Nu masculino ainda é tabu e reflete desigualdade de gênero
É raro ver um homem nu nas revistas, no cinema e nos programas de TV. Quando isso acontece, a exposição costuma ser velada, dificilmente a nudez frontal masculina aparece nas telas. Recentemente, as séries “Game of Thrones” (HBO) e “Sense8” (Netflix) quebraram esse tabu, acendendo a polêmica. O ator Kevin Bacon também estrelou uma campanha em favor de mais exposição dos corpos masculinos nos filmes de Hollywood.
Enquanto a nudez feminina costuma ser explorada massivamente sem tantos questionamentos, poucos são os momentos em que o nu masculino é exibido com a mesma naturalidade.
Na análise de Camilo Braz, professor de antropologia na UFG (Universidade Federal de Goiás), para entender essa diferença deve-se levar em conta as normais culturais de uma sociedade desigual em termos de gênero e sexualidade.
As relações de gênero na exploração da nudez fazem parte de um contexto histórico. A professora de artes da UFPR (Universidade Federal do Paraná) Stephanie Dahn Batista, doutora em história, diz que ao longo dos séculos o homem ocupou o papel de observador nas obras de arte.
“O corpo feminino sempre apareceu como objeto de desejo, reflexo de uma relação de poder, o artista era masculino e o modelo feminino”, diz Stephanie.
Apesar dos avanços nas últimas décadas, a professora da UFPR conta que ainda hoje os alunos têm dificuldade em sustentar o olhar nas aulas em que a nudez masculina é mostrada. “Não há o hábito de ver o nu masculino com toda liberdade, essa nudez ainda causa constrangimento e estranheza”, fala Stephanie.
Nu na TV brasileira
A igualdade na nudez midiática ainda está longe de ser alcançada, porém a exposição masculina tem ficado cada vez mais frequente.
A novela “Verdades Secretas”, exibida pela Globo na faixa das 23h em 2015, teve alguns nus masculinos. O ator Adriano Toloza, que contracenou despido com a atriz Guilhermina Guinle, lembra do burburinho que a cena provocou nas redes sociais. “A nudez masculina costuma chamar mais atenção e causar mais polêmica.”
Apesar de encarar a nudez em cena com naturalidade quando existe um propósito, Toloza, que também já atuou nu no teatro, diz que os brasileiros não estão prontos para ver um frontal masculino na TV. “Temos uma sociedade ainda muito conservadora e agarrada aos conceitos morais”, afirma.
Na opinião do ator, esse comportamento é fruto de uma visão patriarcal. “Carregamos essa cultura machista de que só os homens são merecedores de certos prazeres.”
Com exceção dos materiais pornográficos, ainda existem poucos produtos culturais que dão destaque para a nudez masculina.
O fotógrafo Gianfranco Briceño só se deu conta desse vácuo no mercado depois de lançar o fanzine “Snaps”, com fotos de homens nus sob luz natural, que alcançou mais repercussão do que ele esperava. “Só havia pornografia ou conteúdos mais voltados para o público gay”, afirma.
Briceño fez questão de retratar o corpo masculino por completo, sem evitar a nudez frontal, mas nota que esse ainda é um tabu. “Por ser um órgão interno, a exposição da vagina é mais tolerada, já o pênis precisa ser escondido, como se a sexualidade tivesse de ser oculta.”
Belo e masculinidade hegemônica
A nudez masculina, apesar de mais rara, não é novidade no mundo das artes. Em 1504, a escultura de David nu, do artista renascentista Michelangelo, foi exposta em praça pública em Florença, na Itália.Porém, nesse contexto, o corpo masculino é associado ao sublime e à figura do herói, não a um homem de carne e osso. “O belo masculino vem sempre muito idealizado”, afirma Stephanie Dahn.
A falta de exposição dos homens, segundo Camilo Braz, também se relaciona com a valorização da norma heterossexual e do controle dos corpos. “A nudez pode ser vista como ameaçadora à masculinidade hegemônica que, por ser frágil, é constantemente reiterada.”
É difícil prever quando ver um homem nu na TV será tão comum quanto assistir a uma mulher nua. A mudança depende também das transformações culturais e dos avanços na igualdade de gênero, o que sutilmente vem acontecendo em alguns setores.
“Percebo que a moda tem colocado mais homens nus em suas propagandas”, diz o fotógrafo Gianfranco Briceño.
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