A Fazenda: é entretenimento ver uma mulher sofrer em rede nacional?
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Uma mulher grita, xinga, chuta uma porta. Então se tranca no banheiro e berra. Começa a chutar a porta. Quebra o batente externo. Grita mais. Eu assisto o vídeo agoniada pensando em como pode isso ser entretenimento. Não é de hoje que a agonia de uns é passatempo para outros, mas essa edição de A Fazenda deixa clara a falta de compaixão com pessoas com quem tem algum tipo de transtorno psiquiátrico.
Estou falando de Raissa Barbosa, influencer, e vice miss bumbum, diagnosticada como borderline, que participa do reality da Record. Para mim, vê-la perder as estribeiras em rede nacional é muito triste. A cena deixa qualquer pessoa com o mínimo de compaixão atônito. Mas a direção do programa vê cifras. Alguns de seus colegas veem uma oportunidade de tirá-la do jogo e sobreviver mais no reality. E o público vê a oportunidade de chamar mais uma mulher de doida. Só mais um exemplo de como esse tipo de enfermidade é tratado por aí.
Raíssa fala abertamente sobre sua condição clínica de borderline. Antes mesmo de entrar no programa ela descrevia sua enfermidade e explicava que não conseguia controlar sua raiva. Em vídeos do ano passado, em seus stories do Instagram, ela usou a expressão "do nada" várias vezes. Está bem e sente raiva "do nada", terminando a conversa de maneira agressiva. Ela diz isso com doçura e vai respondendo as perguntas dos fãs sobre o caso — corajosa de falar sobre o assunto. Até que um deles pergunta se é por conta da doença que ela "faz safadezas". Raissa muda a expressão e diz que ela não rebola porque é safada e sim apenas porque quer. E logo percebe que ficou descontrolada e usa de exemplo. Ali fica claro como é ser borderline, uma enfermidade.
É aterrorizante pensar que seus colegas em A Fazenda estejam tentando usar justamente essa fragilidade para tirá-la do programa. Classificam como patético, dizem que ela é louca, acham que ela merecia que coisas piores acontecessem, pois a convivência com alguém assim é difícil. Pior, eles identificaram o gatilho da colega: ser chamada de doida. E usam isso para provocar explosões.
Em nossa convivência de trabalho, de família, de amigos, vamos aprendendo a reconhecer as fragilidades dos outros. Sabemos até onde ir com cada uma delas, vamos aprendendo como contornar nossas dificuldades de comunicação, vamos ajudando o outro a superar os desafios se ser alguém. É pelo menos como eu levo a vida — nunca estive num reality, não sei se confinamento em rede nacional muda tanto assim a cabeça e o caráter de alguém.
Explosões todo mundo já teve. A gente sabe que não é nada agradável a ressaca de um chilique daqueles. Imagina ter isso toda hora? Imagina estar cercada de pessoas que tem interesse em que você tenha rompantes de raiva?
Que a gente pense nisso a cada vez que assiste uma explosão de Raíssa como se fosse entretenimento. A cada matéria que usa os verbos surta, grita, bate e a gente clica, ávido por barraco. Para que possamos cuidar mais do outro, não usar seus gatilhos como armas, não fazer com o que não gostaríamos que fosse feito conosco. E quem sabe, construir um mundo mais parecido com o mundo em que gostaríamos de viver.
A gente pode falar mais disso no Instagram.
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