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Após maus-tratos, cão sem parte do focinho é resgatado e vira influencer
De tão largo e amoroso, o sorriso de Odin, esse bebezão de sete anos, faz com que as marcas que ele carrega no rosto e no corpo passem quase despercebidas. Quase. Pelo menos para a maioria de seus dez mil seguidores no Instagram. Mas, sim, há quem se incomode com sua aparência e denuncie suas fotos como "conteúdo sensível" - e isso prejudica a visibilidade de seu perfil, que existe justamente para contar sua história.
Quando ainda era um filhote com poucos meses de vida, Odin teve uma bomba amarrada em uma de suas patinhas. Ao sentir o fogo, num gesto instintivo para apagá-lo, ele mordeu o artefato, que explodiu, arrancando dentes e parte de sua pata e de seu focinho.
Resgatado às pressas por uma ONG, Odin, que até então era chamado de Rick, sobreviveu. E permaneceu três anos em um abrigo com outros animais até que seu sorriso cheio de doçura, que era constantemente divulgado nas redes, cativou uma pessoa que morava em outra cidade, a 200 quilômetros de distância.
"Na mitologia viking, Odin era o chefe supremo do reino de Asgard, onde habitam os deuses nórdicos. Odin é considerado o deus da sabedoria, da magia, da poesia e da guerra. É protetor dos mortos em batalha e dos magos. Achei que seria o nome perfeito para ele carregar, devido à sua força e história de vida. Com a adoção de Odin, eu sabia que teríamos uma longa batalha pela frente, de inclusão e até mesmo de conscientização das pessoas sobre maus-tratos. Sei que ele está me guiando nessa batalha e fazendo o mesmo com aqueles que tomam conhecimento de sua existência", pontua a empresária Claiciene Costa Kobayashi, 29 anos, que dirigiu de Santa Bárbara d´Oeste (SP) até São José dos Campos (SP) para adotar Odin. Hoje a família mora em Paraty, no litoral fluminense.
Na época, em 2018, pouco antes de se encantar por Odin, Claiciene enfrentava um dos momentos mais dolorosos de toda a sua vida: a perda de Pandora, uma pinscher que tinha sido sua companheira inseparável por quase 19 anos.
Pandora, assim como Odin, também era uma sobrevivente. Com poucos dias de vida, teve o corpo todo queimado acidentalmente com mingau. Na ocasião, os tutores de Pandora não quiseram levá-la a uma clínica veterinária por acreditarem que ela não resistiria.
Nos dias atuais, esse tipo de atitude, omissão, pode ser denunciada como crime de maus-tratos, que tem pena de reclusão de 2 a 5 anos, multa e proibição da guarda. A pena pode ainda ser aumentada de um sexto a um terço se ocorre morte do animal. A denúncia de prática de maus-tratos contra animais pode ser feita diretamente ao Ministério Público, à Polícia Militar (através do número 190) e ao Disque-Denúncia (número 181).
Pandora não morreu porque foi socorrida por Claiciane, que ainda era uma criança, e sua mãe.
"Além de crescer comigo, Pandora tinha sido a minha única companheira pet da vida. Quando soube que estava partindo, me desesperei. Não imaginava uma vida sem ela e senti um medo terrível", conta Claiciane, num relato emocionado.
A empresária chegou a prometer para si que não voltaria a amar outro animalzinho. Mas voltou atrás.
"Me despedir da Pandora foi uma das coisas mais difíceis que fiz na minha vida. Após conversar com ela e dizer que eu ficaria bem se ela fosse descansar, com ela ainda em meus braços, entrei no Instagram e vi as fotos do Odin pela primeira vez. De alguma forma a Pandora estava me mostrando aquilo, e eu senti um chamado muito forte dentro do meu coração. Após sua partida e passado um mês, decidi que daria espaço para animais especiais assim como ele. Que usaria da minha dor para curar a dor de outros animais."
"Acredito que todos merecem um lar pra chamar de seu, independente da idade, cor, tamanho, temperamento ou aparência física. O que precisamos é de bons humanos que entendam que a adoção é para salvar aquele animal e dar a chance dos protetores e ONGs poderem ajudar outros. A paciência, o respeito e o amor fazem toda diferença neste processo", expõe.
Além das cicatrizes físicas, uma das sequelas da agressão sofrida por Odin é estresse pós-traumático, que faz com que ele dê mordidas leves para se defender em situações em que se sinta ameaçado. Carinho e acupuntura fazem parte de seu tratamento.
"Quando adotei o Odin, há três anos, meu esposo estava no Japão, trabalhando. Ele não pôde vir na perda da Pandora e acabou sendo mais difícil pra mim, mas ele foi maravilhoso na adoção do Odin, sempre me apoiou, e hoje o Odin é apaixonado por ele."
Claiciane alerta para o fato de que, nos abrigos, alguns grupos de animais são constantemente preteridos e passam anos, quando não toda a vida, sem serem escolhidos.
"Esses animais são os de pelagem preta, idosos, adultos e os portadores de deficiência. Por isso meu objetivo hoje é conscientizar as pessoas sobre esse tipo de adoção e, principalmente, sobre a adoção responsável. A adoção não pode ser pautada pelas características físicas do animal, e sim pelo impacto positivo de conviver com esses seres tão especiais. A sensação é de estar secando gelo na maioria das vezes, mas não podemos perder a esperança."
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