Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.
Conká: Até quando mulher que erra será "a louca que precisa de terapia"?
O BBB é um programa de televisão que existe há 19 anos. Todos os tipos de vilões já passaram pelo reality nesse tempo. Sim, existiu muita maldade antes da participação de Karol Conká.
Os mais velhos devem lembrar, por exemplo, do lutador Marcelo Dourado, que participou do programa em 2004 e 2010, causando reações de amor e ódio e fez declarações homofóbicas. Mais recentemente, apareceram vilões como Marcos Harter (expulso da casa por indícios de agressão a Emily, sua namorada lá dentro) e Felipe Prior, que tinha uma estratégia de jogo machista. Nenhum deles foi chamado de louco. Também não foi dito para nenhum desses "bad boys" que eles precisam de terapia.
Nego Di, eliminado uma semana antes de Karol com 98% dos votos, não foi mandado para o divã mesmo tendo se declarado "machista e gordofóbico" e insinuado que se masturbaria se dormisse ao lado da atriz Carla Diaz.
A rapper Karol Conká saiu do programa ontem com a maior rejeição em 19 anos do BBB, com 99,17% dos votos. Desde que deixou a casa, ainda nos Estúdios Globo, já ouvimos que ela está desequilibrada e que precisa de terapia. E, atenção, uma coisa não está ligada a outra. Uma pessoa não é desequilibrada por fazer terapia, muito pelo contrário.
Ao tentar explicar sua saída nas entrevistas que deu, Karol disse várias vezes que "estava maluca" e "que tinha surtado". A cantora terminou a entrevista no programa de Ana Maria Braga na manhã desta quarta-feira falando que "precisava de ajuda psiquiátrica". Essa ideia talvez não tenha sido dela. Muitos suspeitam que a assessoria de imprensa da cantora tenha entrado em ação para gerenciar a crise gerada em sua imagem, o que faz todo sentido —e é uma prática comum.
Em todo caso, Karol já havia recebido o conselho de "se tratar" pouco tempo depois de deixar o reality. Na entrevista que deu na sequência para o "Bate Papo BBB", ao dizer que precisava de terapia, ouviu da apresentadora Ana Clara, uma também ex-BBB: "tem que fazer muuuita terapia, todo mundo tem que fazer terapia".
Bem, fazer terapia é ótimo e pode ser que esse conselho tenha sido dado com a melhor das intenções, como uma forma de acolhimento. Mas, bem, terapia não é Rehab, ou um "campo correcional", onde você vai para "se corrigir." Esse conselho, além de machista (por que os homens não recebem essa dica?) acaba confundindo o que é terapia.
Histéricas e bruxas
Fato: as atitudes de Karol dentro do programa criaram muitos problemas que precisam ser administrados. O ódio desmedido contra ela precisa ser contido. E a cantora precisa arrumar uma maneira de tocar sua vida e sua carreira (e isso é justíssimo, todo mundo merece ter várias chances na vida!).
A saída encontrada, pelo jeito, é tratar a cantora como uma pessoa com problemas psiquiátricos, desestabilizada, com dificuldade de domar sua própria agressividade, ou seja, uma "louca". Por que será? Por que esse rótulo não foi colocado em nenhum dos participantes homens com atitudes péssimas que já passaram pelo programa?
Bem, nós, mulheres, carregamos fama de louca desde a Idade Média, quando éramos chamadas de bruxas. Depois, passamos a ser histéricas, e muitas foram internadas contra a própria vontade em hospícios.
Não é surpreendente que Karol seja "a louca", a "destemperada". É disso o que somos chamadas sempre que erramos. E, muitas vezes, nós mesmas nos chamamos de loucas. Caso da própria Karol, que parece ainda carregar bastante esse preconceito. Ela, que se autoproclama "maluca" dentro e fora da casa, chamou a adversária Juliette de "lelé" e disse que a paraibana era "louca mesmo".
E quanto ao rapper Projota, que também já acumula atitudes e declarações bem polêmicas? Será que ele também vai ser considerado um "louco" que precisa de terapia? Duvido.