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Como (não) presentear uma menina

Presentes são culturais, mas podem representar muito mais que uma lembrança - Hysteria
Presentes são culturais, mas podem representar muito mais que uma lembrança Imagem: Hysteria

Da Hysteria

23/12/2018 04h00

O brinquedo que você dá hoje forma a mulher empoderada – ou não – de amanhã

Já fui a tia que deu maquiagem de presente à sobrinha de 5 anos num Natal. E é claro que ela amou. Crianças sonham em pintar o rosto, mas hoje me pergunto: será que precisava?

Só depois de me tornar mãe entendo o quanto o brincar interfere no repertório infantil e dali nas construções pessoais quando a criança cresce.

Hoje, entendo que presentear é dar um pouco da gente para alguém e esse nosso mundo pode ser uma porta para as crianças, um mundo novo com potencial transformador. Falando especificamente das meninas, muitas fadadas a ganhar bonecas e coisas que envolvem o lar, oferecer outras "ferramentas de brincar" pode ser muito agregador.

Nem vamos falar sobre bonecas e representatividade, porque isso é um papo para outro post. O fato é que desde muito cedo, meninas recebem bonecas e estão habituadas a repetir as referências de seus cuidadores. Enquanto a maior parte dos meninos é reprimida quando quer brincar de "mamãe e filhinho". Ainda que nós desconstruidões digamos que esse futuro homem está brincando de ser um bom pai, uma esmagadora maioria olha com maus olhos.

A infância e a vida adulta

Não sou eu quem diz todas essas coisas. Pesquisa feita em 2017 e publicada na revista Science mostrou que, aos 6 anos de idade, meninas acreditam que pessoas do sexo masculino são inerentemente mais inteligentes e talentosas do que as do sexo feminino. E, assim, essas futuras mulheres passam a se achar pouco capazes de atuar nas áreas exatas, por exemplo.

Desde muito cedo, nós mulheres, em nosso repertório infantil, realizamos o cuidar de alguém. Começa pelas bonecas, depois passa para os irmãos, o namorado e na sequência vêm os filhos e então os pais. Sem falar no chefe, nos pacientes, nos alunos. Quando crescemos, essas reproduções se consagram em profissões que envolvem o cuidar ou áreas bem distantes das exatas: pedagogia, enfermaria, medicina, secretariado, dona de casa… Sem desmerecer tais áreas, a ideia aqui é mostrar a essas futuras adultas que desde já elas podem ser o que quiserem. Isso precisa de estímulo dos pais e professores.

E eu com isso?

E daí a gente se pergunta: será que minha Baby Alive na caixa vai causar tanto impacto na vida da minha sobrinha? Vai por mim, se você não der uma boneca, haverá outro adulto que dará. Pouquíssimas pessoas não pensam em bonecas, casinhas, panelinhas e afins quando presenteiam uma menina. Sua sobrinha vai ganhar bonecas de qualquer jeito. Mas você pode ser parte da mudança e mostrar para essa menina que ela pode se divertir com outras coisas. Afinal, tudo tem um começo.

Pense no que pode fortalecer outras visões sobre o brincar nessa menina. Como mãe, recomendo jogos de montar, inclusive quebra-cabeças, bola e brinquedos que incentivem brincadeiras corporais, esportes, jogos de raciocínio e ingressos para atividades de aventura. E, claro, lembre de livros com temáticas de empoderamento feminino ou heroínas meninas e até carrinhos e aviões. Por que não?

E isso está começando a ser tendência. Hoje (finalmente), o mercado está se abrindo para essa infância livre de gênero e sem estereótipos sobre o que é de menino e o que é de menina. As grandes fábricas de brinquedo perceberam uma demanda reprimida e, de olho nas iniciativas feministas, estão criando brinquedos com mais liberdade de gênero. Não vai ser difícil você encontrar opções criativas de presente.

Luísa Alves é relações-públicas, mãe da Aurora e da Sol e empreendedora digital no site Guia Fora da Casinha, plataforma que divulga eventos, locais e conteúdos sobre cultura e lazer para famílias com crianças em São Paulo

Conteúdo publicado originalmente em Hysteria

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