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Nina Lemos

OPINIÃO

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

Na contramão dos EUA e do Brasil, Alemanha tenta facilitar acesso ao aborto

Colunista de Universa

05/07/2022 04h00

No mesmo dia em que a Suprema Corte dos Estados Unidos derrubou a emenda que tornava o aborto legal em todo país e na semana em que uma menina de 10 anos vítima de estupro tinha o direito ao aborto dificultado no Brasil, as feministas alemãs celebravam uma conquista sobre o mesmo tema: depois de anos de luta, uma lei que proibia médicos de fazerem propaganda sobre o aborto foi derrubada.

Esse foi o primeiro passo do atual governo alemão, formado pelos partidos SPD (Social democrata), FDP (Liberal) e Grünen (Verdes) fazer algo que eles já anunciavam quando começaram a governar: tornar o direito ao aborto e a escolha da mulher mais fácil e amplo.

A lei 219, datada do período nazista, tornava quase impossível para médicos que eles dessem informações sobre o procedimento, por exemplo, em seus sites. Eles também não podiam ter panfletos em seus consultórios explicando sobre as formas de aborto que podem ser feitas. Quem descumprisse a lei pagava multas altíssimas.

A proibição tornava mais difícil para as mulheres que precisam ou querem fazer um aborto achar informações sobre o procedimento ou marcar uma consulta com um médico capacitado.

"Isso é bom, mas não é o suficiente", disse a Ministra da Família Lisa Paus, do Partido Verde, na segunda-feira (4), em entrevista para o jornal "Tagesspiegel". Ela anunciou que estuda uma maneira de fazer com que as diferentes formas de fazer um aborto passam a fazer parte do currículo das faculdades de medicina. O objetivo é que o país tenha mais médicos que pratiquem o procedimento.

Aborto mais acessível e menos criminalizado

Segundo ela, no momento, o número de médicos que realizam abortos não é o suficiente, principalmente no interior do país, onde mulheres têm que viajar mais de cem quilômetros para poder realizar um aborto.

"Nós da coalizão já concordamos em formar uma comissão que vai propor uma reforma nas leis na situação dos direitos reprodutivos na Alemanha", disse.

A ideia dessa comissão é tornar o aborto mais acessível e menos criminalizado (exatamente o contrário do que acontece atualmente nos Estados Unidos).

Na Alemanha, as diretrizes em que o aborto é permitido e proibido fazem parte do código penal, ou seja, o procedimento ainda é visto como um crime. "O código penal não é o lugar para esse tema", já adiantou a ministra.

Apesar de constar do código penal, o aborto não é realmente proibido na prática na Alemanha. Mulheres que desejam fazer um aborto podem realizá-lo até as 12 semanas de gravidez. Mas, para isso, elas precisam passar por um conselheiro cadastrado pelo governo que vai dar a permissão.

Os seguros de saúde também não cobrem esses casos, que precisam ser pagos como procedimentos particulares. No caso de estupro ou risco de vida para a mulher, o aborto é permitido até as 20 semanas e pago pelos seguros de saúde.

Segundo a ministra e os especialistas no tema no país, ainda existem barreiras, que tornam a busca por um aborto ou por informações difíceis para as mulheres.

Ela não antecipou como será essa reforma. Mas a intenção é desburocratizar o acesso ao aborto no país. Isso foi, inclusive, escrito no "contrato da coalizão", uma espécie de carta de intenções e promessas que os integrantes do novo governo publicam quando tomam posse. Eles garantiram, por exemplo, que todas as formas de aborto devem ser cobertas pelos planos de saúde.

Ou seja, não é todo o mundo que anda na direção do conservadorismo e dos direitos das mulheres. Um sopro de esperança.