Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.
Sari Corte Real condenada a 8 anos é boa notícia. Mas ela vai cumprir?
Oito anos e meio de reclusão. Essa foi a sentença deferida na noite de ontem na terça-feira (31) a Sari Corte Real pelo Tribunal de Justiça de Pernambuco. Ela, finalmente, foi considerada culpada pela morte do menino Miguel Otávio, de cinco anos, em junho de 2020, auge da pandemia. Na sentença, ela foi condenada por "abandono de incapaz que resultou em morte".
A história de Sari carrega vários símbolos de horror, entre eles, o do Brasil escravocrata. Miguel era filho de Mirtes Renata, na época empregada da família. Sari ficou responsável por cuidar do menino enquanto Mirtes passeava com o cachorro da família. A patroa, que no momento fazia as unhas, colocou Miguel, de 5 anos, sozinho em um elevador, aparentemente para dar um "chega pra lá" no menino, que chamava pela mãe. Em um vídeo, é possível ver que ela aperta um andar alto do prédio. Miguel saiu no nono andar do prédio, de onde caiu chamando pela mãe.
Após a morte do filho, Mirtes afirmou, coberta de razão: "E se fosse o contrário? Eu não teria direito a fiança!"
Na época do crime, Sari foi indiciada, mas pagou uma fiança e, nesses quase dois anos, não passou um dia sequer na prisão.
Se fosse o contrário, sabemos o que teria acontecido. Mirtes estaria, como se diz, "apodrecendo na prisão" desde então.
A condenação de Sari Corte Real é, sim, uma vitória da justiça a ser comemorada. Afinal, é fruto da luta de uma mãe que passou a dedicar a vida pela justiça do filho e de diversos movimentos sociais que se somaram à sua luta por "Justiça para Miguel''. Hoje, Mirtes estuda direito, para no futuro ajudar mulheres como ela.
Não é todo dia que uma mulher branca e rica, mesmo culpada, é condenada no Brasil. Sari pertence a uma família poderosa e era primeira-dama de Tamandaré, em Pernambuco. Gente como ela costuma escapar ilesa independente da gravidade de seus crimes.
Por isso, ler que ela foi condenada a oito anos dá uma sensação de vitória da justiça. Mas, segundo a sentença, ela não terá prisão preventiva decretada e poderá recorrer ao processo em liberdade.
Ou seja, a morte de Miguel completará dois anos dia 2 de junho com Sari Corte Real no conforto de seu lar.
Vale repetir a pergunta de Mirtes. Seria o mesmo se ela, a empregada colocasse um filho de 5 anos da patroa sozinho no elevador e ele morresse?
Não é preciso ser adivinho para imaginar que o cenário seria totalmente diferente.
Os advogados de Mirtes sabem disso e vão recorrer, pedindo uma sentença maior. O mesmo farão os advogados de Sari, naturalmente.
Em um país como o Brasil, não tem como não receber uma notícia dessas, de que a justiça talvez finalmente seja feita (faz dois anos e nada aconteceu a Sari, repito) com o pé atrás.
A ex-primeira-dama de família tradicional será mesmo presa, cumprirá um bom tempo na prisão para pagar pelo seu crime? Esperamos que sim. Mas vai ser preciso muita pressão para que a "justiça por Miguel" realmente aconteça.
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