"Me confundem com avó", conta mãe que teve gêmeos com 61 anos
Quando recebeu o diagnóstico de endometriose em 1988, aos 36 anos, Antônia Letícia Rovati Asti não imaginou que ficaria quase 25 anos tentando engravidar. Para realizar o sonho de ser mãe, ela fez cinco inseminações artificiais, entrou em dois processos de adoção, -- em um deles ouviu que tinha cara de avó e não de mãe-- e fez uma fertilização in vitro. Aos 61 anos de idade, ela teve Sofia e Roberto. Nesse depoimento, a aposentada, 66, conta como cuida dos gêmeos e o preconceito que sofre por ser ‘mãe velha’.
“Eu e o meu marido, o José Cezar, nos casamos quando eu tinha 35 anos e ele 29. Um ano depois, tentei engravidar. Passados alguns meses, procurei o meu o ginecologista e obstetra, o dr. Orlando de Castro Neto, fiz alguns exames e fui diagnosticada com endometriose. O médico me explicou que eu teria dificuldades para engravidar.
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Eu fiz o tratamento e continuei tentando pelo método convencional, mas não tive sucesso. Conversei com o meu marido e resolvemos tentar a inseminação artificial. Fiz o primeiro procedimento aos 40 anos. Fechei um pacote, por R$ 15 mil, que me dava direito a três tentativas.
Eu trabalhava como auxiliar de faturamento, era pobre e assalariada. Guardava o meu salário para realizar o sonho de ser mãe. Eu fazia a inseminação, não dava certo, acabava o dinheiro, eu juntava tudo de novo e tentava o procedimento outra vez. Fiz cinco inseminações ao longo de quase duas décadas. Eu ficava chateada de não conseguir, mas sempre fui muito otimista, sabia que minha hora ia chegar.
Psicóloga disse que eu não podia adotar bebê porque tinha cara de avó e não de mãe
Em meio a esse processo, entrei numa lista de espera para adoção. Aguardei seis anos e nada. Em 2009, aos 58 anos, entrei numa nova lista. A psicóloga do fórum me chamou para uma entrevista. Eu contei a ela o meu desejo de ter filhos, para mim não importava se seria biológico ou adotado. Ela me disse que eu não poderia adotar um bebê porque eu tinha cara de avó e não de mãe, mas que se eu quisesse adotar uma criança maior, tudo bem. Meu mundo desmoronou. Saí de lá aos prantos. Me senti humilhada.
Com as chances de adoção praticamente enterradas, falei para o meu marido que queria fazer a fertilização in vitro. Ele me aconselhou a desistir, disse que já havíamos tido muitas frustrações. Eu falei que continuaria lutando, tinha a intuição de que ia conseguir.
Conversei com o dr. Orlando para avaliar as minhas condições. Ele me explicou que muitas vezes o que conta numa gestação não é tanto a idade, mas o estado clínico da paciente. Fiz uma bateria de exames e foi constatado que minha saúde estava boa. Fiz a reposição hormonal e me preparei por quase um ano.
Sofri discriminação por ter engravidado aos 60 anos
Peguei minhas economias e paguei R$ 30 mil no pacote de fertilização, que incluía três tentativas. O médico implantou três embriões no meu útero. A primeira tentativa não deu certo. Na segunda, eu sentia algo diferente dentro de mim. Fiz o exame de sangue e lá estava o resultado pelo qual esperei por quase 25 anos: eu estava grávida. Fiquei atordoada. Eu gritava de alegria no meio da rua ao contar a novidade para o meu marido pelo celular. Ficamos felizes, ele também queria ser pai.
Sofri discriminação por ter engravidado aos 60 anos. As pessoas olhavam minha barriga e cochichavam. O começo da gestação foi bom, mas a partir do sexto mês, tive problemas de pressão alta e retenção de líquido. Fiquei bastante inchada. Ao longo dos meses, meu peso foi de 52 kg para 90 kg.
Tive a Sofia e o Roberto aos 61 anos de idade. Eles nasceram prematuros no dia 23 de outubro de 2012. No início, eu fiquei apavorada e minha irmã me ajudou. Depois passei a cuidar deles sozinha. Me aposentei para me dedicar aos dois.
Estou com 66 anos e até hoje minha idade nunca me limitou no cuidado com os gêmeos. Não sei como vai ser daqui para frente. Tenho bastante disposição. Faço tudo que uma mulher nova faz.
De manhã, eu preparo o café, dou banho e brinco com eles. Depois do almoço, levo eles de ônibus para a escola. À tarde, faço as tarefas domésticas. À noite ajudo na lição de casa, assistimos TV e jantamos. Sinto o cansaço natural de qualquer mulher que tem duas crianças para criar. Meu marido também ajuda, mas passa a maior parte do tempo trabalhando.
Tiro o preconceito de letra e quero viver até os 90 anos e ver meus filhos na faculdade
Frequentemente somos vítimas de preconceito, mas nossos filhos, que hoje estão com cinco anos, nos defendem. Um dia eu estava no ônibus chamando a atenção da Sofia e um senhor falou que era para ela obedecer a vovó, referindo-se a mim. Ela respondeu: ‘ela não é minha avó, é minha mãe, eu saí da barriga dela’. Falo para as crianças não ligarem, digo que fui mãe velha. Tiro o preconceito de letra. A vantagem de ser mãe em idade avançada é que tenho mais sabedoria, maturidade e paciência.
A maioria das pessoas acha que os idosos não servem para mais nada, muito menos para ser mãe e pai. Já recebi críticas de que fui egoísta, que só pensei em mim, que eu e meu marido podemos morrer e as crianças vão ficar abandonadas. Eu não concordo. Uma mãe mais jovem pode morrer antes de mim que sou velha. Minha mãe é um exemplo disso. Ela morreu aos 31 anos quando eu tinha cinco anos de idade. Só Deus pode determinar o tempo de vida de uma pessoa. Eu acho que vou viver até os 90 anos e tenho a intuição que vou ver meus filhos na faculdade e trabalhando”.
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