Aos 28 anos, Luisa Dörr é o olho afiado e talentoso por trás dos retratos do projeto "Firsts", uma lista de 46 das mulheres mais influentes do mundo eleitas pela revista americana "Time". Para ela, a proposta ambiciosa era, em si, "a first", como brincou em entrevista ao UOL. Isto porque, apesar de já ter colaborado para publicações como o jornal britânico "The Telegraph", as revistas "Marie Claire South Korea" e "Vice", esta seria a primeira vez em que a gaúcha de Lajeado fotografaria uma capa em sua carreira.
Abraçar de cara um convite como este representava um desafio enorme para Luisa, formada em fotografia pela Universidade Luterana do Brasil (ULBRA). "Eu tentava por um momento esquecer quão importantes eram estas pessoas e visualizava apenas o ser humano na minha frente, [para] fazer o melhor retrato possível. Queria que eu e elas saíssemos satisfeitas".
"Todas essas mulheres eram inspiradoras. Mais do que apenas mulheres, vi seres humanos e profissionais incríveis. Todos passaram por muitas lutas apenas para consolidar lentamente um lugar na sociedade. Essa energia de luta positiva, nunca desistindo, é o que mais me inspirou".
Como ela chegou à capa da Time
A chegada da brasileira aos bastidores do projeto de uma das maiores marcas de mídia do mundo não foi nada convencional. Luisa foi escolhida a dedo por Kira Pollack, diretora de fotografia da "Time", através de seu Instagram. "Ela me descobriu por acaso enquanto olhava o feed e gostou desta estética".
A ideia então de clicar o projeto inteiro com um iPhone acabou surgindo organicamente, da vontade de reproduzir aquela atmosfera intimista de seus posts — e que poderia ser prejudicada pela presença intimidadora de uma lente de grande porte. "Não é possível ter o mesmo resultado com uma câmera. São ferramentas diferentes e o sujeito reage de [um jeito] diferente".
Mas, na comunidade de fotografia, a escolha da ferramenta para os cliques e da própria Luisa como profissional gerou polêmica. Houve quem criticasse se o resultado seria profissional e até quem questionasse se ela não teria uma ligação mais próxima com Kira ou com a Apple — que, apesar de citada inúmeras vezes durante a divulgação do "Firsts", não forneceu material ou patrocínio para ela, segundo Luísa.
"Com o smartphone, todo o mundo tem uma câmera no bolso, mas não significa que todo mundo seja fotógrafo. Do mesmo jeito que carregando uma caneta e papel no bolso não significa que você seja escritor. Se você permanece em um debate em torno dos aspectos técnicos, você estará sempre longe da experiência real. As ferramentas são apenas um meio. Elas ajudam no processo, mas não criam. Acredito que, com esse projeto, conseguimos inspirar fotógrafos aficionados que só dispõem de um telefone no momento", refletiu durante o papo com o UOL.
Luisa faz questão de responder as críticas sobre sua escolha e seu papel na concepção do "Firsts", segundo ela, por respeito aos colegas e por ainda considerar o meio muito egoísta. Em um post no Facebook, ela escreveu: "Foi sorte? Sim, muita. Mas só com sorte não teria conseguido fazer 12 capas. Ela tem amigas lá dentro? Antes, não. Agora tenho um monte de amigas fantásticas lá dentro. Prostituindo a fotografia? A única prostituição é a do fotógrafo que tem que fotografar imagens que não o emocionam, dia após dia".
O projeto "Firsts" e o poder feminino
Em sua primeira viagem à Nova York para uma reunião do "Firsts", em agosto de 2016, Luisa encontrou uma pauta ainda tímida, mas que logo evoluiu e mapeou quais mulheres foram pioneiras ao quebrar o teto de vidro de seus nichos e abrir espaços para que outras se tornassem tão bem sucedidas quanto elas. Oprah Winfrey, Selena Gomez, Serena Williams e Hillary Clinton são apenas algumas das famosas, que se uniram à diplomatas, cientistas e mais. "Ninguém nunca imaginaria que o projeto tomaria esta forma e seria algo tão grande. Começamos com uma dúzia de fotos e foi crescendo".
A primeira passagem de Luisa pela cidade durou quase quatro meses, trabalhando com dois outros membros da redação da revista que fizeram a captação não só de fotos, mas de vídeos de cada mulher. Em janeiro de 2017, ela retornaria para trabalhar até março. O resultado é uma peça multimídia, um índice com mini-documentários, fotos e texto da trajetória destes nomes inspiradores, um livro, 36 páginas no interior da revista e 12 capas — a primeira vez que a "Time' se dedica a fazer tantas covers de uma só vez. "Até hoje, no máximo, tinham sido feitas cinco".
Para Luisa, uma mulher enxergando outras atrás das câmeras emprestou à ideia um viés único. "Todo o projeto foi feito por mulheres. Kira, editoras, staff de vídeo e eu fazendo a fotos. Acho que o conjunto, o time, deu mais força a ele".
Os bastidores do ensaio
Tantas mulheres com agendas apertadas representaram um malabarismo para a execução das imagens. "Eu tive que aprender a trabalhar com o que eu tinha e não com o que eu queria ou imaginava".
"Chegávamos no lugar da foto em média 1h30 antes da sessão, as duas meninas do vídeo iam montar o set delas em um lugar tranquilo e eu tinha que buscar meu cenário dentro do que me permitiam usar. Nada estava produzido me esperando para o clique. Era tudo feito na hora, tinha que buscar a solução sempre antes de cada foto. Manter em conta a estética do projeto, procurar contexto que nem sempre era possível. Às vezes só me permitiam usar uma sala, uma parede".
Com pouca produção para cada clique, fotografar com o telefone (ela se alternou entre um iPhone 6, um 6S e um 7 Plus) era ainda mais difícil. "Você precisa pensar na foto da mesma forma, compor e trabalhar com a luz que você tem. Muitas vezes tive que fotografar em um lugar que não gostava tanto porque a luz era ruim onde eu queria". Para os retoques finais, Luisa só dispôs do aplicativo Snapseed. Mas estes não eram os únicos desafios.
"Eu já era fã de várias mulheres e virei fã de muitas outras. Mas [a foto da] Aretha Franklin foi aquela em que estive mais nervosa, porque sou fã dela. E ela, por exemplo, me deu dois minutos!". Luisa conta que até hoje não conseguiu escolher uma foto favorita, mas que gosta muito de algumas como a da economista Janet Yellen e da piloto Danica Patrick.
"Fico muito feliz e honrada que eu tenha sido escolhida para este trabalho histórico", concluiu. "A Kira é uma visionária. Espero que outros editores também trabalhem com fotógrafos desconhecidos, saiam um pouco do eixo EUA e Europa. Na verdade nunca sabemos quem está nos vigiando, sou a prova disso. Espero que as pessoas continuem fazendo seu melhor e que com sorte um dia possam ter uma chance, uma oportunidade de mostrar que são capazes. Só é preciso uma chance".
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