"Gorda assim, não procrie mais". Elas sofreram gordofobia no ginecologista
A pesquisadora em literatura Gabriela Pas, de 32 anos, deixou de ir ao consultório ginecológico depois do nascimento do seu último filho, que hoje tem quatro anos. O medo de ser novamente vítima de gordofobia --o que aconteceu durante a gravidez-- é maior do que a disposição de fazer os exames de rotina. "Não quero ouvir nada sobre o meu peso de novo. Um ginecologista me falou que 'deveria dar na minha cara' por eu ter engravidado gorda ". Ela conta o que mais aconteceu:
"Marquei consulta com um ginecologista do meu plano de saúde porque queria engravidar. Quando ele olhou para mim, disse, de imediato, que, para engravidar, eu precisaria emagrecer. Em vez de sair do consultório com guias para exames de rotina, saí com uma receita de sibutramina [remédio para emagrecer]. Usei por um mês, mas parei porque tive medo de engravidar e de o remédio fazer mal para o bebê", conta Gabriela, à Universa.
"Eu deveria dar na sua cara por você ter engravidado gorda"
"Quando, finalmente, engravidei, voltei ao consultório dele e ouvi que ele deveria 'dar na minha cara' por eu ter engravidado gorda. Saí de lá chorando muito, mesmo estando apenas 17 quilos acima do meu peso ideal", diz Gabriela. Ela trocou de médico e acabou fazendo o pré-natal pelo SUS.
Engravidar com sobrepeso, e até mesmo com obesidade, não é um impeditivo, segundo a ginecologista e obstetra Ana Maria Massad, formada pela Santa Casa de Misericórdia de São Paulo. No entanto, mulheres obesas têm mais tendência a desenvolver diabetes gestacional e hipertensão. "O médico precisa ser mais atencioso. As consultas com a paciente e os exames devem acontecer com intervalos mais curtos para evitar qualquer tipo de problema. É ideal que o médico introduza atividade física na rotina da paciente para evitar um ganho de peso excedente durante a gestação", explica a médica.
"Gorda do jeito que você está, só laqueadura"
Após dar à luz, a professora Laura Cruz, de 26 anos, procurou um médico para trocar de método contraceptivo. Ela não visitava um ginecologista desde o nascimento da filha, havia três anos.
"Entrei na sala e a médica perguntou, de um jeito bastante rude, o que eu queria. Expliquei que queria colocar DIU porque não estava me adaptando ao anticoncepcional injetável. Ela disse: 'Gorda do jeito que você é, seu corpo vai expulsar o DIU. Nem adianta tentar. Para o seu caso, só laqueadura'. Eu fiquei desolada porque só tenho 26 anos, e expliquei isso a ela. Disse que não sabia se ia querer ser mãe novamente. Então, ela falou 'Gorda assim, você deve fazer um favor a si mesma e não procriar mais'. Fui embora e não voltei".
"Isso não existe", afirma a ginecologista e obstetra especialista em reprodução humana Renata Menezes, também da Santa Casa. "O DIU funciona muito bem para todas as mulheres, já que a cavidade uterina não tem nada a ver com o peso".
"Como você é gorda, nunca vai poder ter um parto normal"
A secretária Lidiane Andrade, de 35 anos, fez todo o pré-natal com uma médica que a constrangia em público. "Ela dizia que minha barriga parecia o mapa de rios do Brasil, de tanta estria que eu tinha. Quando chegava minha vez de ser atendida, ela abria a porta e, na frente de todos os pacientes que aguardavam na recepção, dizia: 'Vem, dona gorda'. Quando completei 38 semanas, a médica fez um exame de toque bastante violento e falou que eu já estava com dois centímetros de dilatação e que, como era gorda, teríamos que agendar uma cesariana porque eu não podia ter parto normal", diz.
Lidiane foi para a sala de parto chorando. Teve o bebê, mas não se livrou da gordofobia da médica nem durante a recuperação. "No dia seguinte ao parto, estava no quarto com a minha mãe e ela chegou. Viu que eu estava sem a cinta pós-parto -- eu nem sabia que tinha que colocar -- e gritou dizendo que, se eu não vestisse a cinta, ficaria com a barriga horrorosa e meu marido não iria me querer". Aquilo foi a gota d'água. Procurei outro médico para fazer o acompanhamento pós-parto".
Renata explica que mulheres obesas não só podem ter parto normal, como devem. "Uma médica que diz isso desconhece a ciência. A cesariana, para mulheres obesas, deve ser recomendada só em casos específicos, já que há mais riscos de infecção porque o bisturi elétrico tem que perfurar uma camada maior de gordura", explica. "Além disso, a cicatriz da cesárea não respira se for coberta pela barriga, podendo dificultar a cicatrização. Ou seja, o parto normal é o ideal".
"Com esse anticoncepcional, você vai virar uma baleia"
"Um ginecologista me passou um anticoncepcional fraquinho para que eu usasse por seis meses após dar à luz. Passado esse período, eu voltei ao consultório, mas ele não estava mais lá. Fui atendida por outro médico, e quando expliquei que precisava trocar de pílula, ele disse que eu estava gorda e deveria me cuidar melhor. Engoli em seco e abaixei a cabeça. Voltei para o assunto do anticoncepcional e ele disse: 'Tá doida, menina? Você já está gorda, se tomar esse remédio vai virar uma baleia. Previna-se com camisinha mesmo. Com esse peso, o anticoncepcional nem funciona'. Eu pesava 78 quilos", conta Daniela Santos, de 23 anos.
Renata garante: os anticoncepcionais não fazem alguém engordar. "As pílulas disponíveis no mercado não têm efeito no peso da mulher. A única recomendação para mulheres acima do peso é o anticoncepcional sem estrogênio, para evitar o risco de tromboembolismo. Quem tem muita gordura corporal tende a produzir muito estrogênio, então é bom não sobrecarregar o organismo com esse hormônio".
Ana Maria reitera: "O remédio não deixaria de fazer efeito em uma mulher de 78 quilos. O efeito só diminui quando mulheres com mais de 90 quilos fazem uso de contraceptivos combinados. Ainda assim, para essas mulheres, há outras opções, como a pílula de progesterona isolada e o DIU".
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