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'O que é ser homem? Essa foi uma das primeiras perguntas que eu me fiz'
"O que é ser homem? Essa foi uma das primeiras perguntas que eu me fiz depois de me assumir trans. Eu pensava 'eu não sei o que é ser homem, mas sei o que é não ser homem' e todo o simbolismo que isso possa carregar, que é ser sensível, chorar, não ser violento, agressivo...", diz o publicitário e trans ativista Matheus Vidal Rosa, 27 anos, em um vídeo que já teve quase 70 mil visualizações no Instagram.
Ele segue a reflexão: "Por muito tempo eu quis me afastar de todos esses símbolos que me remetiam a uma não masculinidade, até que chegou um ponto em que eu tava reproduzindo comportamentos que eu mesmo rechaçava. Foi aí que eu descobri que a masculinidade é construída e eu era responsável por construir a minha"
Trans ativismo
Paulistano, Matheus começou a produzir conteúdo sobre transgeneridade em 2018, pouco depois de se perceber trans. Ele conta que, na época, buscou referências na internet e não encontrou muitas informações que o contemplassem. "Poucas pessoas falavam sobre isso e era sempre dentro de uma mesma perspectiva, sempre falando sobre a transição, como foi - o que é algo super importante também -, mas pouco se sabia sobre o contexto das pessoas trans no Brasil, pouco se debatia sobre isso."
Ele diz que o entendimento sobre sua transgeneridade aconteceu na faculdade, durante uma palestra sobre pessoas trans realizada por um coletivo feminista.
"Eu sempre gostei de mulher e por muito tempo me identifiquei enquanto uma mulher lésbica. Descobri que eu era um homem trans quando escutei a história de um homem trans. Ele começou a falar sobre a vida dele e parecia que estava falando da minha. Até então, eu achava que eu era algum tipo de maluco e que nunca ia ser homem, que eu sempre seria mulher e teria que conviver com esse incômodo", relata.
Nem toda pessoa trans precisa, necessariamente, passar por cirurgias ou fazer hormonização, por exemplo. Essas são escolhas estritamente pessoais.
"A gente é cobrado pra se parecer cis (cisgênero é o indivíduo que se identifica com o sexo que lhe foi atribuído no nascimento), então nosso corpo é visto como corpo errado. E essa ideia de corpo errado faz a gente entender que se o nosso corpo não é certo, a gente precisa ajustar ele a essa sociedade cisgênera. Então é cobrado que a gente aplique hormônio, que faça cirurgias, que homens trans tenham barba, que performem masculinidade... E não é só a cobrança na aparência, é a cobrança no jeito, no comportamento. A masculinidade máxima nos é cobrada, assim como a feminilidade máxima é cobrada às mulheres trans", aponta o influenciador.
"A gente tem o direito de se sentir à vontade no nosso corpo"
Matheus optou pela mastectomia, que é a retirada das mamas, e pela histerectomia, que é a remoção do útero e das trompas, e escolheu a hormonização.
"A gente tem o direito de se sentir à vontade no nosso corpo, e até isso querem tirar da gente. Por exemplo, como pode alguém falar pra mim que eu tô reforçando estereótipo de gênero? Como eu posso tá reforçando estereótipo de gênero se eu sou uma pessoa trans, que é justamente uma pessoa que quebra isso?! E se esse estereótipo de gênero existe, não é por conta das pessoas trans, e sim por conta de uma sociedade cis heteronormativa que impõe isso. Então não cabe colocar esse peso, essa culpa, nas nossas costas, o que acaba acontecendo muito", explicita.
Entre a descoberta, a aceitação e a afirmação pública de sua transgeneridade, Matheus levou dois anos. Os detalhes dessa jornada, ele expõe nas redes, ora de um jeito leve e bem-humorado, ora sendo incisivo e apontando os ataques transfóbicos que sofre constantemente.
Santa (e maldita) passabilidade
"Depois de um tempo que iniciei a hormonização, ninguém mais me confunde com uma mulher lésbica, porque adquiri a santa - e a maldita também - 'passabilidade cis', que é quando uma pessoa trans consegue adentrar e circular em espaços cisgêneros sem que as pessoas ao redor saibam que ela é trans. Mas é impressionante como quando a pessoa 'descobre' que eu sou trans tudo muda e minha identidade passa a ser questionada. É sério que você olha pra esse cara e pensa que é uma mulher? Ou é só maldade mesmo?", questiona ele em uma publicação.
Com mais de 30 mil seguidores, o publicitário conta que a parte mais difícil da exposição é a transfobia.
"Se a pessoa não concordou com o que eu falo, então ela vai lá e me ataca de uma maneira transfóbica, e isso é muito dolorido. Tem dias que é muito difícil, que eu fico muito triste, que eu não consigo postar. Mas também recebo muito carinho e isso me ajuda bastante a continuar. Receber mensagens de pessoas trans de 13 anos, 15, 18 anos, que falam sobre isso abertamente, que procuram conselhos, que falam que estão se descobrindo e que admiram o meu trabalho me faz perceber que o meu objetivo está sendo cumprido", fala.
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