Como a nova proposta para a Reforma da Previdência pode afetar as mulheres
Resumo da notícia
- Proposta foi apresentada pelo governo em 20 de fevereiro e ainda deverá passar por votação na Câmara e no Senado
- Caso seja aprovada, algumas medidas afetam diretamente as mulheres, como o aumento da idade mínima e do tempo de contribuição
- Desiguldades salariais entre homens e mulheres serão agravadas na aposentadoria se reforma entrar em vigor
O Governo Bolsonaro apresentou, no dia 20 de fevereiro, a proposta para a Reforma da Previdência, que ainda precisa passar por votação na Câmara e no Senado para efetivamente entrar em vigor.
Entretanto, com as mudanças apresentadas, caso a reforma seja aprovada, a vida das mulheres pode mudar drasticamente --não só a idade para se aposentar aumentou para elas, mas uma série de medidas apresentadas não leva em consideração algumas diferenças entre mulheres e os homens no mercado de trabalho, de acordo com especialistas em Direito Previdenciário.
Após período de transição, não poderá mais se aposentar só pelo tempo de contribuição
Na regra que está em vigor, tanto homens quanto mulheres (quando são trabalhadores urbanos) podem se aposentar ao atingirem uma idade mínima (65 anos para os homens, 60 anos para as mulheres), desde que haja pelo menos 15 anos de contribuição. Também podem se aposentar ao completar um determinado tempo de contribuição com a Previdência (35 anos para eles, 30 anos para elas, sem restrição de idade).
Com a nova proposta, essas possibilidades não existirão mais, pois todos deverão atingir uma nova idade mínima e ter, também, um tempo de contribuição específico: mulheres e homens trabalhadores urbanos devem ter, pelo menos, 62 e 65 anos de idade, respectivamente, e ambos precisam ter, no mínimo, 20 anos de contribuição. As mulheres, diferentemente dos homens, tiveram um aumento de dois anos de idade para que possam solicitar a aposentadoria, além de terem perdido, como eles, o direito de se aposentarem apenas pelo tempo de contribuição.
Autônomos e trabalhadores informais também devem seguir estas regras --e mulheres são a maioria na informalidade no mundo todo--, por isso devem se atentar para continuar contribuindo com o INSS, mesmo sem carteira assinada.
Diferenças salariais refletem na aposentadoria
Considerando que as mulheres ainda ganham menos do que os homens exercendo a mesma função no mercado de trabalho, é de se esperar que a aposentadoria delas seja menor em comparação a deles.
Além disso, a mulher tem mais dificuldades de entrar no mercado de trabalho, que ainda tem áreas com predominância masculina, e muitas também passam um tempo fora quando se dedicam a maternidade (seja pela licença ou porque foram demitidas logo após o nascimento dos filhos, com recolocação mais difícil). Este período fora do mercado afeta o tempo de contribuição e, consequentemente, deixa mais distante a aposentadoria. Quem explica isso é a Dra. Tatiana Perez Fernandes, advogada especialista em Direito Previdenciário do escritório Custódio Lima Associados.
"Olhando pelo lado mais humano da situação, a jornada da mulher é muito mais exaustiva porque não é só o emprego, é o trabalho em casa, a jornada da família. Isso prolonga o momento de aposentadoria dela. Se a gente for comparar o histórico de contribuição da mulher e do homem, o dele é muito maior mesmo que ele tenha períodos de desemprego ou afastamento por questões de saúde", diz.
Mudanças na alíquota de contribuição reduzirá aposentadoria de muitas mulheres
Denise Rocha, advogada especialista em Direito Processual Civil e Direito Previdenciário e membro do Instituto Brasileiro do Direito Previdenciário (IBDP), explica que a alíquota de contribuição é uma parcela retirada do salário do trabalhador e destinada à Previdência. Na nova proposta, o trabalhador que recebe até R$ 3 mil de salário terá uma redução nesta alíquota de acordo com a sua faixa salarial, mas, segundo ela, não significa que isso é um bom sinal: "Se a reforma for aprovada, ela receberá uma aposentadoria menor no futuro, pois contribuirá menos, ainda mais com as diferenças salariais entre homens e mulheres", afirma.
Trabalhadoras rurais serão mais afetadas
Trabalhadores rurais também terão de trabalhar mais: atualmente, a idade mínima de aposentadoria é de 55 anos para mulheres e 60 anos para os homens, com pelo menos 15 anos de atividade rural comprovada. Se a nova proposta entrar em vigor, tanto homens quanto mulheres deverão trabalhar até os 60 anos, com 20 anos de atividade rural comprovada.
"As mulheres do campo já têm dificuldades quando precisam mostrar para o INSS que trabalham na atividade rural, imagina precisar trabalhar ainda mais e ter de se desdobrar para comprovar que estava ativa?", questiona Rocha. Pesa para essas mulheres, também, uma questão igual a das trabalhadoras urbanas: a dupla jornada, por causa dos cuidados com o lar e a família.
Quem depende do Benefício de Prestação Continuada receberá menos
O Benefício de Prestação Continuada (BPC), explica Fernandes, serve para as pessoas que nunca contribuíram com a previdência, seja por estarem em situação de pobreza extrema ou por deficiência. Atualmente, para ter esse direito, é preciso que a renda mensal familiar per capita seja menor que ¼ do salário mínimo, além de ter um patrimônio inferior a R$ 98 mil. A pessoa precisa ter 65 anos ou mais e, hoje, recebem um benefício mensal no valor de um salário mínimo (hoje, no valor de R$ 998).
Fernandes diz que muitas mulheres se enquadram nesse perfil. Entretanto, caso a reforma entre em vigor, será preciso que os interessados em receber o BPC tenham 70 anos de idade. Para aqueles que têm entre 60 e 69 anos e se encaixam no perfil, o valor mensal a ser pago é de R$ 400, menos da metade de um salário mínimo. Para mulheres em situações vulneráveis, ainda mais considerando que 56,9% das mulheres sem cônjuge e com filhos estão abaixo da linha da pobreza, viver com menos da metade de um salário mínimo até os 70 anos será insustentável, segundo a especialista.
"O custo de vida hoje já é difícil recebendo um salário mínimo. Se houver uma redução pode ficar muito pior. Muitas delas têm dificuldades de pagar um aluguel, por exemplo, com o benefício, a aprovação da reforma pode representar uma redução muito brusca na qualidade de vida", argumenta a especialista.
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