"Ninguém no MTST está recebendo dinheiro"
Propriedade privada é um direito constitucional. Ocupar, portanto, pode ser visto como crime.
É verdade. Mas as pessoas se esquecem que o direito à propriedade tem regras também. O espaço pre-ci-sa ter função social.
A moradia, para quem está com o MTST, é de graça?
Não. Por meio do movimento, as famílias podem acessar uma moradia pelo Programa Minha Casa Minha Vida do governo federal. Ele oferece financiamentos para famílias que têm de zero a três salários mínimos como renda. As famílias que são aceitas pelo programa iniciam esse financiamento, que é pago mensalmente para a Caixa Econômica. O pagamento mínimo estabelecido pelo programa é R$ 80 reais. Portanto, o movimento não recebe nada destas famílias. E nem das que não são, eventualmente, aceitas pelo programa. Elas são informadas, desde a chegada na ocupação, que a intenção do MTST não é favelizar aquele lugar. Não queremos construir ali um bairro de qualquer jeito, como aquele de onde a pessoa provavelmente veio; sem saneamento, sem água, sem luz, sem transporte, sem asfalto. Queremos que o governo negocie o espaço com o proprietário ou doe a área para a Caixa Econômica financiar a moradia, com as famílias participando da construção do projeto. Toda a assessoria jurídica é feita por ativistas militantes voluntários. Por isso, não cobramos taxa. Isso é bonito e precisa ser valorizado, não criminalizado. Ninguém está no MTST porque está recebendo dinheiro.
O MTST induz as pessoas a participarem das manifestações?
Não. MTST é um instrumento de organização das famílias, não indutores de nada. Nós funcionamos para que elas tenham voz, porque elas estão abandonas nas favelas e só são lembradas quando há uma ocupação ou quando cai um prédio. Quantas pessoas se comoviam com as famílias que estavam naquele prédio antes do desabamento? Aquelas famílias simbolizam a miséria que estava ali todos os dias e foi invisibilizada, ignorada.
Como o movimento se sustenta?
Com trabalho voluntário, doações a partir de uma plataforma online, e também doações de alimentos, roupas e afins, que vão para as ocupações. O trabalho voluntário no Brasil é diferente porque as pessoas acham que há alguém ganhando algo por trás. Sabe o que a gente ganha? Expectativa de vida, felicidade, esperança. É isso que a gente ganha com conquistas como a do conjunto habitacional João Cândido. Foram 384 famílias que saíram da condição de miséria e hoje moram num apartamento de três quartos, 64 metros quadrados, varanda e elevador. Essas famílias fizeram parte de ocupações do MTST e, depois de negociações com o governo, acessaram o programa de financiamento. Elas já fazem planos para voltar a estudar e pagar uma universidade para o filho, porque agora elas têm endereço; lugar pra receber a família e não estão gastando tudo o que recebem no aluguel.