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Xan Ravelli

Meu teste de ancestralidade confirma o que sempre soube: sou 73,9% África

Reprodução/Instagram
Imagem: Reprodução/Instagram

Colunista do UOL

12/07/2020 04h00

Me apresentar sempre foi um desafio, e 39 anos depois ainda é. Primeiro dilema é escolher quando cabe uma apresentação mais para humanas e quando as questões técnicas já são o suficiente —o que já adianto que, a meu ver, nunca são. Fiz o finado magistério, sou graduada em musicoterapia, professora de inteligência emocional, sou diretora e criadora de conteúdo na minha plataforma digital e sócia de um bar que durante a pandemia tem comercializado coquetéis engarrafados que se tornaram referência no mercado paulistano.

Mas será que isso é o bastante? Como deixar de mencionar que sou mãe de Jade, uma menina tímida e sorridente de 8 anos, e de Rael, um menino extrovertido e simpático de 5 anos; que sou casada com um homem negro sensível, carinhoso e companheiro; que tenho uma irmã 8 anos mais velha e que nossa relação é de profundo afeto e doçura. Tudo isso contribuiu diretamente —e muito mais do que qualquer formação— na aquisição de soft skills que utilizo hoje em todos os trabalhos que realizo.

É bom quando uma apresentação pode ir além do relato curricular e explorar os diferentes papéis sociais que a gente ocupa. Quem é você, maravilhose leitore? Quem é você enquanto pessoa única, maravilhosa e cheia de potências?

Apresentar-se é uma forma de humanização. Meu nome é Alexandra. Xan é meu apelido de infância, todes amigues me chamam assim, e para família também sou sempre Xan ou Xanda. Fundamental dizer que sou filha de dona Filó, 81 anos com vitalidade de 40 e tenho certeza que veio dela minha fé, energia e bom humor, e de seu Edgard, conversador, de voz firme de trovão. Certeza que por seu jeito bem mineiro de ser eu me dou tão bem com os silêncios e até hoje não aprendi a falar baixo.

Apresentar-se tem tudo a ver com identidade - pressupõe saber quem você é, ter orgulho de onde veio e orgulho do que conquistou. Assim como toda pessoa negra que mora no Brasil, tive meu passado, minha herança, meu nome e minha história roubados pelos 338 anos de escravidão legalizada. Quando a abolição chegou, minha bisavó tinha 9 anos, mas isso é assunto para um outro texto.

Isso tudo foi só introdução para dizer que, eu, mulher negra e filha da diáspora africana, tive a honra de fazer meu teste de ancestralidade com base no DNA em busca das minhas origens e divido com vocês a emoção que eu tive ao abrir o resultado.

Sou composta 73,9% de África, e digo que Angola corre nas minhas veias e que talvez venha daí minha vaidade, meu gosto pela dança e cantos ancestrais, e que Egito, seus mistérios, sua sabedoria e inteligência me sopram ideias quando nada parece fazer sentido.

xan mapa - Arquivo Pessoal - Arquivo Pessoal
Resultado do meu teste de ancestralidade com base na análise de DNA
Imagem: Arquivo Pessoal

Era África, soube agora, com sua filosofia e saberes, me dizendo pela vida toda que tudo bem sentir, chorar, me emocionar, deixar que a intuição me guie. Porque diferentemente do que a filosofia greco/francesa, branca e masculina de Descartes grita com seu "Penso, logo existo", o sentir é humano, é sábio, é preciso e tão carregado de razão, tão complexo quanto a racionalidade jamais será. Meu sentir é minha maior força, sempre foi.

Os outros 24,1% desse meu DNA, vêm de Grã-Bretanha, Irlanda e Alemanha a quem ficou curioso. Desde que soube desse resultado, estou carregando aquele olhar de orgulho que sempre vi em meus amigos brancos. Quando questionam de onde vem determinado sobrenome, eles se incham e respondem "é italiano", "é espanhol", "é francês". Agora posso ter orgulho em dizer que meus ancestrais vieram de Angola, do Egito e de outros países que ainda quero pisar.

Eu gosto de sorrir e gosto de boas cervejas e de bons drinks (olha a Inglaterra, a Alemanha e a Irlanda aqui!), boa comida. Sou rezadeira (de terço, novena, e muito mais), a água é minha fonte de equilíbrio - seja para beber ou num bom banho de chuveiro, de piscina, de mar.

Muito prazer, sou a Xan.