Topo

Morango

Treinei a vida toda para pandemia, diz jovem que vive com fibrose cística

Luana Reinert: 130 mil seguidores no Instagram e 1,5 milhão no TikTok  - Arquivo Pessoal
Luana Reinert: 130 mil seguidores no Instagram e 1,5 milhão no TikTok Imagem: Arquivo Pessoal

Colunista do UOL

13/01/2021 04h00

Fenômeno no TikTok, onde tem mais de 1,5 milhão de seguidores, a curitibana Luana Reinert, 20, que produz vídeos divertidos e informativos com trejeitos de personagens da Disney, ainda se surpreende com o sucesso que faz nas redes.

"Não foi planejado. Sempre tive muita vergonha do fato de ter fibrose cística (FC) e passei minha vida toda escondendo isso até de pessoas próximas. Quando um amigo meu com FC infelizmente morreu por falta de informação e inspiração, decidi que ia começar a tentar ajudar pessoas", conta.

"Meus pais iam à escola explicar a doença"

Fibrose cística é uma doença hereditária: o gene é transferido pelo pai ou pela mãe - e não há nenhuma outra forma de transmissão entre indivíduos. Ela compromete o funcionamento das glândulas exócrinas, que são as que produzem muco, suor e sucos digestivos, e faz com que esses fluidos se tornem mais espessos. Os sintomas variam e podem incluir tosse, infecções pulmonares reincidentes, dificuldade para ganho de peso e estatura, e cansaço excessivo.

De acordo com Grupo Brasileiro de Estudos Sobre a Fibrose Cística (GBEFC), 70 mil pessoas convivem com a doença em todo o mundo. No Brasil, seriam 3.000 pacientes, mas é possível que haja muito mais sem diagnóstico e tratamento adequados.

Apesar das limitações impostas pela fibrose cística, Luana, que é filha única, lembra que teve uma infância razoavelmente comum. "Meus pais sempre iam às escolas explicar sobre a FC para os professores e diretores, já que eu me ausentava muito, tinha que tomar remédios e precisava de alguns cuidados especiais."

Luana - Reprodução/Instagram - Reprodução/Instagram
"Fico muito grata por todo esse apoio, e fico também surpresa pelas pessoas terem interesse de saber sobre a doença, sobre capacitismo, sobre como ajudar. Tudo isso tem um valor enorme pra mim"
Imagem: Reprodução/Instagram

Adolescência e a fase da não aceitação

A criadora de conteúdo diz ter vivido momentos complicados na adolescência, principalmente por ter enfrentado uma fase de não aceitação da doença - e agravado seus sintomas.

"Parei de tomar remédios na frente das pessoas porque queria ser 'normal', então minha saúde se deteriorou muito nesse período. Eu brinco que eu mesma reproduzia o capacitismo (preconceito contra pessoas com deficiência) para mim, e sinto que, se tivesse uma representatividade melhor, não teria passado por metade do que passei. Hoje temos o filme 'A Cinco Passos de Você', que quebrou o tabu da oxigenoterapia, mas antes dele e de 'A Culpa é das Estrelas', quem usava um cateter nasal era um ET."

A máscara já fazia parte da vida dela

Quando teve que ser internada pela primeira vez, aos 17 anos, Luana precisou ser intubada e ficou 9 dias em coma. Sua capacidade pulmonar saiu de 70% para 28%. Há um ano ela precisa usar a sonda nasal, que lhe fornece oxigênio, em tempo integral, ou seja, durante as 24 horas do dia.

Enquanto "A Culpa é das Estrelas" traz a história de dois adolescentes que se conhecem em um grupo de apoio para pacientes com câncer, "A Cinco Passos de Você", é sobre a paixão que marca a vida de dois pacientes com fibrose cística e que precisam manter 1,5 metro de distância entre si - uma necessidade real.

"Devemos evitar contato com outras pessoas com fibrose cística e com pessoas doentes. Durante a minha vida inteira usei máscara e álcool em gel quando frequentava locais fechados ou em hospitais, clínicas etc. Se minha imunidade estava mais frágil, já usava máscara até para ir para escola", explica Luana.

Desde o início da quarentena, ela e a família têm permanecido em isolamento total. "Fui treinada a vida inteira para essa situação, então até agora estou me saindo bem", brinca, espirituosa.

Sucesso nas redes e amor no Tinder

O bom humor de Luana, que faz tanto sucesso nas redes, conquistou também o namorado, João Victor, de 22 anos. "Nos conhecemos no Tinder, em julho de 2018, mas morávamos longe (João é de Criciúma, a 500 quilômetros de Curitiba). Nos encontramos em dezembro daquele ano e passamos o réveillon juntos. Depois tive que ficar internada em Curitiba, e então ele saiu de Criciúma pra ficar no hospital comigo. Aí ele se mudou pra perto, e depois veio morar aqui em casa, sempre me apoiando e me cuidando. Pra mim, essa foi a maior prova de que eu estive errada a vida toda, porque sempre acreditei que nunca acharia alguém, ou que alguém me aceitaria 'assim'", revela.

Luana - Reprodução/Instagram - Reprodução/Instagram
Juntos desde 2018, Luana e João Victor se conheceram pelo Tinder
Imagem: Reprodução/Instagram

Bissexual, Luana conta que falar abertamente sobre isso foi um desafio. "Nunca foi fácil. Não me senti acolhida nem mesmo na comunidade LGBTQI+. Quando confidenciei a algumas amigas da comunidade que sentia que era bi, elas falavam pra mim 'mas nunca beijou uma menina, não sabe então' e coisas do tipo.

À espera de dois pulmões

Luana está na fila para o transplante de órgãos há quase um ano, à espera de dois pulmões. A indicação à fila acontece quando os pacientes atingem apenas 30% da capacidade pulmonar.

"Meu pulmão já está totalmente debilitado. Somente o Trikafta (medicamento ainda não autorizado no Brasil) ou o transplante podem me salvar. Estar na fila é assustador, e ao mesmo tempo enche o coração de esperança de um dia voltar a respirar normalmente e dar continuidade aos meus sonhos."

Terminar a faculdade de medicina veterinária, viajar, casar e criar um abrigo de animais onde possa também oferecer castrações a baixo custo são alguns dos sonhos de Luana.

No Brasil, mais de 45 mil pessoas estão na fila por um transplante. É possível ser um doador vivo e doar um dos rins, parte do fígado, parte da medula óssea ou parte do pulmão. Já um doador falecido, que sofre morte encefálica, pode doar diversos órgãos e tecidos.

Um doador pode salvar até oito vidas. Para ser um potencial doador é preciso, principalmente, manifestar esse desejo à família. Se no momento do procedimento a família não autorizar a doação, ela não é realizada.