Sobrevivente de Mariana: "Meu filho perguntou se a lama vai chegar aqui"
Maria do Carmo D'Angelo falou por cinco minutos e pediu licença para se acalmar. Desde a tragédia da barragem de Brumadinho (MG), na última sexta (25), ela só chora: sua família, que vivia em Paracatu de Cima, viveu um pesadelo há três anos, quando do rompimento da barragem da mineradora Samarco, em Mariana, percorreu 670 quilômetros até chegar ao mar, engolindo comunidades inteiras com rejeito de minério de ferro. O desastre levou ainda 19 vidas, além de destruir distritos rurais como Bento Rodrigues, Paracatu e Gesteira, e contaminar o Rio Doce.
Ela, que tem 45 anos, o marido, o produtor rural Marino D'Ângelo, de 50, e os dois filhos, de 20 e 7 anos, viviam da pecuária leiteira. Produziam 900 litros de leite por dia. Hoje, se apertam em Águas Claras, a 50 minutos de Mariana, num apartamento alugado pela Fundação Renova, entidade criada para tratar da reparação e da compensação dos problemas sociais e ambientais decorrentes do rompimento da barragem de Fundão.
A família dribla ainda o preconceito que afirma sofrer da comunidade local -- eles falam que são chamados de "pé de lama" -- e a depressão. Uma pesquisa do Núcleo de Pesquisa Vulnerabilidades e Saúde (NAVeS) da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) apontou que a depressão entre vítimas do desastre de Mariana é maior que média nacional.
"Estamos vivendo um empobrecimento forçado, além de estarmos doentes"
"Desculpe, mas estou muito abalada. A sensação é de ter perdido tudo ontem, dormido e revivido de novo hoje. Nosso sofrimento não foi apenas naquele momento. Ele se alastra. Meu filho só chora, com medo, perguntando se a lama vai chegar aqui onde moramos", fala ela, com a voz embargada.
Maria aumenta o volume da voz, no entanto, ao repetir pelo menos três vezes que não foi acidente. Nem no caso dela nem no de anteontem. Fala em revolta e crime. Ambiental e contra a vida.
"Aí vem o presidente da Vale pedir desculpas à população? Dá vontade de dar na cara dele. Não dá para aceitar", diz ela, referindo-se a Fabio Schvartsman.
O marido assume a conversa. Marino reclama da impunidade e omissão.
"Só posso oferecer às mães e familiares o meu consolo, e que isso não caia no esquecimento, porque é a nossa sensação. Perdemos o direito de viver e estamos vivendo um empobrecimento forçado, além de estarmos doentes".
ID: {{comments.info.id}}
URL: {{comments.info.url}}
Ocorreu um erro ao carregar os comentários.
Por favor, tente novamente mais tarde.
{{comments.total}} Comentário
{{comments.total}} Comentários
Seja o primeiro a comentar
Essa discussão está encerrada
Não é possivel enviar novos comentários.
Essa área é exclusiva para você, assinante, ler e comentar.
Só assinantes do UOL podem comentar
Ainda não é assinante? Assine já.
Se você já é assinante do UOL, faça seu login.
O autor da mensagem, e não o UOL, é o responsável pelo comentário. Reserve um tempo para ler as Regras de Uso para comentários.