Conheça a best-seller precursora da literatura erótica lésbica no Brasil
Cassandra Rios é o pseudônimo de Odete Rios (1932-2002), uma autora paulista que teve como tema predominante de seus textos a lesbianidade e a tentativa de inserção em uma sociedade em que os papéis de gênero, rigidamente determinados, estavam em processo de redefinição.
Por incrível que pareça, mesmo que você (e a maioria das pessoas) não conheça Cassandra, suas obras - cerca de 50 livros, a maioria com várias edições - tinham tiragens que, recorrentemente, alcançavam 300 mil exemplares. Em 1970, ela foi a primeira escritora brasileira a atingir a marca de um milhão de exemplares vendidos. Isso no Brasil é muito mais que best-seller.
Daí nos perguntamos: como é possível nunca termos ouvimos falar de Cassandra Rios? A explicação existe. A autora paulista foi alvo preferencial da censura, e mais de 70% dos seus livros publicados estiveram proibidos até 1974. Tentaram apagar seu legado e calar sua voz. O conteúdo era considerado pervertido ou pecaminoso, desvio que deveria ser combatido pelo Estado. Imagine que se hoje, quase 50 anos e muitos avanços depois, já é difícil vermos mulheres lésbicas tendo visibilidade, imagine no meio da ditadura?
Mas as minorias, que não tinham espaço algum naquela época, viam em Cassandra uma oportunidade de obterem visibilidade na ficção. A simplicidade de seu texto era uma estratégia certeira na criação de um diálogo entre a indústria cultural e o leitor (dito) comum. Utilizando termos que hoje em dia podem ser considerados politicamente incorretos, a autora conseguiu à época enfrentar a sociedade. Ao usar machinha, sapatão, entendida, corça e fancha, por exemplo ela acendia um holofote sobre o amor entre mulheres, fazendo com que saísse do gueto homoerótico e tomasse o mundo real.
E as pessoas não se chocavam?
A explicação para tamanha aceitação do público pode estar no fato de suas obras tratarem de assuntos como o prazer feminino sem tabus. Porque para além de ser uma mulher escrevendo sobre o prazer com outra mulher, era alguém falando sobre o prazer feminino no geral. E claro, era uma mostra de que existiam outros modelos de afetividade, fora do patriarcal e heteronormativo. Cassandra tratava o relacionamento entre duas mulheres como algo natural, e não exótico ou ousado, e isso era sedutor. Afinal de contas, durante o século 20 começou um borbulhar uma movimentação em torno no sexo. Justamente por que esse era um dos principais fatores de regulagem social e opressão da mulher. Porque ali o sexo era ferramenta para a se manter a ordem social machista e nos romances da autora a mulher subvertia isso, era sujeito da própria história, horrorizando a instituição patriarcal.
Cassandra foi importante porque quebrou padrões e também porque mostrou que existem leitores ávidos por conteúdo inovador mesmo quando a política e a cultura não se mostram favoráveis a avanços. Hoje, sebos e sites de comércio de livros são os melhores lugares para encontrar as obras da autora. Se você não conhecia essa precursora maravilhosa, se joga. Vale muito a pena!
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