TCU fará radiografia do assédio sexual na administração pública federal
A situação "alarmante" de mulheres alvo de assédio sexual no ambiente de trabalho levou o Tribunal de Contas da União (TCU) a determinar, de forma inédita, a realização de uma auditoria operacional para elaborar uma radiografia do tema na administração pública federal. O objetivo é avaliar o desempenho do sistema de prevenção e combate ao assédio sexual no ambiente de trabalho.
A proposta partiu do ministro Bruno Dantas, que citou dados de uma pesquisa realizada por LinkedIn e Think Eva. O levantamento, antecipado pelo Estadão, revelou que 47% das 381 mulheres ouvidas afirmam já ter sofrido assédio sexual no ambiente de trabalho.
Dantas elencou auditorias conduzidas por órgãos de fiscalização em outros países, como Estados Unidos e Canadá, ou até mesmo pelo Parlamento, como no Reino Unido e na União Europeia. Segundo ele, esses estudos já demonstraram os impactos negativos na produtividade e maior rotatividade das funcionárias alvo de assédio sexual.
"São evidências que demonstram claramente não apenas a relevância do tema, mas também como uma entidade de fiscalização superior pode atuar e contribuir para sua melhoria. Sem dúvida, trata-se de questão relevante, não só do ponto de vista individual, mas também social, razão pela qual considero oportuna e desejável alguma atuação desta corte", afirmou Dantas ao defender a auditoria.
Ele citou ainda o ineditismo desse tipo de trabalho no Brasil e o fato de sistemas de combate e prevenção ao assédio sexual no ambiente de trabalho no País ainda serem "muito incipientes".
Embora aprovada pelo plenário do TCU, a proposta foi alvo de ponderações feitas pelo ministro Benjamin Zymler. Segundo ele, com maior número de funcionários trabalhando de forma remota na administração pública, "a possibilidade atual de assédio sexual reduziu-se muito". Além disso, de acordo com o ministro, não há nenhum canal específico hoje na administração para acolher eventuais denúncias de assédio sexual, que seriam analisadas no âmbito de Processos Administrativos Disciplinares (PADs).
"Meu medo é que a gente não tenha nada a analisar", disse Zymler. "Teria que construir um modelo de compliance. Não é exatamente uma auditoria", acrescentou.
Dantas reforçou a necessidade da ação do TCU. "Há uma percepção difusa de que a administração pública brasileira não endereça de maneira satisfatória questões como essa, exatamente por não ter instrumentos, canais e políticas que efetivamente coíbam esse tipo de comportamento impróprio", afirmou o ministro.
O plenário acertou que a Secretaria-Geral de Controle Externo (Segecex) do TCU vai elaborar um plano de trabalho para definir o escopo e a matriz para a realização da auditoria, quais órgãos serão alvo - de acordo com a percepção de maior ou menor risco - e como será o método de análise.
"O que nós queremos é obter uma fotografia que seja suficientemente clara de uma política administrativa absolutamente necessária. É algo que está sendo feito no mundo inteiro. Isso insere o Brasil nessa agenda, direito das mulheres, das minorias", afirmou Dantas.
Ele disse ainda que, eventualmente, a corte de contas pode identificar boas práticas que até sirvam de paradigma para uma política de combate ao assédio sexual. "Não posso afirmar que teríamos uma chance grande de auditar o nada", afirmou.
Pesquisa
Em sua defesa pela realização do trabalho, Dantas citou informações do Government Accountability Office (GAO), entidade de fiscalização superior dos Estados Unidos, que abordou o tema do assédio sexual em trabalho recente.
Segundo informações do órgão americano, a probabilidade de ocorrência de assédio sexual em ambiente de trabalho é maior no caso de mulheres, trabalhadores jovens e mulheres em ambientes majoritariamente masculinos.
O GAO também apontou que as mulheres atuantes em agências de pesquisa têm grande papel no fortalecimento da competitividade do país, mas o assédio sexual poderia tornar mais difícil a atratividade desse campo para as mulheres, afetando a qualidade da pesquisa nacional.
Reportagem recente do Estadão mostrou que 90% das cientistas premiadas do Brasil relatam terem sido alvo de machismo.
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