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Após estupro coletivo, indiana é submetida a "ritual purificador" com pedra de 10 kg na cabeça

A mulher de 23 anos, mãe de dois filhos, sofreu estupros coletivos durante meses - BBC
A mulher de 23 anos, mãe de dois filhos, sofreu estupros coletivos durante meses Imagem: BBC

Ankur Jain

Da BBC, na Índia

16/06/2015 12h49

Ela tem 23 anos e foi repetidamente estuprada por diferentes homens depois de ter sido sequestrada, no oeste da Índia. Como consequência, não apenas engravidou como está sendo obrigada pela comunidade local a passar por "testes de purificação" --um ritual que persiste nessa parte do território indiano, apesar de sua crueldade.

A mulher, que não pode ser identificada por questões legais, é tímida e de voz suave. Ela morava com o marido e dois filhos em Surat quando foi raptada, em julho de 2014, e estuprada várias vezes por mais de cinco homens durante oito meses.

Diversos casos de estupro coletivo têm causado forte repercussão na Índia, sobretudo quando, em 2012, uma estudante foi assassinada depois de ser violentada em um ônibus em Nova Déli. O governo endureceu as leis contra esse tipo de crime em 2013, após diversas manifestações de indignação pelo caso.

Mas o estigma em torno das vítimas permanece. No caso da jovem de Surat, seu pedido para realizar um aborto foi rejeitado pela Suprema Corte local, pois a gravidez já estava muito avançada.

Antes, ela vivia com os sogros, mas estes não a querem de volta. Agora, mora com o marido e os dois filhos em uma casa de dois cômodos no vilarejo de Devaliya, no Estado de Gujarat.

A jovem passa todo o tempo com os filhos, abraçada a eles.

Os pais da mulher a aceitam de volta, mas temem que o bebê que está prestes a nascer, fruto do estupro, traga consequências para o resto da família.

"Tenho outros dois filhos, ambos solteiros. Se ela tiver o bebê e ficar com ele, ninguém vai se casar com (meus filhos)", explicou a mãe da jovem. "Meu filho de 14 anos será expulso. A única saída é que ela passe pelo 'chokha thavani viddhi' (ritual de purificação) e qualquer que seja a decisão da comunidade será final."

Sistema religioso

O ritual é realizado entre os membros da comunidade devipujak, em Gujarat, à qual a vítima pertence. Os devipujak têm seu próprio sistema de Justiça para decidir a respeito de vários assuntos, incluindo infidelidade e estupro.

Não está claro se essas audiências passaram pelo crivo das autoridades da região, mas elas nunca foram investigadas pela polícia.

Um idoso do vilarejo, Odhabhai Devipujak, explicou que o ritual de purificação é conduzido por um sacerdote específico, que pratica a magia negra e acredita em poderes sobrenaturais, e cuja existência precede a das cortes de Justiça e polícia.

No ritual, o sacerdote faz várias perguntas à mulher ou garota que sofreu o estupro e "descobre" se ela está falando a verdade com o seguinte método: pegando um punhado de sementes de cevada de um saco e pedindo que ela adivinhe se o número de sementes que ele tem na mão é par ou ímpar.

Se a menina ou a mulher errar a resposta, o sacerdote presume que as outras respostas dadas eram mentira.

Ela então tem de repetir o processo com uma pedra de dez quilos na cabeça. Ela precisa manter a pedra equilibrada na cabeça até que o sacerdote esteja satisfeito e acredite que ela está falando a verdade.

"Às vezes, leva meses para purificar, pois a pessoa está inicialmente mentindo, mas a deusa sabe de tudo e eventualmente elas precisam falar a verdade", disse o idoso.

"Quando a garota é purificada e passa no teste, ninguém pode criticar a família ou deixá-la no ostracismo. Mas se a garota não passar no teste e a Deusa disser que ela não é pura, então, ela pode ser isolada da comunidade", acrescentou o idoso.

Apenas mulheres

Sardasinh Mori, um amigo da família da vítima, afirmou que esses procedimentos são exigidos apenas de mulheres.

"Toda vez que um marido tem dúvidas sobre a mulher ou uma menina solteira é acusada de ter um caso, para purificar uma mulher e libertá-la das transgressões, é feito o processo de purificação. Para os homens, a corte da comunidade faz testes para saber se eles estão falando mentiras, mas nenhuma purificação é usada", explicou.

O marido da vítima, um carroceiro, disse que vai apoiar a mulher.

"Vou ficar com ela. Tenho dois filhos e não posso casar de novo", afirmou.

A vítima disse que se sente dividida: parte dela quer ficar com o bebê, mas o destino dela e do bebê está nas mãos de entre cem e 200 pessoas que participam do ritual de purificação.

"Se eu estiver errada, então, a Deusa dirá a eles", disse.