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Pitty lança doc sobre maternidade e diz: "Não nasci mulher, me tornei"

A cantora Pitty - Mastrangelo Reino/Folhapress
A cantora Pitty Imagem: Mastrangelo Reino/Folhapress

Daniela Carasco

Da Universa, em São Paulo

17/03/2018 10h16

Em agosto de 2016, a cantora Pitty deu à luz sua primeira filha, Madalena, um momento que, de tão transformador, lhe deu repertório para produzir um documentário sobre sua vida. Intitulado “Do Ventre à Volta”, ele retrata o retorno ao trabalho da artista, que passou a carregar mais um predicado, o de mãe.

"Surgiu da minha vontade de dialogar sobre essa coisa das transformações que a maternidade traz. Ela vem carregada de mudança física, emocional, mental”, disse à Universa. Pitty, 40, quer expor com ele as agruras de uma mulher ativa nos dias de hoje. “A maternidade toma realmente muito tempo."

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Sua volta aos palcos aconteceu um ano e meio depois do nascimento de Madalena. No doc, ela expõe suas dúvidas de como conciliar todos os papéis que tem assumido e as novas escolhas que foi obrigada a fazer. “As mulheres se questionam muito nessa época. Volto a trabalhar antes? Volto a trabalhar depois? Posso fazer escolhas? Existem mulheres que nem tiveram que deixar de trabalhar por conta disso. Minha mãe, por exemplo, tinha uma vida bem ativa profissional. Mas aí, quando me teve, precisou parar de trabalhar porque não tinha com quem me deixar.”

Mas seus questionamentos não param por aí. A cabeça de Pitty é um turbilhão. “As escolhas que nossas mães fizeram são as que a gente tem que fazer hoje? Quanto mais a gente precisa batalhar para que as mulheres possam ser mães e profissionais? Que tipo de conscientização a gente tem que levar para as empresas neste sentido?” O documentário chega para falar um pouco sobre isso.

“Me masculinizei no início de carreira para me proteger”

Sem a menor intenção de falar, assim como de tocar, compor e cantar, só para mulheres, ela quer que assuntos como esses cheguem aos homens também. “Eles podem e devem assumir uma posição de escuta e de agentes transformadores de mudança”, diz ela que confessa ter demorado um pouco até assumir para si o rótulo de feminista.

“Sempre me senti muito bem entre homens, por causa do meio do hardcore. À medida que fui descobrindo o feminino, foi muito marcante. Tive que desconstruir frases feitas sobre mulher, como a de que mulher é tudo invejosa”, recorda. “Minha casa caiu mesmo quando tive uma filha. Tudo começou a fazer sentido na relação com a minha mãe, com meu corpo.”

Por isso, faz questão de citar Simone de Beauvoir na hora de descrever sua evolução. “Não nasci mulher, me tornei mulher”, contou ao ser homenageada no Women’s Music Event, evento que destaca o protagonismo feminino na música nesta sexta (16) e sábado (17). “Me masculinizei no início de carreira para me proteger da cena machista. Não usava vestido em saia. Meu maior obstáculo foi subir no palco e ser ouvida, não apenas vista, como um objeto. Sempre tive muito medo de ser vista como um bibelô, fica só na estética. Eu queria ser um agente modificador.”

Por isso, não hesita em se posicionar nas músicas, nos palcos e nas redes. Comunicar é a responsabilidade que assumiu para si enquanto artista. “Mas eu sei que corro riscos de pagar um preço por isso. Quanto mais você se posiciona, claro, mais cobrado, mais atacado você é. Então por isso acho que tem que escolher bem as brigas que quer brigar.”

No dia do assassinato da vereadora Marielle, por exemplo, escreveu no Instagram: “Absurdo. Luta é o feminino no luto”. E, como muitos, recebeu críticas nos comentários. Ela diz ter ficado com “um gosto amargo” diante do ocorrido. “Estamos sofrendo um golpe. Estou numa fase um pouco angustiada e desesperançosa. Espero que tenha gente mais combativa que eu por aí. Me sinto triste e cansada.”

Ela foge, porém, do rótulo de “voz de uma geração”. “Procuro não pensar nisso, não entrar nessa brisa, porque é facinho de deslumbrar.”

Mais que cantora

Na hora de se definir, Pitty faz questão de dizer que além de cantar, compõe. Hoje, no Brasil, mulheres representam apenas 14% do total de compositores. “Quero marcar esse lugar. Temos muito no Brasil essa cultura da intérprete, da musa. Não da produtora, escritora…” Por isso, tem Rita Lee como uma de suas maiores referências. Além de cantora, a “rainha do rock brasileiro” é compositora, multi-instrumentista, atriz e escritora.

Neste momento, aliás, a baiana está em processo de composição das músicas de seu próximo álbum, que ainda não tem previsão de lançamento.

Em meio a uma rotina carregada de funções, recorre à leitura, maratona de séries e corrida como válvulas de escape para relaxar e “desligar o cérebro”. “Não acho que a gente tem que ser super-heroína. Essa coisa de ficar acumulando tanta função é foda. Tem que trabalhar, malhar, cuidar do filho, ir pra rua para ser ativista… Temos que fazer o melhor que podemos com o que temos. Está tudo bem não dar conta de tudo.”