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Stalkear é medida de segurança, mas pode fazer relacionamento fracassar

Getty Images
Imagem: Getty Images

Gabriela Guimarães e Marina Oliveira

Colaboração para o UOL, em São Paulo

03/04/2017 04h00

Com as redes sociais, ficou muito mais fácil tornar-se um "stalker", palavra em inglês que denomina alguém que rastreia os passos de outra pessoa on-line. Facebook, Twitter, Instagram, LinkedIn, Snapchat e, é claro, Google são um prato cheio para quem está querendo saber mais sobre o pretendente amoroso. Hoje, antes de sair com alguém, é quase uma regra jogar o nome dele na rede e vasculhar os rastros digitais.

"Dentro de certos limites, é até aconselhável fazer isso, porque é ingênuo confiar cegamente em um desconhecido. Há criminosos por aí, mas também mentirosos, pessoas que já são comprometidas e não contam”, diz o psicólogo Ailton Amélio, professor da Universidade de São Paulo.

A naturalidade da relação fica comprometida

Mas nem sempre o stalking é motivado por questões de segurança e é aí que mora o problema. "Às vezes, a pessoa pesquisa para chegar mais confiante ao primeiro encontro, para pensar em alguns assuntos que tenham a ver com o par", diz a psicóloga Ana Luiza Mano, do Núcleo de Pesquisa da Psicologia em Informática da PUC-SP (Pontifícia Universidade Católica de São Paulo). "Mas, com isso, também perde o inusitado, a oportunidade de se surpreender ao perceber, na hora, que ambos têm interesses em comum", explica a psicóloga.

Tendo uma ideia do que poderá ser dito pelo outro, a conversa dificilmente se tornará empolgante. E o que movimenta a relação, no início, é justamente a vontade de saber mais sobre o par. Ter acesso a um monte de informações também ajuda a alimentar expectativas, que podem não ser correspondidas, afundando o relacionamento antes mesmo que ele ganhe fôlego para se desenvolver. "A pessoa também pode se tornar seletiva demais com a paranoia de investigar e, sem conhecer pessoalmente o outro, achar que ninguém é bom o bastante", diz a psicóloga e terapeuta de casal Maria Teresa Reginato.

Nem tudo é aquilo que se vê 

A interpretação de cada um é outro fator que pesa. "Quando você posta algo, tem uma ideia em mente, daquilo que gostaria de falar. Mas isso pode ser diferente do que efetivamente fala e, principalmente, do que a outra pessoa lê", explica a psicóloga. Por exemplo: a mulher com quem vai sair posta uma foto com um homem, que pode ser um amigo, um primo ou colega de trabalho. "Mas não é difícil o outro achar que é um namorado ou alguém com quem ela está saindo e já transformar aquilo em um cenário de caos", diz Ana Luiza.

Embora a primeira justificativa para o stalking seja saber onde está pisando, o comportamento não garante informações verdadeiras, porque cada um cria o personagem que mais lhe convém na internet. E a maioria das pessoas destaca apenas os próprios pontos positivos. São raros os usuários que desabafam sobre seus medos, inseguranças, carências e questões emocionais mal resolvidas. "A realidade é uma só: não há jeito de conhecer melhor uma pessoa do que passando um tempo ela", diz Ana Luiza.

A confiança da relação fica abalada 

Uma questão igualmente delicada é que o stalker não costuma contar para o outro o que, de fato, vasculhou sobre a vida dele – ainda mais quando essa investigação inclui entrar nas páginas de ex-namorados, amigos e familiares. Dessa forma, a relação já começa com uma dissimulação. "O relacionamento tem que estar baseado em confiança. Sem isso, eu não compartilho intimidades e não me comprometo. A relação fica superficial e crescem as chances de ela não ir para a frente", diz Amélio.

Não falar a respeito do que descobre também pode gerar angústia. "Você não conversa sobre as descobertas feitas, guarda para você e acaba criando situações que podem causar sofrimento", diz Ana Luiza.

O stalking pode fazer mal

Em alguns casos, o desejo de skaltear o par pode ser um sinal de alerta para lidar com a própria falta de autoconfiança. "Em geral, quem é desconfiado no início permanece assim durante toda a relação. É o tipo de pessoa que pode começar a namorar e já suspeitar que está sendo traído", diz Ailton Amélio.

Os especialistas concordam que não há problema algum em buscar mais informações on-line sobre um desconhecido, mas é preciso perceber quando a ação está saindo do controle. "Um sinal de que está passando dos limites é ficar tão angustiado com o resultado da investigação que não consegue nem curtir a pessoa quando está com ela, ao vivo, porque está preso nos próprios pensamentos", diz Ana Luiza.