Débora Maria quer justiça: "Você não cria filho para ser morto pelo Estado"
Há doze anos, Débora Silva Maria era uma pacata dona de casa na periferia de Santos, litoral de São Paulo, quando o assassinato de seu filho, o gari Edson Rogério Silva dos Santos, de 29 anos, a transformou. Por amor e indignação, ela se juntou a outras mulheres, que também perderam seus filhos para a violência policial, e fundou o movimento Mães de Maio.
Hoje, aos 58 anos, Débora percorre o mundo discursando contra o que ela chama de "terrorismo do Estado brasileiro" e lutando para provar o que ainda não conseguiu: que os assassinos de seu filho sejam julgados e punidos.
"A dor do luto me levou para a luta política. Nunca imaginei encontrar chefes de Estado e viajar para embaixadas e universidades internacionais falando sobre os Crimes de Maio."
A caminhada de Débora
Era 15 de maio de 2006, quando Edson acordou e disse à mãe que iria trabalhar, mesmo com o dente do siso recém-arrancado. Débora temia que o filho saísse para a rua, pois as autoridades haviam alertado a população, dado o clima de violência instaurado por causa da guerra entre a polícia e o PCC. "Ele insistiu, ou perdia o emprego", lembra ela.
Naquele maio, a organização criminosa incendiou ônibus e travou uma batalha com a polícia em São Paulo. Na volta do trabalho, a caminho de casa, Edson foi assassinado com cinco tiros. "Um no coração, um em cada pulmão e o restante pelo tronco".
Débora não tem dúvidas de que os assassinos do filho eram policiais: "Saíram atirando em qualquer pobre, preto, que vissem pelas ruas, em retaliação ao PCC".
Com a morte de Edson, Débora ficou 40 dias em uma cama de hospital. "Até que vi meu filho. Dizem que foi por causa dos remédios, mas vi, juro. Ele disse: 'Levanta e luta, mãe'."
As integrantes são mães, em sua maioria, e familiares das vítimas dos chamados Crimes de Maio, nos quais cerca de 600 jovens morreram em uma semana, em todo o estado de São Paulo.
Atualmente, Débora é coordenadora do grupo e uma mulher com contatos na Anistia Internacional. Fala sobre Ministério Público, Corregedoria e desmilitarização da polícia como se fosse especialista. "Faço parte de um time de mulheres que nunca se cansou de lutar por justiça. Não é sobre termos fé no judiciário brasileiro, temos fé em nós mesmas."
Conheça outras mulheres inspiradoras
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Em dezembro de 2013, no Fórum Mundial de Direitos Humanos, Débora recebeu um prêmio das mãos do então ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, por sua atuação à frente das Mães de Maio. Na ocasião, esteve com Dilma Rousseff e questionou a então presidente sobre por que não agendou um encontro com ela antes. "Era minha chance de cobrar a presidenta por justiça."
As Mães de Maio conseguiram uma indenização por danos morais. O valor, determinado em 2012, é uma pensão vitalícia de metade de um salário mínimo -hoje, o equivalente a R$ 447-, mas que nunca trouxe sossego a Débora.
É um absurdo. Eu quero moralidade, quero que o Estado peça perdão.
Enfim, em julho de 2014, pela primeira vez, um PM foi levado a julgamento, acusado de participar de extermínio de civis durante os Crimes de Maio. Pelos homicídios, praticados sem que as vítimas tivessem chance de defesa, foi sentenciado a 36 anos de prisão, além da perda do cargo público. Contudo, em poucos dias, o julgamento foi anulado.
Quem ela impacta
As Mães de Maio surgiram, inicialmente, contra a impunidade dos policiais envolvidos nas chacinas de 2006, mas, atualmente, influenciam outros movimentos formados por familiares de vítimas da violência policial no país todo.
O próximo feito de Débora é uma parceria entre a Unifesp, a Universidade de Oxford, na Inglaterra e o Fundo Newton para cobrar da Procuradoria-Geral da República a federalização dos Crimes de Maio.
Você não cria um filho para ser morto pelo Estado. Não canto o hino nacional. Berço esplêndido?! Nenhum brasileiro de periferia está deitado em berço esplêndido
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