Por que as roupas femininas têm menos bolsos do que as masculinas?
É tão incomum uma peça de roupa feminina ter bolsos realmente úteis que, quando eles existem, as mulheres não hesitam em exaltar esse detalhe. Mas por que, mesmo atualmente, vestidos e calças femininas costumam ter bolsos pequenos ou meramente decorativos? A resposta está na história da mulher na sociedade.
De acordo com João Braga, professor de história da moda da FAAP (Fundação Armando Alvares Penteado), de São Paulo (SP), a indumentária masculina ganhou bolsos depois de Napoleão Bonaparte, no século 18, quando surgiram os documentos pessoais e a necessidade de carregá-los sempre consigo. "Até então, homens e mulheres usavam apenas um acessório, chamado esmoleira, uma espécie de saquinho para carregar moedas para dar aos necessitados", explica o especialista.
Durante a Revolução Industrial, que aconteceu entre os séculos 18 e 19, houve também uma grande mudança na maneira dos homens de se vestirem. Peças muito enfeitadas deram lugar a roupas mais práticas e em cores sóbrias, porque o provedor saiu de casa para trabalhar nas indústrias. "Ele precisava levar seus pertences, seu dinheiro, de uma maneira prática. Essa revolução trouxe, então, a conscientização da necessidade de um bolso na roupa", fala Braga.
As peças femininas, no entanto, não mudaram muito desde a Revolução Francesa em relação aos bolsos. As roupas apertadas com espartilhos não tinham espaço para o detalhe ou para acomodar uma carteira interna, como era o costume na Idade Média, mas isso não fazia muita diferença. Afinal, mulheres estavam restritas ao ambiente doméstico e não precisavam carregar dinheiro ou qualquer coisa "útil" consigo. "E, quando saíam, levavam, por tradição e por ser considerado chique, uma pequena bolsa, onde tinha um espelho, uma caderneta e o leque", afirma o professor.
A falta de bolsos nas roupas femininas trazia implicações reais. Ela não podia deixar a casa sem a companhia do pai ou do marido, uma vez que o dinheiro ficava com os homens da família. Um artigo publicado no jornal "The New York Times", em 1899, chega a fazer piada sobre o assunto: "Na medida que ficamos mais civilizados, precisamos de mais bolsos [...]. Ninguém que não usa bolsos se tornou importante depois que eles foram inventados, e o sexo feminino não será páreo para nós [os homens] enquanto usar roupas sem bolsos".
O feminino de bolso
Com o estouro da Primeira Guerra Mundial, em 1914, os homens foram para o front e a mulher teve que tomar seu lugar como força de trabalho. A nova função dela transformou seu guarda-roupa: o espartilho deixa de ser necessário, uma vez que atrapalha suas atividades em uma fábrica ou no escritório, e os bolsos se tornam uma constante na roupa feminina desde então. "É por isso que o bolso surge como um símbolo da emancipação das mulheres. Eles aparecem quando ela torna mais dona de si, ganha seu próprio dinheiro", reflete João Braga.
O professor pontua, no entanto, que, enquanto as roupas do período de guerra eram práticas e atendiam às necessidades das mulheres naquela situação, o fim da Segunda Guerra Mundial voltou a trazer peças extremamente femininas e delineadas. E, nesses looks, não havia espaço para praticidade.
O estilista Christian Dior teria dito, em 1954, que "homens têm bolsos para guardar as coisas. As mulheres, para decoração". De acordo com o professor, a frase pode sintetizar uma mentalidade sobre o que a roupa deve ser para a mulher. "Deduz-se que ela gosta de se sentir mais sensual e esses detalhes das peças que não são enfeites, mas são uma necessidade, passam a ser menores para não interferir na silhueta e valorizar as curvas do corpo", explica. As roupas femininas deixariam, então, de ser práticas para serem principalmente bonitas.
Nos tempos atuais, bolsos pequenos ou a ausência do detalhe são considerados, por algumas feministas, como um resquício do sexismo vivido pelas mulheres. Como é o caso da noiva que decidiu colocar bolsos em seu vestido e nos das madrinhas, cuja foto viralizou. "A gente queria se divertir tanto quanto os homens na festa", disse a autora da ideia.
"A mulher considera-se, atualmente, igual ao homem e quer estar tão equipada quanto ele, por isso consideram o bolso decorativo como algo ofensivo", afirma Braga. "Elas querem igualdade e que as coisas deixem de serem divididas entre 'de homem' e 'de mulher'. Inclusive a praticidade na hora de se vestir".
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