Chamada de “pensadora contemporânea” por um professor de filosofia de Brasília, tema de mestrado e trabalho de conclusão de curso que analisaram músicas suas -- como as que dizem “está para nascer homem que vai mandar em mim” e “na cama faço de tudo, sou eu que te dou prazer, my pussy é o poder” --, Valesca é uma das percursoras do funk desbocado feminino. Nascida e criada no Irajá, bairro de Zeca Pagodinho, ela despontou quando ainda sensualizava na Gaiola das Popozudas, um dos mais famosos grupos de funk do começo dos anos 2000.
“Ainda hoje ouço críticas. Algumas pessoas dizem: ‘oh lá a favelada’. E sou mesmo, isso ninguém vai mudar”, diz ela, que não deixou os bailes de lado nem mesmo depois da fama. “Vou muito, principalmente no da Gaiola (localizado no bairro da Penha). Curto e preciso de referências. Muitas vezes, saio dos shows e vou direto pro baile. Volto só 9,10 horas da manhã".
No começo da carreira, a funkeira foi orientada por seu então empresário a começar a cantar, porque, dizia ele, só como dançarina, os dias estavam contados. Em seu primeiro show, cantando, levou latadas. “Nem eu entedia o que estava cantando. Gritava pra cacete”. Ir para estúdio era um terror. “Chorava, não saía nada, ficava rouca”, lembra ela que, até hoje, religiosamente, faz aulas de canto. "Só não pede pra eu dar um agudo".
Seu som funciona como um estimulante catártico para as mulheres. Principalmente na periferia, onde o gênero domina, mas ainda é majoritariamente cantado por homens e tem letras machistas. “Quando comecei, meu público era 100% masculino. Podia contar as mulheres nos dedos. Estava cansada de ficar ouvindo ‘gostosa, bucetão’, com os caras achando que estava ali à toa. Comecei a cantar pra elas. Deu certo, atingi a mulherada das comunidades e do asfalto [quem não mora na favela]”.
“Só com palavras você não consegue chegar nessas mulheres. E com música, sim. Elas dançam, cantam. O funk é a realidade da periferia. Vi que minhas letras estavam dando certo quando elas chegavam e falavam: 'cara, me identifico muito com você, com o seu jeito, a sua transparência'".