Tribo indígena inspira peças da coleção de verão da Cavalera na SPFW
A Cavalera apostou forte na proposta étnica ao estabelecer parceria com a tribo Mutum e incluir, na coleção Verão 2016, peças com estampas inspiradas nos desenhos produzidos pelos integrantes dos Yawanawá, que vivem no Acre, às margens do Rio Gregório. Ao todo, 20 índios, capitaneados pela cacique Mariazinha, 46 anos, vieram a São Paulo --17 deles, aliás, estavam visitando a cidade pela primeira vez, incluindo sua líder-- para realizar o ritual Vekushi, que visa promover a purificação espiritual, durante o desfile.
No backstage, a tribo se preparava como de costume, ainda que em cenário completamente diferente do habitual. Aplicavam suas tintas, produzidas a partir de urucum nas cores preto e vermelho; vestiam cocares; realizavam desenhos no rosto --tudo no caótico ambiente de corre-corre das equipes da marca que ali estavam trabalhando e de jornalistas que transitavam pelo local.
"Não dá para dizer que estou gostando de São Paulo. O pessoal que nos trouxe está nos tratando muito bem, fomos muito bem recebidos, mas aqui é muito diferente de onde vivemos", comenta Mariazinha, ao UOL Moda. "As pessoas são muito individualistas na cidade. E vivemos em uma comunidade e em coletividade na floresta, e o silêncio é o nosso mundo. É uma experiência estranha."
A ideia da parceria nasceu após uma viagem do diretor criativo da marca, Alberto Hiar, que há tempos buscava formas de inserir, de maneira mais consistente, a cultura brasileira nas coleções da Cavalera, cujo DNA traz um pé forte no rock. Conversando com os líderes da tribo, Hiar estabeleceu o trabalho em conjunto e gerou a coleção "Kenes" --nome dos desenhos que possuem representação espiritual na cultura local.
Nas estampas, prevalecem ponta de lança, borboleta, jiboia, andorinhas, tramas de rede e onça. Na cartela de cores, amarelo, azul turquesa, vermelho, branco, preto e cáqui. A maioria dos tecidos foi importada da França, Índia e Turquia.
Força feminina
Falando sobre sua cultura, Mariazinha explica como a questão das igualdades de gêneros tem grande importância na estruturação da tribo Mutum. Ela assumiu o posto de cacique por indicação familiar e se diz respeitada da mesma forma que um cacique homem seria. Filha de um ex-cacique, Mariazinha foi a escolhida entre 30 irmãos para chefiar.
"Não é normal ter mulher cacique, porque os homens ainda são preconceituosos e não aceitam receber ordens de uma mulher", comenta. "Mas hoje, onde atuo, as coisas são diferentes. Existe muito respeito, apoio e carinho por parte de todos." Ela conta ainda que algumas de suas irmãs e outras mulheres na aldeia possuem também posições importantes, atuando lado a lado na comunidade.
"É a força da natureza que diz que nós temos que nos destacar nesse momento", afirma. "Tem coisas que os homens não sabem fazer e nós sabemos. A mulher tem de acreditar em si e saber que também pode atuar para ganhar a confiança de outras pessoas, para ajudá-la a crescer cada vez mais."
O pajé Matsini, de 37, ajuda a tribo nas questões culturais --foi ele quem os representou nos contatos com a Cavalera-- e, assim como Mariazinha, também fortalece o discurso de empoderamento da mulher entre os Mutum.
"Vivemos um momento muito importante dentro do nosso povo, porque antes as mulheres acabavam ficando mais em casa. Hoje elas têm mostrado sua importância nas tarefas da comunidade. Estão se destacando cada vez mais." E conclui: "Sem as mulheres, nós não somos nada".
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