Sobreviventes de suicídio contam como venceram a vontade de se matar
“Na adolescência, já me cortava, pois era uma forma de atenuar a dor emocional”, conta a escritora Georgiana Calimeris, 45 anos. Mas foi só aos 28 anos que decidiu pedir ajuda. No psiquiatra, descobriu que tinha depressão e espectro bipolar. Para piorar, na época, vivia uma crise no casamento.
“Estava com 30 anos, parando com as medicações, quando flagrei uma pessoa próxima dizendo ao meu marido que ele teria que cuidar de mim para o resto da vida, porque eu era uma inútil. Na mesma hora, voltei para o quarto e tentei me matar com comprimidos. Eu estava me sentindo realmente uma inútil, achando que era melhor morrer”, conta. Os familiares deram pela falta dela, bateram na porta do quarto e, como ela não abria, arrombaram o cômodo e a socorreram.
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A escritora recorda que, durante a consulta, a médica que a atendeu perguntou porque ela não havia dado um tiro na cabeça, em vez de tomar os remédios: “Não existe sensibilidade nenhuma com o problema”. Depois de um dia internada, Georgiana voltou para casa, mas a família não tocou mais no assunto. Ainda hoje, ela convive com a doença, mas o quadro é estável. “Tenho altos e baixos, continuo medicada e escrever sempre foi o meu escape”, diz.
Cinco tentativas em seis anos
Em 2010, Oseias Leite, 41 anos, viu sua loja entrar em processo de falência e isso o desestabilizou completamente. Em meio a uma crise de estresse, sua mulhera decidiu levá-lo ao pronto-socorro. “Ali mesmo já tive uma vontade imensa de acabar com a minha vida. Tentei me matar, mas as enfermeiras chegaram em tempo de me socorrer”, diz. Ele conta que, nesse período, passava horas procurando informações sobre suicídio: “A minha vida era uma angústia constante, pensava nisso o dia inteiro”.
Depois dessa, vieram outras. No total, foram cinco tentativas de suicídio em seis anos –entre 2010 e 2016. A mulher o socorreu em todas essas ocasiões. “Eu já era conhecido do pessoal do resgate”, lembra.
Na última tentativa, ele teve de ficar hospitalizado. “Tentei subornar um enfermeiro para que me ajudasse a me matar. Mas ele não aceitou e, em vez disso, pediu para fazer uma oração comigo”, conta. Leite diz que, depois disso, decidiu se tratar: “Busquei um grupo de apoio e ali me senti amparado. A psiquiatra que me atendeu concorda que a oração feita pelo enfermeiro foi o acolhimento de que eu precisava e serviu de estímulo para que eu encarasse o problema”.
Ele foi diagnosticado com depressão e fez tratamento durante um ano. E nunca mais tentou o suicídio. “Atualmente, não tenho mais medo de ter uma recaída porque não sinto mais aquela angústia terrível que eu sentia”, afirma.
De vítima a voluntária
A jornalista Rafaela Lima Zebrak, 33 anos, estava com 19 quando achou que precisava de ajuda, porque vivia triste e sem motivação para as atividades da rotina. Do psicólogo, passou para o psiquiatra e começou a tomar medicamentos contínuos. Com 21 anos, tentou o suicídio pela primeira vez.
Ela foi socorrida pela irmã, mas ficou com sequelas: dificuldade para andar e falar. Mas, aos poucos, se recuperou. Simultaneamente, reiniciou o tratamento com o psiquiatra, porém, era só melhorar e ela parava. Nesses altos e baixos, tentou o suicídio mais duas vezes, aos 26 e aos 31 anos. “A última vez foi há dois anos, mas sei que tenho uma doença crônica”, diz.
Hoje, Rafaela dedica-se a um projeto de apoio para pessoas em sofrimento emocional, o Grupo Continue, que conta com cerca de 30 voluntários, entre familiares e portadores de algum tipo de transtorno mental. “Amparamos, acolhemos e levamos informação sobre saúde mental. Compartilhamos nossas histórias e ajudamos uns aos outros”, finaliza.
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