Elas se uniram e conseguiram narrar jogos de videogame
A economista Priscila Meschiatti “Trevah”, 27, está ansiosa. Nas próximas semanas, ela vai estrear na equipe de narração de um campeonato que envolve competidores das Américas do Norte, Central e Sul. Em disputa, a vaga para as finais da Copa América de “Heroes of the Storm”, jogo online com batalhas assistidas por milhares de espectadores ao vivo na internet. A fase eliminatória começou nesta quinta-feira (5).
“Acho que vai ser um momento importante para que mulheres enxerguem que ali também é lugar delas, não um espaço exclusivamente masculino”, defende.
Com resistência no mundo do futebol, mulheres estão se unindo para narrar e comentar no universo competitivo e também masculino dos eSports. Não à toa, a participação (ou a tentativa) delas nas transmissões esportivas virou alvo de debates e controvérsias nos últimos meses.
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Priscila, apaixonada por games desde a infância, migrou do seu RPG favorito, o “Chrono Trigger”, lançado na década de 90, para o Super Nintendo a fim de tomar anotações minuciosas como a “caster” (narradora/comentarista) do estratégico “Heroes of The Storm”, jogo eletrônico que pratica há dois anos.
“Acaba sendo uma polêmica quando a gente quer narrar”, defende. “Com o avanço da internet, cada vez mais nós nos perguntamos: por que eu também não posso fazer isso?”.
Acusações de machismo e controvérsias
Em uma tentativa à primeira vista de diminuir o monopólio masculino em transmissões, em fevereiro a produtora BluemonnKN buscou narradoras de futebol nas redes. O processo, porém, foi acusado de sexismo.
Além do portfólio, o comunicado também pedia fotos do corpo e do rosto às candidatas. A produtora lamentou o ocorrido, afirmando que o pedido tinha a intenção de ter uma “diversidade de candidatos”. A Fox Sports, suposta dona da vaga, negou envolvimento.
No ano passado, a jornalista norte-americana Beth Mowins se tornou a primeira mulher na história a narrar um jogo da NFL (a liga profissional de futebol americano) na TV. Críticas machistas, relacionadas à voz de Beth, ecoaram nas redes sociais.
Em jogos online, o cenário não é tão diferente. “Ainda há um certo machismo e uma resistência a ceder a uma pessoa”, explica o coach Giovanni Fernandes, que tem treinado mulheres para a transmissão de games. “Os homens têm a parte de se sensibilizar com elas, de não subjugá-las. Mas elas são as principais peças para tomar esses espaços”.
Giovanni cita a criação em 2008 da liga feminina de Counter Strike, game online de tiro em primeira pessoa popular no Brasil. O espaço se tornou um ambiente mais confortável para elas, que organizam a liga de maneira autônoma em torneios mensais. Narram, jogam, se divertem.
Elas mudaram o jogo
“Ainda assim, existem muitas minas que não usam nick ‘feminino’, que não falam ao microfone e já li relatos de muitas que deixaram de jogar para sempre por causa do preconceito e ódio gratuito”, relata Renata Bagnato “Reeh”, que treina para ser uma ‘caster’ de Counter Strike.
Mesmo ainda em minoria no cenário profissional e no protagonismo das narrações, a esforço das jogadoras pressionou as empresas do setor a criar políticas de inclusão e a penalizar comportamentos machistas na rede.
A Blizzard, mantenedora de games como StarCraft, World of Warcraft e Heroes of the Storm, lançou um concurso nos primeiros meses deste ano para escolher novos narradores e comentaristas sem distinção de gênero para a Copa América. Em nota, a companhia afirma que busca as mesmas oportunidades para todos e que mantém uma equipe brasileira para analisar denúncias em “casos de toxicidade” na rede. A Copa já conta com a comentarista Nayara Sylvestre.
“A partir do momento que você é uma mulher, você tem que lutar”, reflete.“Acho que já chega de ficarmos caladas”.
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