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Machismo faz homens se suicidarem mais do que mulheres

Homens constroem sua identidade em cima dos papeis de trabalhador e provedor - Getty Images
Homens constroem sua identidade em cima dos papeis de trabalhador e provedor Imagem: Getty Images

Natália Eiras

Do UOL

07/12/2016 07h00

A história do que homem que se mata por ter perdido todas as suas economias parece ter saído do início dos anos 1990, quando houve o confisco do Plano Collor. Este tipo de enredo, no entanto, ainda se repete em pleno 2016: casos de “chefes de família” que cometeram suicídio após perderem o emprego ganharam espaço nos noticiários nos últimos meses. De acordo com especialistas, mesmo não sendo mais os únicos provedores, homens se matam de três a quatro vezes mais do que as mulheres. O motivo? A cultura -machista- de que eles devem pagar todas as contas e jamais demonstrar fraqueza.

O Mapa da Violência feito pela Flacso Brasil (Faculdade Latinoamericana de Ciências Sociais) e divulgado em 2014, mostrou que 78,1% dos suicídios no país em 2012 foram cometidos por homens. Karen Scavacini, psicoterapeuta e idealizadora do Instituto Vita Alere de Prevenção e Posvenção do Suicídio, diz que os números entre a população masculina são maiores porque eles procuram menos ajuda. "O próprio homem e a sociedade colocam o peso de que ele tem que ser forte e suportar tudo. Quando não aguenta, ele se sente um fracassado", fala a especialista.

Momentos de instabilidade econômica tendem a aumentar a incidência de suicídios e os homens estão mais vulneráveis por terem menos flexibilidade para lidar com as adversidades. Segundo Alexandrina Meleiro, psiquiatra do Hospital das Clínicas de São Paulo, isto se dá porque o homem molda toda a sua identidade em cima de seu papel de trabalhador e provedor. "A mulher tem outros papéis, além do ligado à sua profissão. Por isso ela consegue entender mais rápido que está sem um emprego e sai à procura de um novo", afirma.

A profissional ainda diz que o fator de risco de uma pessoa desempregada é maior nos dois primeiros meses. Porém, a demissão muitas vezes não é a causa do suicídio. Em seus 15 anos como voluntário do Centro de Valorização da Vida, o engenheiro Carlos Correia percebeu que muitas vezes a pessoa já está passando por um processo e o momento de crise é o fator detonador. "Por ter problemas de autoestima ou questões familiares, a pessoa vai perdendo os tentáculos que a mantêm em pé. Assim, a falta momentânea de dinheiro é algo muito pesado para alguém que já está extremamente vulnerável", narra.

Homem precisa chorar

O comportamento suicida no homem aparece de maneira muito particular. "Ele começa a abusar mais do álcool e outras substâncias, além de se isolar socialmente e ficar mais agressivo", fala Neury Botega, psiquiatra e professor da faculdade de medicina da Unicamp (Universidade Estadual de Campinas), em São Paulo. Uma baixa tolerância à frustração também é um indício, além de falas mais melancólicas. "É importante levar a sério frases que se referem ao fim da vida, à sensação de inutilidade, ao não encontrar saída", conclui.

Neury afirma que a psicoterapia é o melhor jeito de criar um maior desenvolvimento emocional do homem e prevenir o suicídio, além de dificultar o acesso aos meios letais. Porém, Scavacini também pontua a importância de um trabalho de longo a prazo que começaria na conscientização da população masculina desde a infância. "Meninos precisam aprender que não devem aguentar tudo. Deveria haver educação no sentido de mostrar ao homem que ele pode buscar ajuda e que isso não significa ser covarde ou fraco", diz. "Se ele permitir mostrar emoção, vai enfartar menos, diminuir as chances de um derrame e a possibilidade de suicídio. O homem precisa chorar", completa Alexandrina.