Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.
Na semana do Dia do Trabalho, resolvi falar de amor
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Hoje, você acordou e foi trabalhar. Pegou o metrô, o ônibus, seu carro, ou só trocou a camiseta de dormir por um jeans e decidiu que quarto também é escritório. Em algum momento, você entrou no Instagram, ou no Twitter, ou no WhatsApp e depois se culpou por achar que rede social é recreio. Que para "ganhar" a vida você precisa de foco. Mas ganhar de quem? E sob qual ponto de vista?
Minha amiga Giovanna Madalosso escreveu semana passada na "Folha de S.Paulo" um artigo sobre a experiência dela em um emprego formal. Giovanna conta que chegou a trabalhar 18 horas por dia e que, como boa parte de seus colegas, vivia à base de energéticos e ansiolíticos. Como o abuso era naturalizado, a performance parecia coisa de vencedor. Afinal, a exploração se misturava às roupas de grife, relógios caros, elevadores de última geração. Quem aí nunca confundiu identidade com carteira de trabalho? E carteira de trabalho com conta bancária? Eu já. Algumas vezes.
Quando tirei a minha, em 1992, tinha 16 anos. "Atriz", estava escrito ali. Hoje, mesmo 30 anos depois, me impressiona lembrar com exatidão do dia em que fui buscar a caderneta azul que legitimou meu ofício. Que fez coro à minha vocação de querer viver personagens: outras vidas, outros tempos, outras realidades. Que me deu um lugar no mundo: de trabalhadora.
Atualmente, acho que já posso dizer que sou uma atriz que escreve, e agradeço por isso. Também já consigo separar satisfação de sucesso. Ou, pelo menos, do sucesso para o qual somos estimulados desde a juventude, o que está ligado ao retorno financeiro. Acontece que já fiz coisas que me deram alguma grana e nenhum orgulho, e vice-versa. Faz parte. E talvez uma coisa não seja melhor do que a outra. Nem tudo que reluz é clique.
Não que eu não seja materialista. Sou. Materialista, capitalista, madonnista (vou sugerir o termo para o Aurélio) e tricolor das Laranjeiras. Mas, quando olho para a geração que agora chega à universidade e não romantiza, como eu romantizava, a fusão absoluta da vida pessoal com a profissão, fico feliz, embora ainda não consiga fazer igual.
Às vezes, demora um pouco. Aos 20 anos, resultado acaba sendo espelho, como nota em boletim escolar. Depois, se tudo der certo, você percebe que ganhar a vida tem mais a ver com justica do que com pódios. Que uma vitória de um time sob o comando de um técnico que cometeu um estupro não é uma vitória. Que gente importa mais do que prêmios. No Camões do Chico Buarque, em seu discurso, foi onde mais me emocionei. Havia a espera de quatro anos, havia a democracia de volta, havia a literatura, o reconhecimento, mas, sobretudo, havia o encontro de um casal.
Eu sei, ontem foi Dia do Trabalho. Talvez por isso eu tenha escolhido falar de justiça. Talvez, por isso, eu esteja falando de amor.
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