Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.
Bandeirinha agredida: como é tratada quem ousa entrar em espaços masculinos
A cena corre pela internet e programas de TV. Na tarde de domingo (10), durante um jogo de futebol entre os times Nova Venécia e Desportiva, no Espírito Santo, houve uma discussão no meio do campo entre jogadores e árbitros. Até que o técnico Rafael Soriano, da Desportiva, dá uma cabeçada na auxiliar de arbitragem do jogo, Marcielly Neto. Ela colocou a mão na cara sentindo dor e a maioria dos jogadores simplesmente a ignorou. Sim, isso aconteceu de verdade.
O técnico atacou Marcielly com força e só não a machucou mais porque foi contido por um dos juízes do jogo. Depois da agressão, ele teria dito para ela: "Se você disser que eu te agredi nós vamos para a delegacia, eu vou te processar", afirmou Rafael Soriano, que tentou negar a agressão. "Ela está dizendo que eu agredi. Mentira. Está se usando porque é mulher. Está querendo aproveitar de uma situação porque é mulher", disse.
Como assim? A cena foi gravada e todo mundo viu que houve, sim, agressão. E que vantagem em ser mulher é essa? A "vantagem" de ser agredida?
Testemunhas que estavam no jogo contaram no Twitter que essa não foi a única agressão sofrida pela assistente de arbitragem. Ela também teria sido xingada de "vagabunda" e outras palavras de baixo calão. Alguns torcedores teriam aproveitado para dizer para a profissional ir para casa, já que ali não era "lugar de mulher". O pecado de Marcielly estar no meio de uma confusão alheia. O técnico perdeu o controle depois que o árbitro principal encerrou o primeiro tempo antes do time dele cobrar um escanteio. Ou seja, ela só estava fazendo seu trabalho e por isso levou uma cabeçada na boca.
Sim, há anos nós, mulheres, insistimos que lugar de mulher é onde a gente quiser. Mas, vamos ser sinceras, ainda não é assim. Ainda precisamos abrir nossos espaços à força. Esse é o caso de todas as mulheres que trabalham em ambientes masculinos, em profissões que até pouco tempo eram exclusivas dos homens.
Ser árbitra de futebol talvez seja um dos "clubes do Bolinha" mais difíceis para uma mulher entrar. Afinal, futebol sempre foi considerado coisa de homem (só que não, e a seleção brasileira feminina de futebol está aí para provar).
Provas disso: só recentemente algumas mulheres foram escaladas para apitar jogos importantes. Exemplo: em 2003, a veterana Silvia Regina se tornou a primeira mulher brasileira a apitar um jogo do Brasileirão. Legal. Mas só em 2019 outra mulher (a também pioneira Edina Alves) foi escalada novamente para a posição.
As coisas estão melhorando. Segundo a CBF, o número de mulheres na arbitragem cresceu 400% nos últimos dez anos.
Mas essas mulheres ainda são exceção e completa minoria em um ambiente de homens. Um técnico dar uma cabeçada no rosto de uma dessas pioneiras é uma amostra do tipo de falta de consideração que alguns homens têm por mulheres que ousam entrar em áreas que eram "deles".
Por enquanto, o técnico foi demitido e suspenso da Federação Espírito Santo de futebol. Nomes importantes do futebol repudiam o caso. É o mínimo. E ainda é pouco.
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