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'Succession' chega ao fim: uma mulher grávida no poder incomoda muita gente
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Domingo minha casa parou. Parecia final de Copa do Mundo. Ou eleição para presidente. Sem o barulho lá fora, a ansiedade nos comia por dentro. Às 21 horas, já estávamos em silêncio. Graves, inteiros e presentes para o último episódio de "Succession".
Eu não estava preparada para o fim. Nunca estive, na verdade. Quando meus pais se separaram, quando meu cachorro morreu, quando meus casamentos acabaram, quando meu pai se foi, cada despedida é sempre um pouco de todas as outras, mesmo quando a despedida é de personagens de ficção.
E olha que não estamos falando de heróis. Ao contrário. Os Roy são pessoas desprezíveis. De todos os episódios, saímos com doses cavalares de realismo: sim, a vida é injusta; sim, é o dinheiro quem manda; não, não há garantias para nada. Além disso, ninguém escapa de Freud. Vamos morrer tentando agradar nossos pais. Por mais cruéis que eles tenham sido.
Para quem não acompanhou a série, um breve resumo: um pai abusivo e poderoso prepara a sua aposentadoria. Para isso, precisa escolher, como seu sucessor, um de seus filhos "quebrados". "Quebrados" pelo excesso de dinheiro, pela ausência de afeto e por manipulações diversas, os irmãos começam a brigar entre si. Entre as disputas, uma me chama a atenção pela perversidade. Todos, iludidos pelas mentiras do pai, um dia acreditaram serem mais especiais do que os outros. Como se o amor morasse numa única cadeira e a mesa fosse para um.
É só uma série de TV, você poderá dizer. De um canal gringo. Sobre milionários americanos. Sem o apelo pop de uma novela brasileira de TV aberta. Mas com signos que dizem sobre todos nós. As engrenagens do poder, a cultura do coronelismo, o bom e velho patriarcado. Tenho, como todos nós, uma longa história com ele, e não só dentro de casa.
"Succession" fala de estruturas seculares, e que não se repetem apenas em empresas ricas e imponentes. Mas o que me chamou atenção no capítulo de anteontem, e é nisso que quero chegar, foi o desfecho da personagem de Sarah Snook, a única mina da história. E para quem ainda não viu o fim da série, sugiro parar aqui.
Sioban Roy é uma mulher que, em 2023, acredita que seu gênero já não a impediria, como antes, de disputar a liderança da companha do pai em pé de igualdade com seus irmãos homens. Afinal, seus dois grandes concorrentes, Kendall e Roman, são nitidamente mais frágeis e menos preparados do que ela.
Shiv é competente, ambiciosa, sem escrúpulos e tão fria quanto os outros filhos de Logan Ray, mas algo a impediu, ao longo de quatro temporadas, de se aproximar do lugar de líder com o qual sempre sonhou. Porque nem seu pai, nem seus irmãos, nem seu marido a queriam acima deles.
Com a derrota certa, a única vingança possível era ferir o irmão. Aquele que por mais tempo testemunhou o machismo do qual foi vítima. O que se achava melhor. Melhor por ser homem, por ser mais velho, por ter crescido com uma promessa.
Uma mulher no poder incomoda muita gente. Ainda mais grávida. E, assim como "Succession" é sobre o oposto da esperança, nossa protagonista termina como coadjuvante. Em silêncio, de volta a um casamento infeliz, e protestando contra o patriarcado possível.
Já é alguma coisa.
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