Arminha com a mão? Como identificar atitudes violentas nas crianças
O recente atentado na Escola Estadual Raul Brasil, em Suzano, que culminou na morte de dez pessoas, gerou uma série de questionamentos sobre violência na infância e o processo educacional.
Quando saber que a criança ou adolescente demonstram comportamentos violentos e como trabalhar para reverter esse quadro?
Primeiro, é preciso deixar claro que a agressividade, independentemente da fase da vida, faz parte do ser humano. "As pessoas têm dentro de si o bem, o mal e tudo junto e misturado. O desafio é como equilibrar todos os sentimentos. Os responsáveis precisam ficar atentos quando isso passa do esperado para determinada idade. Quando tudo fica exacerbado e interfere em outros ambientes, como na sala de aula. Por vezes, esses atos de violência têm outros significados. É um pedido de socorro por parte do menor, que pode indicar que está sofrendo bullying ou está em depressão, entre outros", declara a neuropsicóloga e mestre em psicologia do desenvolvimento humano Deborah Moss.
Criação conjunta
Outro ponto a ser destacado é que a tarefa de educar alguém não depende de uma pessoa só. Não existe um único responsável. "Há um provérbio que diz que é preciso uma aldeia para educar uma criança. E é preciso ter consciência disso. Os pais têm papel fundamental, mas os outros familiares, o bairro onde a família vive, a escola e toda a cidade são também responsáveis por ajudar a formar uma pessoa. Então, o que acontecer, reverbera em todo mundo", diz Deborah.
De acordo com a profissional, os pais não foram educados e são novos neste mundo cercado de tecnologia. Antes, acreditava-se que, ao colocar a criança para dentro de casa, já era uma grande medida de segurança. Mas os responsáveis precisam entender que estar dentro de casa já não é nenhuma garantia.
Muitas coisas ocorrem dentro do quarto e é preciso abrir esta porta, com diálogo, tendo uma comunicação eficiente com o filho.
"E se perceber algo e a criança ou adolescente não conseguir se expressar ou não quiser falar, converse com a escola. Se a escola não der conta de informar, procure os amigos ou mesmo os pais deles. É preciso saber quem é quem na vida do filho para que, ao menor sinal de anormalidade, conseguir efetuar uma ação para contornar a situação", conta.
Arminha na mão
A educadora e psicopedagoga Ana Claudia Martins Cazeiro reforça que é preciso que os pais tenham calma e não se assustem com qualquer cena, como ao ver o filho fazendo uma arminha com as mãos, por exemplo.
"Assim como o vilão de um filme usa uma arma para ferir pessoas, o herói também usa uma arma para deter o vilão. Então, antes de surtar, é preciso que haja uma conversa. O adulto precisa se aproximar do menor e perguntar: o que essa brincadeira significa para você? Quando a criança brinca, ela trabalha na mente questões sociais e emocionais, é uma forma de aprendizado sobre o entorno em que vive. E dentro do mundo lúdico, o que ela está experimentando pode ser completamente diferente do que um adulto pensa. Só olhar não adianta, tem que questionar, mostrar interesse, entender o que aquilo significa. A fala da criança é sempre necessária", explica a educadora.
Ela afirma que mesmo que a resposta seja inocente, não se deve encorajar a criança a continuar fazendo o símbolo de uma arma ou algum outro gesto de violência. Explique para ela que aquilo não é bacana, que esse símbolo tem outros significados e proponha novos elementos para a brincadeira.
Quatro etapas para entender o filho
A conversa é capaz de reverter ou minimizar muitas coisas. E quatro passos podem ajudar responsáveis a lidar com acessos de raiva de filhos, como descreve Ana Claudia Martins Cazeiro.
- Primeiro passo: saiba que a atitude violenta é inerente ao ser humano. É uma forma de mostrar o ponto de vista em alguns casos, principalmente quando a criança é pequena e não sabe se expressar bem. Por isso, é preciso observar e perguntar o que está acontecendo dentro do mundo lúdico dela. Além disso, ver o que os professores, a escola ou outras pessoas ligadas diretamente ao universo do menor dizem sobre o comportamento do filho.
- Segundo passo: a partir da conversa e do que foi relatado, o adulto deve novamente perguntar o motivo do comportamento violento, questionar se não tinha outra forma de dizer o que estava sentindo. "Esse hábito promove a reflexão na pessoa e ela consegue falar e dar nome aos sentimentos", conta a educadora e psicopedagoga.
- Terceiro passo: é preciso dar ferramentas para que o filho lide com os problemas, mostrar que não gostou da atitude e propor soluções para situações futuras, como incentivar o diálogo com colegas e com responsáveis, a fim de verbalizar os sentimentos.
- Quarto passo: indagar como a criança irá se retratar, se vai pedir desculpa. E, se necessário, corrigir, tirando algo importante para a criança. Por exemplo: o videogame ou o celular por um tempo. "O que não vale é bater de volta", alerta Ana Claudia.
A importância dos limites
Limites são necessários dentro do processo educacional. É comum que dentro de casa o filho tenha tudo o que precisa, mas isso não acontece em outros locais, como a escola. A partir daí, a agressividade pode surgir como forma de manifestação.
"No ambiente externo, as relações sociais são ampliadas. E é importante ensinar a lidar com as frustrações. Quando se cria um filho sem limite, ele não aprende a lidar com o não. E ele ouvirá essa palavra em muitos momentos da vida. A criança e o adolescente precisam ouvir o não para se sentirem protegidos, sentir que tem alguém zelando por eles", afirma a educadora.
Por mais que não gostem, sem o 'não' eles se sentem pior ainda. Falar não é um ato de amor.
Outro toque importante é: junto aos limites, trabalhe os valores para que dessa maneira a criança tenha empatia e saiba que não pode ser cruel com outra pessoa apenas porque está com raiva.
Ajuda externa
Quando o comportamento se torna recorrente e o diálogo e todo auxílio oferecido dentro de casa ou na escola não estão funcionando, aí é hora de procurar ajuda de um profissional, como um psicólogo. Ele será capaz de ajudar a criança ou adolescente a se abrir e identificar as causas da agressividade, incluindo uma possível patologia.
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