lei brasileira.

Graças à mobilização incansável de mulheres e com apoio de alguns poucos e bons homens aliados, conseguimos transformar profundamente essa cultura e a regra, agora, é de que sim, falamos de violência doméstica em qualquer espaço e em qualquer lugar. Há leis que determinam, por exemplo, que os síndicos têm obrigação de acionar a polícia em casos de violência doméstica que ocorrem em condomínios.

Muitas pessoas podem ainda pensar que uma violência cometida no âmbito doméstico não teria, ou até mesmo não deveria ter, impactos da vida profissional do homem acusado ou condenado, mas isso também já não é verdade.

A Ordem dos Advogados do Brasil, por exemplo, desde 2019 pode impedir que um homem se torne advogado caso ele seja um agressor, pois ele não teria idoneidade moral para assumir a profissão, um dos requisitos para receber a carteirinha da OAB.

E já há também casos de atletas que viram suas vidas profissionais impactadas por terem cometido violência doméstica, como o jogador de futebol Mason Greenwood, que foi afastado do Manchester United e teve seu contrato de patrocínio com a Nike suspenso diante das acusações de violência doméstica e estupro contra uma ex-mulher.

Thiago Wild precisa estar preparado para responder sobre esse processo em qualquer lugar que esteja porque, certamente, essa pergunta surgirá outras vezes. Ele, como um possível futuro ídolo do esporte brasileiro, não pode adotar uma postura a la Cuca —o técnico do Corinthians recém-afastado que foi condenado na Suíça por estupro. Se deseja ser respeitado, é preciso que evidencie seu respeito pelas mulheres, bem como seu compromisso em respeitar a Justiça e as leis nacionais.

Reforço: ele tem o direito de se manifestar apenas no processo, porém, é importante que saiba que essa postura pode dar margem a interpretações de que ele julga que violências cometidas no âmbito privado não devem causar repercussões públicas. Issso não é verdade. Já foi, mas não voltará a ser regra.

Falamos e continuaremos a falar sobre violências domésticas contra mulheres e crianças em quaisquer espaços. Uma pessoa que deseja ser uma figura pública deve saber que, se estiver envolvido com essas condutas, poderá ser questionado. Barrar a conversa, certamente, não transparece uma boa imagem.