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"Não quero levar essa gravidez adiante": mães falam da tristeza na gestação

Mulheres falam da tristeza que sentiram durante a gravidez - Getty Images/iStockphoto
Mulheres falam da tristeza que sentiram durante a gravidez Imagem: Getty Images/iStockphoto

Luiza Souto

Da Universa

17/12/2018 04h00

A dona de casa Tatiana*, de 26 anos, descobriu-se grávida do terceiro filho há duas semanas e diz que, desde então, seu mundo caiu: ela não deseja a criança. Já a costureira Cibele*, de 29, disse que sentiu-se "podre" na gravidez inteira. Além do turbilhão de sentimentos, as duas ainda têm que lidar com frases bem comuns ditas por quem nem as conhece -- e muitas vezes desnecessárias -- como "a gravidez é saúde, e você deve estar feliz e agradecer". Mas os especialistas alertam: maternidade não é um mar de rosas. Portanto, ofereça ajuda. Mas evite dar palpites ou julgamentos, a não ser que lhe peçam. A pedido das entrevistadas, seus nomes foram trocados. Veja seus relatos.

"Estou me sentindo um lixo"

Desde a confirmação da gravidez, no fim de novembro, Tatiana diz não sentir vontade nem de comer ou levantar da cama. Ela é mãe de um menino e de uma menina, de outros relacionamentos, e seu marido também tem dois filhos, de outros namoros. 

"Meu marido cuida dos meus filhos como se fossem dele, e comemorou a notícia da minha gravidez, mas estou me sentindo um lixo. Não tenho pretensão de encher minha casa de criança. Estava tomando pílula. Não quero levar essa gravidez adiante, mas também não tenho coragem de tirar", desabafa ela, que já sofreu agressão do pai de seu segundo filho, com quem teve um relacionamento rápido. Também não desejou a criança, mas diz que agora a rejeição ao bebê que está para chegar é ainda maior.
 
"Eu não quero me sentir mais assim, feia e acabada. Gravidez não é doença, mas minha cabeça está doente. Acho que, se o filho é indesejado, eu tenho todo direito de não ter essa criança, e meu marido diz que me apoia independentemente da minha decisão. Não vale a pena sofrer tanto assim", decreta Tatiana.

"Estar grávida é horrível"

Cibele teve sentimentos semelhantes durante a gestação da terceira filha, hoje com 1 ano. Antes de engravidar, ela enfrentou um câncer no colo do útero e os próprios médicos disseram que não teria mais filhos. Mas aconteceu, e o pai da criança a abandonou assim que soube da notícia. Ele sugeriu o aborto

"Eu sentia nojo de mim, pavor só da criança se mexer. Estar grávida é horrível. Sem falar nas críticas que recebi, por estar grávida novamente. Chegaram a me chamar de prostituta. Pensei em deixar a criança no hospital, porque sou a favor do aborto só em caso de estupro. Mas o homem aborta no momento em que nega a criança. O meu remédio foi ver o sorriso dela e hoje é o xodó da casa".

Sociedade vende maternidade perfeita

É normal as mulheres se sentirem tristes com a gravidez, ainda que tenham planejado. Elas ficam sensíveis neste período e há mudanças físicas e psicológicas, além da cobrança pela família perfeita. Elas se vêem sozinhas e não gostam de se olhar, conforme lista a psicóloga e psicanalista Maiana Rappaport, consultora do sono de bebês e crianças, coordenadora dos grupos de pós-parto na Casa Moara, em São Paulo.

"A sociedade vende a imagem de uma maternidade perfeita, onde tudo é uma maravilha, então a grávida acaba se culpando por não estar feliz. O que se pode fazer para amenizar o que ela está passando é dar espaço para falar o que sente, sem julgamento ou moral. Como profissional e sociedade, não podemos convencer alguém a tomar ou não uma decisão em cima de uma questão tão importante da vida dela. O pensamento é democrático", ensina a especialista.

É preciso salientar que a tristeza perdura após o parto, em alguns casos. A paixão pela criança, às vezes, não acontece no primeiro olhar: se constrói com o tempo. E tudo bem. É o que explica a pediatra Vilneide Maria Braga Serva, membro do Departamento Científico de Aleitamento Materno da SBP (Sociedade Brasileira de Pediatria).

"Às vezes, a criança não vem como a gente idealiza, e a mãe se culpa por não ter aquele amor instantâneo que as novelas, cinema e literatura descrevem. Então, a mulher precisa de maternagem, que significa ser apoiada por alguém que represente o amor de uma mãe. Importante ainda manter contato constante com o bebê. E de espaço, até para chorar, porque é direito dela".