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Mãe de youtuber: elas fizeram da carreira virtual dos filhos uma profissão

Ivana Coelho e Maria Fernanda Coelho - Carine Wallauer/Universa
Ivana Coelho e Maria Fernanda Coelho Imagem: Carine Wallauer/Universa

Marcela Paes

Da Universa

24/04/2018 04h00

Quem vê a youtuber Ivana Coelho mostrando suas receitas para os quase 200 mil inscritos de seu canal provavelmente não imagina o grau de envolvimento que a mãe da garota, a colombiana Maria Fernanda Coelho, tem em cada vídeo da filha. Também pode ser difícil ter a real ideia da função quase profissional que ela exerce na administração da agenda da menina. Mas uma coisa é clara: ser mãe de youtuber além de "dar trabalho", é um trabalho.

"Ela tem só 11 anos. Não dá para deixar sozinha em nenhum momento. Estou sempre perto e ela tem muitos compromissos. Minha vida mudou muito", ri Maria Fernanda. Ela costumava dividir o tempo entre Ivana e a outra filha, uma cantora de ópera que vive no exterior -- o restante da família vive na Colômbia. Hoje, dedica 99% do tempo à agenda de Ivana. "Eu estou viajando muito menos para acompanhá-la. Minha filha que mora nos Estados Unidos também é mais velha e pode ficar mais sozinha', conta.

A empreitada de Ivana na plataforma de vídeos começou quando ela se mudou dos Estados Unidos para o Brasil com a família. Segundo a mãe, a filha queria comer os quitutes que estava acostumada no exterior. Como a mãe não sabia onde encontrá-los, a própria Ivana começou, aos 5 anos, a acessar canais de receitas americanos. "Foi tudo iniciativa dela. Eu mal sabia o que era YouTube na época", conta.

Apesar do precoce envolvimento nesse mundo, a ideia do canal veio depois da participação de Ivana no MasterChef Júnior (Band). "A Ivana quis continuar mostrando as receitas e aí surgiu a ideia do canal. A partir daí, comecei a pesquisar e querer entender".

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Segundo Maria Fernanda, a filha cria as coisas e ela viabiliza "o que é possível, dentro das ideias mirabolantes". "Eu explico que o conteúdo tem que ter qualidade, ter responsabilidade com as crianças que estão assistindo e não tiveram as mesmas oportunidades que ela teve. Tem que ser algo informativo e que ajude os outros."

O que não passa pelo crivo de Maria Fernanda? "Não quero que ela simplesmente fique mostrando a vida dela. Ela nadando numa piscina, por exemplo, como já vi outras crianças que têm canais e fazem. O que isso acrescenta ou ensina? A Ivana ouve o tempo todo: não é a fama pela fama. Tem muito trabalho envolvido e ela perde atividades da infância por isso. Estou sempre perguntando se ela quer continuar mesmo. Então tem que valer a pena", diz ela, que também condiciona a continuidade do canal da filha às boas notas na escola. "Se não for bem, o canal acaba na hora", explica.

Tal filha, tal mãe

Marisa Santina - Simon Plestenjak/UOL - Simon Plestenjak/UOL
Marisa Santina, mãe da Niina Secrets
Imagem: Simon Plestenjak/UOL

Foi o sucesso da filha, a youtuber Niina Secrets, o empurrão que faltava para que Marisa Santina descobrisse sua veia artística. Ela fechou a confecção de roupas que tinha há 40 anos para investir em seu próprio canal. Diferentemente de Niina, que foca o conteúdo em maquiagens, Marisa aborda vários assuntos: seu relacionamento de mais de 40 anos, educação dos filhos e até investimentos.

"A empresa foi diminuindo e, no fim, vi que era mais rentável ser youtuber. Também tive um câncer de mama, queria aproveitar mais a vida e não me preocupar com todos os problemas que a confecção trazia"

Mesmo depois da criação de seu canal, Marisa não deixou de administrar a carreira de Niina, hoje com 23 anos. Ela é empresária da filha e viu grande parte da família encarar a produção de conteúdo para o canal como uma profissão. Os outros filhos, Fabi e Bruno, a cunhada Betta, e os sobrinhos Carol, Rick e Sophia, também criaram seus canais. 

"Nos almoços de famíliam sempre demoramos para começar a comer. Todo mundo tem que tirar foto do prato e às vezes da sobremesa dos outros para postar em suas redes", brinca Marisa.

A mãe ainda é "pequena" perto da filha. Marisa tem cerca de 200 mil seguidores enquanto Niina chegou a mais de 3 milhões. "Claro que aprendi e aprendo muito com ela. Mas acho que a Niina não vê muito os meus vídeos. Primeiro porque ela não tem tempo. E também fica com vergonha dos que têm assuntos mais polêmicos", ri.

"Você tem que comer!"

 MrPoladoful e  Adriana Dantas - Arquivo pessoal - Arquivo pessoal
O youtuber MrPoladoful e a mãe, Adriana Dantas
Imagem: Arquivo pessoal

Uma das principais preocupações da nutricionista Adriana Dantas era com a alimentação do filho Gabriel, ou MrPoladoful, como é conhecido por seus mais de 4,5 milhões de inscritos no YouTube. "Ele passava muito tempo dentro do quarto e eu me preocupava com a nutrição dele. Não saía da frente do computador nem para ir ao banheiro. Eu só repetia 'você tem que comer!'", diz.

Gabriel começou a postar vídeos nas redes aos 16 anos , mas não mostrava o rosto. Só revelou a identidade depois de ganhar um concurso para estudar em Londres. "Nós, como pais, temos que cuidar e estar em cima. Eu queria que ele continuasse na faculdade. A situação é difícil para quem estuda, imagina sem isso. Mas depois que ele passou nesse concurso muito concorrido, fiquei aliviada", diz. O garoto largou o curso de engenharia civil e hoje se dedica inteiramente ao vídeos de humor com toque nonsense.

Assim como para as outras mães de youtubers, o começo da carreira do filho foi visto com estranheza. A alagoana não tinha familiaridade com a plataforma e se preocupava com o alcance de estranhos ao filho. "Muitas pessoas desconhecidas começaram a querer entrar em contato e até agenciá-lo sem falar com a gente [os pais] antes. Eu me preocupava demais!".

O que a deixava e a deixa mais tranquila é o senso de responsabilidade de Gabriel, hoje com 21 anos. Segundo ela, o garoto costuma guardar o que ganha e o único bem que comprou sem consultar os pais foi uma moto. "Ele comprou e depois vendeu. Eu achava perigoso, que bom que vendeu!", afirma.

O que diz a legislação sobre o trabalho de crianças e adolescentes no YouTube

Segundo Pedro Hartung, do Instituto Alana, o trabalho de crianças e adolescentes no YouTube é considerada trabalho artístico infantil, que é permitido no Brasil, mas é necessária uma autorização judicial com base em pareceres para a permissão do trabalho infantil artístico de crianças.

"É avaliado se o trabalho não atrapalha a rotina de estudos, se traz benefícios e não coloca a criança em situação vexatória", diz.

A participação do YouTube nesse trabalho também é questionada. "Isso é discutido por diversas entidades nos Estados Unidos, porque o YouTube muitas vezes veicula publicidade no canal dessas crianças. No Brasil, a questão ainda está em aberto, porque os próprios termos impossibilitam o uso da plataforma por menores de 18 anos."