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Stalking: quando stalkear vira crime? Como denunciar e qual a pena?

Entenda o que é o stalking e quando a prática de stalkear vira crime - Getty Images
Entenda o que é o stalking e quando a prática de stalkear vira crime Imagem: Getty Images

Nicole D'Almeida

Colaboração para Universa, em São Paulo

08/09/2022 04h00

A palavra stalkear é derivada do verbo inglês "to stalk", que significa perseguição obsessiva. O ato de stalkear, portanto, é a atitude de uma pessoa de perseguir outra de forma persistente e constante. Essa perseguição pode ser praticada tanto digitalmente quanto presencialmente. No entanto, a única diferença é o meio usado, pois ambos ameaçam a integridade física e psicológica de alguém, interferindo na sua liberdade e na sua vida privada.

Por sua incidência ter aumentado com o passar dos anos, principalmente pelas facilidades e avanços nas redes sociais de se conseguir informações, o crime foi incluído no Código Penal em 2021. Contudo, a prática do stalking não é um conceito tão atual. Amanda Scalisse, advogada criminalista e sócia do escritório Angotti e Scalisse Advogadas, lembra que esse comportamento perseguidor surgiu na década de 1980, devido às perseguições que as celebridades sofriam.

É importante ressaltar que a prática de stalking é muito comum, principalmente no contexto da violência contra a mulher. De acordo com anuário divulgado em junho de 2022 pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública, houveram 27,7 mil denúncias de perseguição contra mulheres no ano de 2021. O anuário ainda mostrou que a cada 100 mil mulheres brasileiras, 35,8 foram vítimas de stalking no ano passado.

Universa conversou com especialistas para te ajudar a entender melhor sobre esse tipo de perseguição e como proceder caso se sinta ameaçada.

Stalking: o que é, punição e como denunciar

Quando stalkear vira crime?

De acordo com o artigo 147-A do Código Penal, o crime de stalking é definido como "perseguir alguém, reiteradamente e por qualquer meio, ameaçando-lhe a integridade física ou psicológica, restringindo-lhe a capacidade de locomoção ou, de qualquer forma, invadindo ou perturbando sua esfera de liberdade ou privacidade".

Peck e Scalisse chamam a atenção para o fato de que a ação precisa ser habitual, ou seja, persistente, para ser enquadrada em crime.

"O termo stalkear é frequentemente utilizado para se referir à prática de ver o perfil de uma pessoa nas redes sociais, mas é importante ressaltar que a mera curiosidade não configura infração penal", explica Scalisse.

Além disso, a integridade física ou psicológica da vítima deve estar ameaçada. "Ainda, fala em perturbação da esfera de liberdade ou privacidade, o que nos remonta tanto ao direito constitucional da liberdade e da privacidade quanto ao direito civil de ter sua privacidade respeitada", pontua Peck.

Qual a punição para quem comete stalking?

A punição para o crime de stalking é de prisão em reclusão de 6 meses a 2 anos e multa. "A pena é aumentada da metade se o crime for cometido contra criança, adolescente ou idoso, contra mulher por razões da condição de sexo feminino e se mediante o concurso de duas ou mais pessoas ou com o emprego de arma", acrescenta Castilho.

Quais os tipos e quem são os stalkers?

"Os stalkers são pessoas normalmente com problemas emocionais com tendência à baixa estima, o que pode estar associado às psicopatias ou sociopatias", explica Castilho.

Além desses pontos, a obsessão amorosa e a violência de gênero e/ou violência doméstica também podem ser motivos de perseguição. Dessa forma, sendo normalmente praticada por homens em detrimento de mulheres.

Peck acrescenta que o comportamento de um perseguidor pode incluir uma crença ilusória, um desejo, o fato de não superar um relacionamento anterior, sadismo, vontade de atormentar a vítima e lhe causar sofrimento, entre outros.

A advogada de Direito Digital pontua ainda os diferentes níveis de ação e de comportamento do perseguidor.

  • Stalker circunstancial: possui algum impacto emocional junto com fragilidades e, por isso, começa a perseguir a vida de alguém;
  • Stalker sociopata ou psicopata: não se importam com a pessoa ou a circunstância, infringem regras sociais e utilizam da perseguição para amenizar o mal que sentem em si mesmos;
  • Stalker fixador: possui fixação com uma única pessoa e faz da existência dela seu objetivo principal. Podemos citar os fãs (fanáticos) por seus ídolos, que baseiam sua vida e rotina na vida de seu ídolo.

"O que leva uma pessoa a stalkear a outra na maior parte das vezes, é vê-la com fanatismo por ser uma celebridade ou pelo seu status social, ou mesmo por alguma outra circunstância que a atraia dessa forma ao ponto de se tornar obcecado pela outra pessoa", afirma Castilho.

Como saber se estou sendo stalkeada?

