Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.
Quem merece 'feliz dia dos pais': quem cuida? Quem cria? Quem paga pensão?
Quem é o homem que pode carregar o título de "pai" e ser assim chamado por alguém? Pai é quem cria (ou divide a criação)? Quem sustenta (ou divide as contas)? Quem coloca o nome na certidão de nascimento? Eu diria que uma coisa não deveria eliminar a outra: não basta ser pai, tem que participar.
Ser pai é colocar o nome, amar, ensinar, educar, levar ao médico, dentista, escola, sustentar, conviver. Não basta ser pai biológico para ser amado e receber afeto. É preciso cultivar esta relação - assim como todas as outras.
Ouvi de uma mãe certa vez que, ao se separar, escutou do ex-marido, pai dos filhos: "Quer se separar? Então vai se virar sozinha porque a partir de agora não faço mais nada, não levo pra escola, não levo em festa. Só vou pagar pensão". Quem perdeu com isso? Como pode um pai, para atingir a ex-mulher, abrir mão assim dos cuidados com os próprios filhos?
Claro que há pais e PAIS, há mães e MÃES, há pessoas e PESSOAS. Mas os números revelam uma realidade triste no Brasil. Vem crescendo a quantidade de crianças sem o nome do pai na certidão de nascimento; foram quase 100mil em 2021. Cerca de 20 milhões de brasileiros têm apenas o nome da mãe na certidão. E de que adianta o pai colocar o nome num documento por causa de um exame de DNA se, muitas vezes, até se recusa a conhecer o filho?
Nos 12 anos que apresentei na TV o Programa Papo de Mãe, entrevistei diversos tipos de pai. Até "pai solo", um pai raro, aquele que cuida sozinho dos filhos, ou por viuvez ou porque houve abandono materno, algo ainda mais raro.
Durante uma entrevista, uma psicóloga especializada em famílias me disse algo que me marcou. Eu comentei que, mesmo quando há abandono ou desavenças, filhos sempre amam seus pais. E ela me explicou que não necessariamente, que ninguém tem obrigação de amar pai e mãe simplesmente por serem pai e mãe. E mais: reforçou que, em muitos casos, dependendo dos danos emocionais, a orientação é o afastamento.
Trago mais um dado triste neste agosto lilás, mês de combate à violência contra a mulher. As mulheres vítimas de violência doméstica e de feminicídios são, em sua maioria, agredidas e assassinadas pelos pais dos próprios filhos. O pai que mata a mãe, além de criminoso, condena seus filhos à orfandade.
Mas está cheio de pai legal por aí, que devem servir de exemplo para os outros. Tem pais biológicos, pais adotivos e padrastos, avôs, tios - até mães - que assumem o chamado "papel paterno". Os diversos tipos de família trazem novas composições, há famílias com 2 mães, outras com 2 pais, que provam que a tradicional família brasileira tem vários formatos e que devemos entender por tradição ter como base amor, afeto, carinho, compreensão, atenção.
É muito triste ver pais que passam a rejeitar seus filhos quando eles entram na adolescência, por não aceitarem o jeito que eles são, o que é uma crueldade. Os adolescentes só acabam se afastando ainda mais. Pode acontecer com a mãe também, mas é mais raro.
Cada pai tem seu jeito. O meu não era do tipo que levava pra escola nem pro médico quando eu era criança, mas inventava viagens malucas em família pelo Brasil para conhecermos o país, faz uma comida deliciosa, é daqueles que adoram sentar para conversar e contar histórias, fazer piada de si mesmo e, hoje, se orgulhar dos netos. Meu pai sempre me fez rir e me emocionar, e eu acho isso um mérito e tanto.
Sei que há muita injustiça também. Há os pais que somem e há os que são impedidos de verem seus filhos. Conheci um pai cuja ex-mulher o afastou do filho e até mudou de cidade, e ele passou anos para retomar o contato. Quando retomou, o filho já era adulto, e ele tinha perdido toda a fase de crescimento do menino, um tempo que não voltava mais.
E instinto paterno, será que existe? Eu acredito que sim, e ele independe de este pai ser ou não biológico. Há pais biológicos com zero paternidade, e padrastos sem filhos próprios extremamente paternais, como o dos meus filhos.
Hoje falo aqui principalmente como filha. Desejo um feliz dia dos pais ao meu pai e a todas as pessoas que exercem a paternidade, este ato de amar. Tem uma palavra muito bonita chamada paternagem, um processo que vai além de obrigações, que envolve escolhas, presença, dedicação. Aproveito para deixar uma polêmica no ar: por que não substituímos o dia dos pais pelo "dia da paternagem"?
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