"Sou o 1º trans a participar de um campeonato de fisiculturismo no Brasil"
“Sempre fui homem”, diz Juliano Ferreira, de 32 anos, o primeiro homem transexual a participar de um campeonato de fisiculturismo no Brasil. O concurso, que aconteceu no sábado (30), reuniu participantes de categorias diferentes —Juliano ficou em 5º lugar entre os homens mais fortes do Brasil. À Universa, o esportista garantiu que está ansioso, mas que chatas mesmo são as bolhas no pé, por causa das longas caminhadas. “Faço, no mínimo, três exercícios aeróbicos por dia. Meus pés não aguentam mais”, conta. Leia o depoimento de Juliano.
“O esporte sempre esteve presente na minha vida. Quando eu era criança, participava de todas as competições da escola, jogava isso e aquilo, gostava muito de me exercitar. Aos 15 anos, descobri a musculação –foi na mesma época em que revelei aos meus pais que era lésbica. Eles me apoiaram muito.
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Eu já sabia que tinha alguma coisa errada com meu corpo desde a infância –e não era porque eu gostava de jogar bola ou jogar peão. Não faz sentido associar brincadeiras de criança à sexualidade. Eu não sabia o que era, mas aquela menina não era eu. Eu sempre fui homem. Sabia que eu sentia algo especial pela garota com quem eu brincava, mas descobrir que gostava de mulheres não tirou de mim aquela angústia gigante. Eu dizia para os meus pais: eu não sou lésbica, eu sou homem.
Quando a internet surgiu e as informações começaram a chegar com mais facilidade, entendi o que era a transexualidade e, finalmente, tirei um grande peso das costas. Na hora de falar com a família, juntei diversos artigos, chamei minha mãe e meu pai na sala e disse, sem delongas: prazer, sou o Juliano. Mostrei todos os artigos. Meus pais ficaram quietos, não disseram nada. Daí para frente, sempre que eles viam alguma reportagem sobre transexualidade, me mostravam. Se eu não estivesse em casa, mandavam mensagem me avisando.
Comecei a fazer o tratamento hormonal e reagi muito bem. Eu não tinha pressa, sabia que era um processo demorado. Mas, só de saber que eu estava no caminho, ficava feliz. Fiz só uma cirurgia, para retirar a glândula mamária. Eu nunca tive seios grandes, então não precisei mexer no tamanho. A recuperação demorou um mês, precisei ficar de repouso durante esse período —não podia levantar os braços, pegar peso nem fazer esforço. Passados os 30 dias, já comecei a me preparar para competir.
Peguei firme na musculação e achei que o fisiculturismo era o esporte ideal para mim. Comecei a treinar e entrei em uma federação só para transexuais. Estava animado, mas não via muitos resultados, não sentia empenho e comprometimento por parte da organização. Foi quando conversei com um amigo que conhecia pessoas da IFBB (Confederação Internacional de Fisiculturismo) e pedi que ele checasse se eu poderia fazer parte da equipe, mesmo sendo trans.
A resposta foi positiva, e eu senti algo incrível, uma sensação de pertencimento, de que eu finalmente realizaria meu sonho. Hoje, sou federado e adoro treinar com eles. Desde que cheguei, impus respeito para que eu pudesse receber o mesmo das pessoas.
Passei dois meses fazendo dietas rigorosas e treinando todos os dias, mais de três vezes por dia, para o último campeonato. Meus pés ainda estão cheios de bolhas. Foi uma oportunidade gigante e eu quero que mais atletas trans possam realizar sonhos como o meu.
Você também tem uma história para contar? Ela pode aparecer aqui na Universa. Mande seu depoimento, nome e telefone para minhahistoria@bol.com.br. Sua identidade só será revelada se você quiser.
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