Percebe-se que está sendo perseguido quando há uma certa insistência do stalker em saber tudo sobre a sua vida, até mesmo certos ou todos os detalhes. Muitas vezes ele até tem informações sem nunca ter te perguntado.

"O autor desse crime se torna obsessivo pela pessoa a quem persegue, representando-lhe uma ameaça à sua vida e à sua liberdade", explica Elyana Belchior Martins Castilho, advogada criminalista e professora de Direito Penal.

A internet acaba se tornando um dos principais meios para coletar qualquer tipo de informação de alguém. "Perfis de rede social abertos, a exposição excessiva de informações pessoais na rede, podem facilitar a ação do stalker", alerta Patricia Peck, advogada especialista em Direito Digital e professora da ESPM (Escola Superior de Propaganda e Marketing).

Scalisse explica que, normalmente, a perda da tranquilidade e a necessidade de mudanças na rotina ou de adotar medidas para afastar o perseguidor são os principais alertas.

Diferentes níveis de stalking

A perseguição pode ocorrer tanto pela internet quanto de forma física/presencial.

"Pode se dar de maneira distante fisicamente, casos em que geralmente o objetivo principal é afetar a integridade psicológica e invadir a privacidade da pessoa perseguida, podendo haver também ameaça à liberdade de locomoção em razão do medo gerado ou de forma mais próxima, que costuma restringir o direito de ir e vir da vítima e colocar sua integridade física em risco, além de lhe causar danos psicológicos", diz Scalisse.

No meio digital, ela pode acontecer, por exemplo, "pelos perfis de redes sociais, por meio de publicações, curtidas, envio de mensagens privadas ou por aplicativos, por e-mail, por videogames e podemos dizer, até pelo metaverso, que é uma forma mais recente de interação digital", exemplifica Peck.

Segundo Scalisse, percebe-se que há níveis de comportamento do perseguidor. No início, são ações menos ofensivas e, com o decorrer do tempo, começa a invasão de privacidade e ameaça à integridade psicológica e física.

Há diferença do stalking virtual para o físico na lei?

"Seja no mundo virtual ou no mundo físico, quem de qualquer forma restringe a capacidade de locomoção ou invade ou perturba a vítima em suas esferas de liberdade ou privacidade, comete o crime", explica Castilho.

Dessa forma, o ato pode ocorrer por ligações telefônicas, envio de mensagens, espera da passagem da vítima pelos lugares que frequenta, perseguição a pé ou motorizada, envio de presentes, divulgação de fatos ou boatos sobre a pessoa perseguida, entre outros.

Peck aponta que a única diferença é que no cyberstalking pode haver mais evidências, facilitando o registro da ocorrência e punição do infrator.

O que a vítima de um stalker deve fazer? Como denunciar?

Castilho indica que a vítima deve procurar uma delegacia de polícia mais próxima ou a delegacia eletrônica. É de extrema importância que não haja contato com o perseguidor, pois a situação pode evoluir para algo mais grave e perder o controle até vias de fato ou algo pior, alerta Peck.

Scalisse alerta para que, se a pessoa se sentir afetada de alguma forma, compartilhe com seus amigos e familiares, assim, poderá ter apoio e ajuda em situações de risco.

Outro ponto importante é guardar todas as provas do stalking. Valem mensagens recebidas, emails, ligações, fotos, vídeos, áudios e tudo que for lícito como comprovação.

Os prints não garantem a autenticidade e a veracidade da prova, uma vez que o conteúdo pode ser modificado, segundo a jurisprudência dos nossos tribunais. Por isso, é indicado que se preserve os elementos originais, como a própria conversa nas redes sociais, por exemplo.

"Por se tratar de crime de ação penal pública condicionada à representação, ou seja, para que a polícia siga com as investigações e posteriormente haja um processo judicial, a vítima deve manifestar formalmente sua vontade de que o perseguidor seja investigado e processado", explica Scalisse.

Dessa forma, o prazo para essa manifestação é de seis meses a partir da data em que a pessoa perseguida tomou ciência da identidade do autor do crime. No entanto, não há impedimento de denúncia quando a vítima não tem certeza ou não sabe da identidade do perseguidor.

"A investigação policial poderá servir para identificar o autor do crime e, nesses casos, a vítima também poderá apresentar representação no prazo de seis meses contado da data em que a identidade do perseguidor se tornar conhecida", conta a advogada criminalista.

Como evitar stalkers

Peck recomenda "evitar exposição demasiada, interagir com pessoas desconhecidas, não divulgar informações pessoais de forma excessiva e ser diligente no uso da internet".

Scalisse acredita que a divulgação de informação possa ser um ponto importante na tentativa de prevenir a ocorrência de casos ou minimizar os efeitos da prática. "Assim, os potenciais perseguidores saberão que a conduta é ilegal, o que pode inibi-los, e as vítimas conseguirão identificar a prática e buscar ajuda antes que seus efeitos se tornem graves ou irreversíveis".