Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.
E quando o noivo quer independência pra decidir a própria roupa?
Eu sei que uma das coisas que eu mais celebro nessa coluna é o fato de eu ter um noivo participativo. Ele quer que o casamento também seja dele, que seja nosso de fato e não apenas meu, a noiva. E eu acho isso, verdadeiramente, incrível. Mas uma coisa tem me incomodado e eu não sei até que ponto isso é um reflexo de uma cultura que me impõe e me cobra como noiva, se é apenas o meu lado meio controlador dando tônica ou se é uma bobagem minha. Ou se é tudo isso junto e misturado.
O fato é que meu noivo quer decidir sozinho sobre sua roupa para o grande dia. Gente, desde sempre, em todos os filmes e casamentos que acompanhei, as noivas foram responsáveis por definir os detalhes da roupa do noivo. Sim, ele vai lá e escolhe o melhor tamanho e caimento com os amigos, mas tudo dentro de uma definição da noiva. As cores, o modelo da roupa, etc... Tudo definido por nós, noivas. Mas, quando a gente tem um noivo participativo, a gente tem um noivo que quer definir a roupa por si próprio.
Primeiro, ele me disse que queria saber como seria meu vestido. Quando eu disse que "não", que isso tinha todo uma áurea de mistério e que poderia chamar mau agouro, ele disse que isso era pura superstição de minha parte e que, se ele não poderia ver o meu vestido, eu também não poderia saber antecipadamente sobre nada da roupa dele, "pode chamar mau agouro".
E daí que eu perdi toda e qualquer argumentação sobre isso, porque todas estavam pautadas em premissas, digamos, machistas. Afinal, por que ele não pode saber sobre o meu vestido e eu tenho que decidir sobre a roupa dele? Se o casamento é nosso e a se a gente tem uma dinâmica outra, pautada na igualdade e na equidade, por que teria essa balança desequilibrada na organização e definição das coisas da festa de casamento?
Mesmo pensando todas essas questões, e mesmo me incomodando com a minha própria atitude, o fato é que eu segui insistindo em tentar definir limites para que ele escolha a sua roupa para o dia. Como, por exemplo, tentar combinar a cor da roupa; depois, na definição do sapato - mas, nisso, estamos total de acordo e vamos casar de tênis. A questão é que eu quero tênis iguais e ele pensa que isso é desnecessário (não diz, mas pensa) -; depois na delimitação da ideia geral da roupa. E daí que se por um lado minha argumentação refinou, a contra-argumentação dele também.
Agora, não se trata mais do direito dele de também saber como eu irei me vestir, mas de que ele precisa fincar o pé na decisão sobre a roupa dele porque, do contrário, a dinâmica do nosso casamento pode ficar atrelada a eu sempre ser a que decide sobre tudo. Mas, daí, veio o meu "touché". Ora, já sou eu a parte do casal que define tudo. Quando vamos comer, onde vamos comer, o que vamos comer, quando vamos sair, como chegaremos ao local, a disposição do quarto e da casa e assim por diante. Então, se eu já defino tudo, também posso definir a roupa dele para o dia do casamento. E um certo sorriso de "ironia do destino" desenhou-se em mim. Mas, a fada feminista gritou em meus ouvidos, no melhor estilo "Marcia Sensitiva": PRA QUÊ?
Acho que a grande questão é que a gente deseja equilibrar e compartilhar as coisas relativas a organização do nosso casamento só até a página dois. E se aprendi algo com o Feminismo é que todo dia a gente abre mão de uma dinâmica machista incorporada. Ou seja, todo dia a gente aprende, todo dia a gente se desconstrói. E isso não diz respeito apenas aos homens que querem aliar-se a uma luta emancipatória, mas a nós, mulheres, também. A gente também se torna feminista. E tornar-se significa uma renovação e compromisso reafirmado continuamente.
Então, estou buscando repactuar comigo mesma que eu preciso confiar no meu companheiro, nas decisões que ele fará sobre sua vestimenta no dia que celebraremos nosso amor. Se eu demando que ele confie em mim para isso, devo exercitar essa confiança nas decisões dele também. É difícil, gente, e eu confesso que ainda estou lutando com isso. Mas, ao menos, consegui avançar na compreensão do problema e, com isso, saber no que preciso melhorar. Enfim, Juliana, o orgulho do terapeuta.
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