"Tive que ouvir do delegado: 'A camisinha pode ter caído na sua bolsa'"
Ao registrar um boletim de ocorrência na delegacia, depois de encontrar uma camisinha usada, colocada dentro de sua bolsa, a jornalista Clara Novais, 27 anos, se deparou com um questionamento inesperado: “O delegado que me atendeu disse que o preservativo, com o líquido dentro, poderia ter caído sem querer na minha bolsa”, diz.
O fato ocorreu na terça-feira (2), quando Clara estava indo para o trabalho, nas imediações da CPTM, companhia de transporte público de São Paulo. No mesmo dia, à noite, ela registrou a ocorrência na 6ª Delpom (Delegacia de Polícia do Metropolitano).
Clara afirma que pediu para registrar a ocorrência como importunação sexual, mas a atendente da delegacia assegurou que só seria enquadrado como o crime caso alguém tivesse encostado nela. “Insisti, pois me informei e soube que não há necessidade de que o agressor tenha me tocado para ser considerado importunação sexual, mas o delegado refutou e perguntou se eu era jurista. O B.O. acabou sendo registrado como ‘outros - não criminal’”, lembra a jornalista.
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Foi importunação sexual?
Para a advogada Marina Ganzarolli, da Rede Feminista de Juristas, o caso, “com certeza”, pode ser enquadrado na lei da importunação sexual, sancionada na segunda-feira (24). “O texto que tipifica esse crime fala em ato libidinoso sem anuência [consentimento] da pessoa. Colocar camisinha na bolsa de alguém é ato libidinoso, o preservativo não é qualquer objeto.”
Segundo Marina, a ocorrência poderia ter recebido uma tipificação específica, mesmo que não fosse a de importunação sexual. “Há, no mínimo, uma contravenção penal, que tem penas mais brandas que o crime. Citaria constrangimento e importunação ofensiva ao pudor com cunho libidinoso.”
A jurista aponta, ainda, que apesar de celebrar a sanção da nova lei, o problema, no Brasil, não é a ausência de tipos penais mas, sim, o machismo nas delegacias e no judiciário. “Se não criarem uma capacitação para autoridades, agentes de segurança e operadores do direito, pode criar quantas leis forem, essas leis vão continuar não sendo respeitadas.”
Outro lado
O delegado responsável pelo caso, Marcelo Monteiro, não foi encontrado até a publicação deste texto. Ele foi o responsável pelo registro do boletim de ocorrência na 6ª Delpom (Delegacia de Polícia do Metropolitano) e, segundo informado à Universa, só voltaria a atuar na delegacia na sexta-feira (5), quando poderia falar sobre o caso.
A Secretaria de Segurança Pública afirmou, em nota, que "o caso está sendo investigado pela Delegacia do Metropolitano, que busca por imagens que possam identificar o responsável". Alega, ainda, que o caso foi registrado como "outros-não criminal" porque "não se trata de uma situação de flagrante ou que tenha suspeito identificado" e "por não haver indícios mínimos de autoria". Além disso, afirma que o Decade (Delegacia de Capturas e Delegacia Especiais) apura o atendimento à vítima realizado na delegacia.
A CPTM afirmou, em nota, que tomou conhecimento da ocorrência por meio do registro da usuária nas redes sociais e no SAU (Serviço de Atendimento ao Usuário). "A empresa irá checar as câmeras de segurança e colaborará com as autoridades policiais, caso haja investigação", diz. A companhia alega também que "conta com agentes de segurança em todas as estações, principalmente nas plataformas, equipados com colete verde limão e faixas refletivas, permitindo sua identificação, ainda que em meio à multidão".
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