Suicídio de um filho: pais contam como viveram o luto e seguiram em frente
O julgamento das pessoas próximas, a imensa saudade, a ausência. Perder um filho em uma situação tão delicada como o suicídio deixa marcas profundas. Os entrevistados a seguir são unânimes em afirmar isso, mas conseguiram seguir em frente. Eles trabalham para alertar outros pais e para apoiar quem enfrenta a mesma dor. Leia as histórias:
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“Meu filho pediu ajuda e eu não entendi”
“Meu filho tinha 22 anos quando se enforcou na maçaneta da porta do quarto dele, com uns fios. Ele me ligou para falar que me amava e logo depois se matou. Hoje, eu entendo que meu filho falava que tinha uma vida boa, mas tinha vergonha de dizer o que estava sentindo de verdade. Ele deixou cartas contando que se achava feio, chato. No primeiro momento, eu me culpei por não ter percebido que meu filho estava assim, por não ter dado atenção. Mas, com o passar do tempo, a saudade é maior que tudo. Busquei ajuda psicológica e, depois, de grupos de apoio. Como eu não tenho nenhum traço de depressão, para mim era difícil entender a doença. Tanto que eu não tinha ideia do que ele sentia. Meu filho pediu ajuda e eu não entendi, não sabia que aquilo era depressão. Ele ficava em casa e eu achava que ele era acomodado. O Brunno era meu único filho, então, a minha função aqui, desde que ele se foi, é tentar ajudar as pessoas que estão passando por isso, falando sobre o assunto e a minha experiência. Penso até em fazer psicologia daqui a um ano ou dois.” Ana Paula Narcizo Pagliusi, 49 anos, empresária
“Minha filha tinha 13 anos quando se suicidou e sofremos muito com o julgamento dos outros”
“A Bia era uma adolescente extrovertida, cheia de amigos, tinha um riso contagiante. Por isso, fiquei muito impactada quando eu a encontrei; Ela tomou um tipo de pesticida. Eu realmente não conseguia entender o que tinha acontecido. Além disso, ficava pensando como nossa família conseguiria sobreviver, porque estava faltando um pedaço de nós. Estávamos ainda nesse estado de sofrimento intenso e as pessoas já faziam questionamentos, já construíam histórias sobre a morte da minha filha. Culpavam a gente por não ter percebido, culpavam a Bia por não ter amor à vida, por não temer a Deus. Logo no início do nosso luto sentimos a questão do estigma e do preconceito que enfrentaríamos. Então, buscamos participar de palestras e eventos que abordassem o suicídio, fizemos algumas sessões de terapia e tentamos entender a questão da morte por meio de leituras. Depois, decidimos iniciar o Grupo de Apoio às Famílias Sobreviventes do Instituto Bia Dote, do qual sou presidente e gestora. Além disso, estou me graduando em psicologia e faço palestras sobre prevenção do suicídio e promoção à vida.” Maria Lucinaura Diogenes Olimpio, 57 anos, geóloga e psicóloga em formação
“Acordava no meio da noite e, quando percebia que não tinha sido um pesadelo, gritava sem parar”
“No dia em que minha filha se enforcou, aos 18 anos, nós havíamos almoçado juntos, conversamos sobre como seria o fim de semana, ela falou sobre os planos de tirar carta de motorista e fazer concurso público. Deixei-a na casa da mãe e, quando fui buscá-la, algumas horas mais tarde, ela já estava morta. Deixou um bilhete dizendo que não era culpa de ninguém e que não aguentava mais. Terminou dizendo que gente morta não decepciona ninguém. Mas não sei dizer porque ela poderia decepcionar a gente. Até hoje, não consigo chorar de dor. No começo, eu acordava de madrugada e percebia que não era um pesadelo, era real, e gritava sem parar. Desde então, eu tenho procurado fazer alguma coisa para que a morte da minha filha não tenha sido em vão. Participo de grupos de apoio e falo sobre o assunto sempre que possível. Quero ajudar não só as pessoas enlutadas, mas aquelas que poderiam estar se suicidando e vão deixar de se suicidar, por conta da compreensão de que o suicídio não é uma solução para situações temporárias, porque não há mal que sempre dure.” Ivo Oliveira Farias, 60 anos, oficial de justiça federal aposentado
“Depois que minha filha se suicidou, muitas pessoas se afastaram, por não saberem lidar com a nossa dor”
“Ela tinha 19 anos quando se matou. Estava tratando a depressão e, aparentemente, reagindo bem. Mas a depressão tem várias facetas e, no começo, confundi com coisas de adolescente. Cheguei a levar minha filha ao ginecologista, achando que o mau humor era TPM. Quando percebi que ela precisava de ajuda e veio o diagnóstico, foi como um câncer descoberto tardiamente, que havia corroído toda a vontade dela de viver. Quando eu a encontrei, ela tinha tomado vários remédios de uma vez só. Fiquei completamente perdida, me culpando por não ter ficado ao lado dela o tempo todo. Antes de completar um mês que ela havia partido, procurei grupos de apoio a familiares de suicidas e lá obtive muitas respostas e vi que não estava sozinha. Não creio que haja superação para uma situação dessas, mas uma coisa que me ajuda é escrever sobre o luto, no site www.nomoblidis.com.br. Também coordeno um grupo de apoio com o mesmo nome. Uma coisa que percebi é que muitas pessoas próximas se afastam, isso é comum nos casos de suicídio, porque muitos não sabem lidar com a nossa dor.” Terezinha do Carmo Guedes Maximo, 45 anos, corretora de seguros
“É uma luta diária continuar vivendo sem meu filho”
“Fui eu quem encontrei meu filho, de 25 anos, enforcado na grade da janela do quarto dele. Foi chocante, doloroso e, se procurar palavras para descrever a sensação daquele momento, eu realmente não as encontro. É uma ferida que não cicatriza e mesmo com acompanhamento psicológico e participando de grupos de apoio, ainda não posso dizer que superei. Mas fui, aos poucos, lidando melhor com esse episódio. Meu marido acabou se perdendo e entrando numa depressão profunda. E se encontra até hoje doente, em um quadro bastante difícil. Para mim, é uma luta diária continuar vivendo, mas eu sinto que tenho uma tremenda força, refiz a minha vida e toco em frente. A forma que encontrei de superar foi trabalhando muito, me ocupo para não ficar pensando no que aconteceu e, inclusive, procuro ajudar o próximo, pois isso me faz bem. Se meu filho continuasse por aqui, eu agiria um pouco diferente na forma de ver as coisas, trataria ele com mais amor, carinho e atenção.” Alice Rodrigues Damasceno, 63 anos, restauradora
Agradecimento: Karen Scavacini, psicóloga e fundadora do Instituto Vita Alere
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