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Maria Ribeiro

OPINIÃO

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

Acordo com um fim. Quem dera todas as separações fossem assim

Colunista de Universa

25/04/2023 04h00

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E então eu acordo com um fim. Fim, não no sentido de propósito (infelizmente), mas no sentido mais doído, aquele que conhecemos todo dia mais um pouco, como dizia a poeta Elisabeth Bishop. Fim de fim mesmo. De mudança de tempo verbal. De término, de "não tem mais", de "lembra aquele dia?". Tudo bem, é só um restaurante, eu digo, na tentativa de relativizar o drama.

Mas o Azumi não era só um restaurante. O Azumi era o Japão, Copacabana, o Rio de Janeiro, meus casamentos, meus pais, meus filhos, trinta e quatro anos de uma história que serviu como cenário de muitas outras, além da minha. Dois tatames, um balcão, meia dúzia de mesas e nenhuma frescura: assim era a pequena casa da rua Viveiros de Castro, um oásis de simplicidade em meio à recente "gourmetizacao" de tudo. Ali, sashimi era sashimi e cogumelo era cogumelo. Nada de espuma, nada trufado, nada de enfeite, zero cream cheese.

Não que eu também não goste de uma invençãozinha. Mas comer no Azumi era como ler poesia: ali, a beleza estava justamente na ausência de ornamentos. Não havia velas, nem flores, as lâmpadas sequer eram amarelas. Nas paredes, chamava a atenção um autógrafo do rei Pelé. Uma das poucas informações não essenciais presentes no recinto. No mais, tudo que estava à vista no delicado restaurante carioca fazia parte de si mesmo.

Estive lá semana passada com meu filho mais novo e um pouco antes com o mais velho. Eventualmente, saio sozinha com cada um deles. Algumas conversas nasceram para mesas de dois. Na última vez que coloquei os pés na casa fundada pelo japonês Isao Ohara, falamos sobre imigração e futebol. O Botafogo jogava contra outro time que agora não lembro. Ao contrário do que acontece em outros lugares, lá a tevê nunca me incomodou. E ainda que incomodasse, agora é tudo saudade. E eu nem pude me despedir.

Talvez seja melhor assim. Sem contagem regressiva, sem delongas, sem "gato subiu no telhado". Mas a verdade é que dificilmente uma notícia dessas chega sem algum lamento. E o Azumi fecha as portas por dificuldades financeiras, como tantos outros comércios. A pandemia, a recessão, as dificuldades de tocar negócios que não entraram na era do marketing, o delivery, os shoppings, são muitos os motivos para encerrar as operações de uma loja de rua.

No post do Instagram que comunicava seu fim, em pleno dia de São Jorge, o texto, em português e em japonês, terminava da seguinte forma: "Foi uma honra testemunhar momentos importantes da vida de cada um de nossos clientes e construir conexões genuínas. Agradecemos por terem nos permitido fazer parte de suas vidas."

Somos nos que agradecemos, Azumi. Quem dera todas as separações fossem feitas assim.