Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.
O futuro que eu quero: mulheres revendo conceitos e abertas para o novo
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Nunca pensei muito sobre envelhecer. Tenho certeza que fui a adolescente que inconscientemente acreditava na juventude eterna e lembro de achar que pessoas de 40 anos eram muito velhas. Um horror.
Segui me sentindo muito jovem, até um dia, quando saindo da casa de uma cliente, o zelador do prédio me disse: "Tão novinha e tanto cabelo branco, né?". Com quase 38 anos, muuuitos fios brancos na cabeça, algumas rugas e um corpo que já viveu duas gestações e duas amamentações, comecei a ter zilhões de questões.
Mesmo sabendo que o correto, em 2022, é não ter nenhuma. E, para piorar, sinceramente, o drama maior no tema "se-der-tudo-certo-eu-vou-envelhecer" é, pra mim, pensar que eu talvez não consiga mais acompanhar a velocidade do mundo, que eu comece a dizer frases "filho, me ensina a mexer nesse app?".
Fiz todo esse parágrafo culpado para dizer que a nova temporada de "Sex and the City — aka And Just Like That" — me fez muito bem! Eu vi a série original quando era jovem, muito jovem, na época em que passava na TV.
Eu amava demais e uma parte imensa da minha relação com o vestir e da coragem de dizer em alto e bom som "sim, eu gosto de moda" veio de Carrie Bradshaw.
Eu vi e revi a série milhões de vezes e não fazia diferença pra mim, na época, o fato das amigas serem uns dez anos mais velhas que eu. Mas a paixão foi esmaecendo com o tempo, achei que a série envelheceu muito mal, o segundo filme é um horror e eu nem estava muito animada para essa volta triunfal uma década depois.
Mas ver Carrie, Miranda e Charlotte com mais de 50 anos, rugas, cabelos brancos, mexeu muito comigo. Não que eu não conviva com mulheres incríveis nessa idade — convivo com muitas, aliás, mas ver envelhecer quem a gente admira em um 'status celebridade' é diferente.
Convenhamos, é ainda (infelizmente) raro ver mulheres envelhecendo na televisão sem precisar fazer papéis de avós, bruxas, jovens senhoras contidas.
Carrie exala cor, continua sendo 100% fashionista, tem um cabelão e mistura códigos que muita menina de 18 anos não teria coragem de fazer. Ela veste um monte de coisa que, na teoria careta do vestir, não é apropriada pra idade. E isso sequer é um assunto. É dado, natural, é quem ela é. E mais importante que isso: ela tem rugas, não usa esmalte, divide os fios loiros com os brancos na maior tranquilidade.
Mais que isso, fiquei confortável de ver como ela precisou repensar a carreira. Precisou humildemente, errando muito, recomeçar. Ela, que escrevia uma coluna em jornal, ta lá, suando para fazer um bom podcast acontecer.
E isso me pareceu um jeito cabível de "não acompanhar a velocidade do mundo como uma adolescente".
E, no geral, todas elas viraram mulheres que estão disponíveis para se repensar, tanto para entender que o mundo mudou e elas precisam mudar quanto para passarem vergonha por terem, talvez, demorado para se atentar para o mundo que vai além do próprio umbigo.
Fico muito animada em ver a Miranda sair de um casamento falido para ir viver uma paixão com uma pessoa não binária. Acho muito legal ter a Charlotte, que escolheu ser uma mãe que não trabalha fora, mas não por isso, vive em uma bolha. Charlotte segue sendo uma expert em artes plásticas, mas curte mesmo é o trabalho de educar as filhas. E que privilégio é poder escolher!
Entendo que a série não reverberou assim em todo mundo, entendo também que eu encontrei aconchego nesse envelhecer porque eu certamente me vejo parecida com essas mulheres brancas-magras-padrão. Mas olhando para as séries em geral, para televisão, para o cinema, ainda acho importante uma Carrie com rugas e fios brancos entrando em app de namoro. Ou a Miranda, se mudando para Los Angeles para viver um relacionamento que ela nem sabe que nome dar. Ou mesmo a Charlotte, que traz com leveza uma rabina trans pro bar mitzvah do filho também trans.
Para encerrar, vale lembrar que a mulherada de "Sex and The City" tem mais ou menos a mesma idade que as mulheres de "The Golden Girls" tinham na primeira temporada da série. O programa tem quase a minha idade, estreou em 1985 e a imagem ao lado ilustra qual era o imaginário coletivo de uma mulher de 50-e-poucos.
Não acho, sinceramente, que esse tema está resolvido. E acho, sim, uma delícia ver mulheres com mais de 50 se apaixonando, usando roupas diferentonas, transando, mudando de cidade, repensando os próprios preconceitos e privilégios.
Vivonas e vivendo, como acontece na vida real. Fiquei feliz de maratonar um futuro como esse.
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