BBB: a gente só queria se alienar - mas está refletindo profundamente
Onze anos atrás eu tava brincando no BBB. Era a primeira mulher assumidamente lésbica do programa e não fazia a menor ideia do significado disso. Entre um papo e outro sobre sexo e relacionamento lá dentro, compartilhei minhas vivências, minhas cicatrizes e meus ideais.
Tomei porres memoráveis, discuti por motivos bobos, fiz inúmeros bolos de goiabada e tive um crush por uma participante (hétero). No bingo da sapatonice, marquei a cartela inteira ali.
Ao deixar a casa, depois de um mês e meio, senti o primeiro efeito da minha participação: a aceitação pública da minha sexualidade. Pessoas de todos os gêneros e idades me paravam na rua pra pedir um abraço e uma foto. Nesses momentos, a criança que passou a infância e a adolescência sendo chamada de "machorra", entre outros apelidos depreciativos, e que recebia olhares enviesados porque não se vestia ou se portava "como uma menina", sorria.
O estigma que uma criança LGBTQIA+ carrega é massacrante, sobretudo, porque muitas vezes nem o próprio lar é um espaço de acolhimento.
Enquanto pessoas LGBTQIA+, conhecemos nossas dores e o valor da representatividade. Através dela, nos reconhecemos no outro ao mesmo tempo em que descobrimos mais de nós mesmos.
No BBB, houve um hiato de nove anos entre a participação da primeira mulher assumidamente lésbica (eu), e a segunda, Gabriela Hebling. "Em tempos de um cenário político que de tão surreal parece brincadeira, poder torcer por alguém consistente como Gabriela será um alento", escrevi aqui no UOL, em 2019.
Mais que alento, foi aprendizado. Gabriela trouxe outras pautas e contribuiu com falas importantíssimas sobre racismo, por exemplo.
Nesta edição de 2021, que estreou há pouco mais de uma semana com um número recorde de participantes LGBTQIA+ (são 5) e negros (são 7), a leveza e a euforia dos primeiros dias de programa perderam espaço para uma tensão indissipável.
O que começou como uma brincadeira entre Lucas e Kerline na primeira festa do BBB 21 tem atingido proporções estratosféricas com o passar dos dias.
Ao exagerar na bebida e fazer brincadeiras inconvenientes, mas leves, sem qualquer tipo de abuso, Lucas passou a ser hostilizado por alguns participantes que estão submetendo o ator a um isolamento - dentro do que já é um isolamento. Karol Conká, que acredita ser a concorrente mais forte na disputa pelo prêmio de R$ 1,5 milhão, tem liderado esse grupo.
Lésbica, mestra em psicologia e dj, Lumena Aleluia era uma das presenças mais celebradas pela comunidade LGBTQIA+ antes do início do programa - tanto que foi uma das seis pessoas imunizadas pelo público e que não enfrentariam o primeiro paredão.
Lumena era a personificação do ideal de representatividade para uma parcela significativa da população. Mas esse favoritismo se inverteu quando ela assumiu uma posição de superioridade em relação a Lucas, que vem sendo ostensivamente humilhado na casa.
Equívocos e reações desproporcionais têm sido a tônica do programa. Enquanto ainda estamos no meio de uma pandemia. Limitados. Acuados. Estarrecidos. Torcer para Lucas neste momento, mais que um dever moral, é catártico. Resgata em nós a esperança de que a resiliência, a resistência diante das maiores provações, vale a pena.
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