"'Gorda' não é ofensa", diz a top brasileira mais famosa da moda plus size
Desde que a brasileira Fluvia Lacerda se tornou uma das modelos mais requisitadas do setor plus size internacional, publicações de moda insistem em chamá-la de "Gisele Bündchen GG". Poderia ser um elogio para muitas, mas a comparação não agrada a Fluvia.
"Me atrelaram a uma mulher magra como se me dessem um selo de aprovação", diz ela. "Sou modelo há 15 anos, lutei muito para me dar bem e mereço ser conhecida pelo meu nome".
Nascida em Boa Vista (RR), Fluvia, 36, vem ajudando a democratizar os rígidos padrões da moda. Nunca precisou emagrecer para fazer grandes trabalhos, como um editorial da Vogue italiana, ou estrelar campanhas de cosméticos, como da americana Target. No Brasil, está lançando agora uma coleção de bodies, em parceria com a grife Kaone - referência no universo plus size.
Mantém seus 110 cm de busto, 83 cm de cintura, 133 cm de quadril e o manequim entre 50 e 54. Peso, faz questão de nem saber.
"Crescemos aprendendo que a palavra 'gorda' é um xingamento", explica a modelo, que nunca recorre a eufemismos para se descrever. Chamar de "gordinha" ou "curvilínea", segundo a top, só reforça o preconceito.
"Para algumas mulheres ser chamada de 'gorda' é pior do que ser classificada como incompetente ou irresponsável. Não vejo nada de ofensivo nessa palavra."
Aqui, a modelo fala sobre os altos e baixos de sua carreira e dá uma lição de autoestima.
"Me recuso a usar roupas que emagrecem"
"Mudei para Nova York em 1996, para estudar inglês. Para pagar as contas, fui faxineira e babá. Só comecei a modelar mesmo em 2003, quando uma editora de moda me viu em um ônibus e me chamou para trabalhar.
Sei que jamais teria construído a carreira que tenho hoje se fosse no Brasil. O mercado plus size nacional despontou há pouquíssimo tempo e a mentalidade brasileira ainda é atrasada.
Uma vez fui posar para uma revista e o fotógrafo me colocou de roupa preta em um fundo preto. Falei que não faria daquela maneira. Sempre deixo claro na hora de fotografar que não aceito ser escondida em 'roupas que emagrecem' e vejo o 'trincar' dos dentes das pessoas.
Por isso, sinto que ainda choco os profissionais da moda."
"Me acho muito sexy"
"A família da minha mãe é totalmente caucasiana, enquanto a do meu pai é cearense. Daí vem a minha cintura fina e o quadril mais largo. Eu sim, represento a mulher brasileira.
Quando visto uma roupa legal, passo um batom vermelho e pego um bronze, me sinto maravilhosa! Tenho a autoestima que toda mulher deveria ter.
Me olho no espelho e dou um baita valor para tudo o que vejo. A aparência é só uma das coisas que constituem uma mulher. Toda manhã, acordo e repito pra mim mesma que a vida é muito curta para nos jogarmos para baixo.
Não entendo porque as mulheres se permitem ser tão massacradas! De perderem o seu valor por não vestirem manequim 36 ou 38."
"Nunca fiz dieta. Não sei nem por onde começa"
"Magreza não é sinônimo de saúde. Sempre fui gorda e saudável. Há muitas modelos magras que sofrem com transtorno alimentar, usam drogas e não são nada saudáveis. Porém, curiosamente, esse questionamento de saúde é sempre feito às mulheres plus size.
No Brasil a cara de pau das pessoas chega a me assustar. Dão palpites, sugerem dietas às gordas sem que elas peçam.
Tenho uma personalidade muito forte, que me protege de qualquer palpite sobre a minha vida. As pessoas têm um certo medo de mim.
Uma única vez só, um membro da minha família já chegou a sugerir que eu fizesse uma 'lipo' para reduzir os quadris."
"Nudez não é tabu para mim"
"Tem um monte de publicações internacionais de moda colocando modelos plus size na capa, mas eu, que sou o nome mais popular do meu país, não consigo esse espaço. Isso para mim é gordofobia. Meu maior sonho é ser capa de uma revista de moda brasileira.
Já posei para a Playboy, nudez para mim, nunca foi tabu. Fui a primeira gorda a ser capa da edição de aniversário da revista. Não foi um divisor de águas, mas foi legal.
Eu mexi com o ódio e a mentalidade preconceituosa dos brasileiros."
"Vou lançar minha biografia"
"Trabalhar só como modelo é muito limitado. Por isso, sou muito focada também em negócios de moda. Acabei de lançar uma coleção de bodies, por exemplo. Quero contribuir para o crescimento do mercado plus size.
Para o final de agosto está previsto também o lançamento da minha biografia pela Companhia das Letras. Vai ser um misto da minha história com lições de autoajuda.
Já ouvi muitos relatos de massacre emocional vivido por meninas jovens, que estão sempre insatisfeitas com sua imagem. É preciso questionar os padrões e repassar novos valores para gerações futuras."
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